CAPÍTULO SEGUNDO
CHINÊS VERSUS SANPADJUDU
(Primeira parte)
Os Deputados aprovaram, sem unanimidade, uma adenda introduzida na Ordem do Dia, sob proposta de uma Deputada da Situação, no decorrer dos trabalhos. Consistia na introdução de uma lei que responsabilizasse alguns Juízes das Savanas e do Supremo Tribunal dos Bicharocos, que vinham sendo acusados por um Advogado Confusento, de Gatunos, Aldrabãozecos e Falsificadores de Processos. A proposta apresentada foi no sentido de proibir a que esses Juízes continuassem a inserir falsidades nos processos para se manterem inocentes na cadeia e, de deixarem que os processos contra eles instaurados se prescrevessem, porque eles mesmos se abstém de os julgar, propositadamente, em tempo útili. E argumentou a insigne Deputada, que não seria de todo, justo, nem decente, um Juiz Gatuno, Aldrabãozeco e Falsificador de Processos, viver noutro sítio que não atrás das grades. Que isso acabaria por se refletir na incompetência do Presidente do Conselho Superior da Gatunagem, do Bastonário da Ordem dos Aldrabãozecos e do Porcariador-Geral da Falsificação que já detém uma crachá de inábil nas laudas do seu histórico.
Depois de desfolhar um volumoso dossiê, Leão lançou um esfuziante olhar em direção a um chinês que estava acusado de vários delitos. Era um chinês um tanto quanto adverso aos demais. Não possuía a pequenez que normalmente caracterizava as estruturas chinocas. Media um metro e setenta e dois centímetros de altura e o seu peso oscilava entre os 75 e 68 quilos, dependendo de estar farto ou com fome. Possuía uma compleição atlética, trajava quase sempre fato de treino combinado com umas sapatilhas da «Nike», sempre novinhas. Só não se pode jurar, se no que concerne a originalidade, não paira apenas aí no nome: «Nike». Viera da colossal cidade de Xangai, a maior da República Popular da China e uma das maiores áreas metropolitanas do mundo, com mais de 24 milhões de habitantes. Havia apenas três anos que morava em Achada Fátima, no concelho de Santa Cruz, mas já falava o Crioulo como qualquer badio de fora, não fosse a pronúncia da grafia R que, por mais que tentasse e se esforçasse, sempre lhe saía L. Pois, sempre que os chineses, que são já centenas ou mesmo milhares em Cabo Verde, fazem publicidade de que na loja deles tudo é barato, dizem:
– Vem complal na loj China, fleguês. Aqui tudo é balato.
Também os Sanpadjudus [pessoas nascidas na Ilha do Fogo ou seus descendentes] quase não pronunciam o L. Ao contrário dos Chineses, eles pronunciam o R no lugar do L. Imaginem uma Sanpadjuda a trabalhar com um computador e lhe pedem para executar algumas funções com o Rato, como por exemplo, dar-lhe um clica. Seria complicado, pois não? Imaginem ainda, um chinês e um Sanpadjudu a darem aulas de inglês. O chinês não conseguiria ensinar aos seus alunos como dizerem: direito ou direita, isto é: right. Ensinar-lhes-ia a dizer: Light. E o Sanpadjudu não conseguiria, de igual modo, ensinar aos seus como dizer esquerdo ou esquerda, que se diz left. Ensinar-lhe-ia a dizer reft. Se um foguense for instrutor numa Escola de Condução num país anglófono, e quisesse mandar o seu instruendo para voltar à esquerda, diria: vorta para reft; e o chinês, se quisesse mandar o seu virar à direita, diria: vila à light.
Mas esse chinês já era considerado um típico badio branco. Já bebia grogue-fede mais do que muitos terra-terra. Comia cachupa, xerém, feijão com toucinho salgado, caldo-Peixe de banana-verde, caldo d’ovo, cabidela, requeijão, tenterém, papa, suanca, cuscuz ou camoca com leite-dormido e assobiava que nem Pardal. Aprendeu até a fabricar grogue e fazer vinho de farelo e de cascas de banana madura. Não fosse a obliquidade dos seus olhos, se não lhe ouvisse pronunciar uma palavra que tivesse a letra R, o mínimo, pode-se confundi-lo com Sanpadjudu. Tinha raparigas [Amantes, concubinas] em mais do que uma localidade. Engraçado é que ele aprendeu a montar no Vicente, inclusive, comprou um macho que o levava às casas das amantes em Achada Ponta, Achada Bel-Bel, Cancelo, Rocha Lama e Cutelinho. Tinha antes pensado comprar uma Vicenta que também pudesse parir e lhe desse uns Vicentinhos. E esses Vicentinhos poderiam ser comercializados na China e consumidos nos restaurantes onde ele era acionista maioritário. Mas alguns amigos, entre os quais o Barrusco Silva, Chitoco Vieira, Jorge Sacutelo, compadre Kipy, Nezinho Lobo Tavares e Sema de Nha Domingas aconselharam-no a não ousar porque alguns rapazes da zona, como James, Tipinga e De Dom não iam arredar os pés do redor de sua casa. Era conhecido e sempre, como os outros, respondia pelo nome de China ou Chinoca.
Estava acusado de trazer da China muitas coisas mareadas [Esquisitas, falsificadas], como arroz e ovos feitos com plástico; cigarros que faziasm com bostas do Vicente que comprava e levava para o Xangai. Estava acusado de traficar dentes de Elefante e de rinoceronte que adquiria em contrabando nos musseques Angolanos; peles e banhas da Cobra nas tabancas da Guiné e nas roças de São Tomé; peles da Chita e do Crocodilo em Moçambique; barbatanas dos Tubarões nas ilhas do Sal e São Nicolau; lãs, couros e chifres das Ovelhas nas ilhas do Maio e nas barracadas da Boa Vista; grogue de Santo Antão; ponches de coco, de calabaceira e de azedinha, e vergalhos de Tartarugas adquiridos nos funcos da ilha de Santiago, principalmente em Achadinha, Achada Santo António e Frouxa-Chapéu. Entre os crimes de que estava acusado, havia dois que eram considerados delicados. E por qualquer um, se fosse julgado na China, seria condenado a ficar com a cabeça separada do corpo. O crime de poligamia e a subversão da lei que institui a norma do filho único. Pois, o vergalho de tartaruga é um material que tem efeito afrodisíaco muito potente. Comercializado na China, onde há mais machos do que fêmeas, estaria a promover a homossexualidade que, até 1997 era considerado crime e encarado como doença mental. E pensou-se mesmo em legislar para que cada mulher viva marital com até 4 maridos em comunhão de cama e mesa. Então para quê usar verga de tartaruga se não há fêmeas suficientes e disponíveis para tantos machos, sendo alguns muito machões?
No concelho de Santa Cruz tornou-se num cliché, qualquer mulher que tivesse um filho estrábico, vesgo, zarolho ou com olhos rachados conforme ali são designados, a esse chinês era imputado a responsabilidade paternal. Era ele quem tinha que levar caldo [oferta de manteiga de vaca cozinhada, milho cochido, feijão e frango que se dá à uma mulher depois de ter filho] à recém-mamã e cueiro ao menino. E era sempre ele o privilegiado cortador do leite. E ele sentia-se feliz por isso, por que na China, conforme tinha dito atrás, o crime de adultério, como a não obediência à lei que estabelece o regime do filho único, é condenado com pena de morte. E Chinoca, em 3 anos de residência no conselho de Santa Cruz, já era pai de 17 filhos de 13 mulheres diferentes, dentre os seus verdadeiros e os que lhe imputaram por terem nascido com olhos tortos. E respondia sempre quando lhe perguntavam por que tinha tantas mulheres:
– Pulque xe uma está com xuxanku [menstruação, período], vou pala outla.
Não se distraiam, e lembrem-se de que existe um mandado do TPIB contra Leão. Pois, ele agora, na qualidade de juiz, quer a todo o custo condenar o pobre Chinoca, o Cão e sobretudo o desgraçado Macaco para quem rugiu:
– Caro deputado Macaco, os Homens-Bichos estão atulhados de razão. Vocês roubam-nos nas hortas, e sendo verdade, eles estão no direito de arranjar Cão para defender o que é deles, de qualquer desastroso corsário. Desculpa lá, mas vocês são muito macacos!
– Ah, é?! Está a insinuar que são os Homens-Bichos quem mandam Cachorros para nos incomodar?! Vergonha é que eles não têm na cara. Macacos são eles, que nasceram Macacos, cresceram Macacos, continuam Macacos e hão-de morrer a macaquearem-se. Nós não somos Macacos. Não somos ladrões. Não encontramos essa mácula na nossa raça nem na nossa geração. Não o geramos pelo sangue do nosso papê, nem pelo leite que amamentamos da nossa mamê. E nem a aprendemos durante a nossa educação na infância. Ladrões são os Homens-Bichos que roubam e inculpam os outros.
O deputado Grilo que se encontrava sentado sob o reflexo da luz de um candeeiro podogó [garrafa com petróleo e uma tira de pano que funciona como pavio], por ser negro e não seria visto se fosse sentar-se num sítio sem muito alumiamento, estridulou ao deputado Macaco em tom conciliador:
– Porque não trabalham e deixam de entrar na horta do outro para roubarem?
– Entrar nas hortas dos outros para roubarmos, não – corrigiu deputado Macaco, refilão. – Malha essa tua língua, sua negrona. Já vos disse, não sei quantas vezes, que nós não roubamos. Que não somos ladrões. Nós procuramos algo para comermos, simplesmente para pegarmos a nossa boca-do-estômago.
– A mim me parece que se saíssem à procurar trabalho, ganhariam que vos desse para comprar algo que vos mataria o jejum sem necessidade de surripiar nada dos outros!
– Quem é que nos arranja trabalho? Quem? Quem é que confia em nós? Diz-me lá quem, enquanto estamos condenados a suportar o estigma deste horrível nome… carregando atrás de nós este enorme rabo? Ou já se esqueceram de que o cliché do bichismo [Equivalente ao Racismo] existe? Que a macacofobia é uma realidade? Que a discriminação hoje em dia está na lei? E que este rabo que carregamos no traseiro torna-se um empecilho para nós e faz com que os Homens-Bichos fiquem sempre de olhos em nós? – Virando-se para o Leão: – Para já, quero que nos mude este nome. Não quero que continuem a chamar-nos Macaco. Nós não somos Macacos!
O Leão entesou as orelhas, endireitou-se no cadeirão e, um pouco ofegante, denotando-se nele um certo ar de arrepio e semblante levemente afogueado, fitou nos olhos do deputado Macaco e rugiu depois de um sorriso mordaz:
– O quê, deputado? Que disparate é esse? Trocar o nome que Deus vos deu?!
Até ao momento, a Macaca manteve-se encabrestada. Era, pois, muito submissa ao autoritarismo do marido e, no território das macacadas a lei que imperava era a de onde o Macaco se encontra, a Macaca não guincha. Mas dada a afronta que pendia sobre o eleito Macaco, a Macaca resolveu advogar a favor dele, mesmo sem estar inscrita na Ordem dos Advogados Macacos. Trepou o seu bebezinho pela parte da frente, levantou-se e guinchou:
– Caríssimo Senhor Doutor, Engenheiro, Arquiteto, Economista, Primeiro-ministro e Sua majestade senhor rei Leão e Presidente dos selvagens…
– Pós-Doutorado e Geógrafo das Savanas – retificou Leão com vaidoso arbítrio. – Com imensos trabalhos científicos retirados da Internet para publicar e criar um portfólio.
– Peço desculpa – continuou o Macaco. – Já que os Homens-Bichos são atrevidos, desprovidos da decência, de tudo e qualquer pudor, quero que Sua Majestade puna, urgente e com a mão de aço, as suas esposas por plagiarem a nossa ideia macacálica de carregar os filhos pela frente e não bonbudu [Atado, sobre, amarrado] às costas como antes faziam. Elas agora trazem os seus filhos trepados à nossa imagem e semelhança, e não às costas como Vicente quando carrega o Chinoca – voltou e pediu confirmação ao marido – Não é assim, meu Macacas?
Incapaz de esconder a inquietação que na alma lhe transparecia, o deputado Macaco fitou nos olhos da esposa e congratulou-se com os argumentos que teceu em defesa de seus representados – Obrigado, minha querida – olhou para a mesa e guinchou num tom visceralmente gélido:
– Macacos são eles os Homens-Bichos. Nós desenrascamo-nos para não morrermos à fome.
Toda a sala ficou calada como um túmulo sem herdeiros. E sob pesarosas lamentações, o Macaco enxugou das faces duas torrentes de lágrimas que em nada se comparavam com as do Crocodilo. Eram, efetivamente, lágrimas de dor. E esse sofrimento causou no Leão um certo sentimento de pena e reconhecimento das prementes necessidades, ao abrigo da Lei Natural, ou seja, da Lei de Sobrevivência, ou ainda, da própria aplicação lógica do Direito das Coisas ou, querendo, Direitos Reais enquadrados algures no capítulo do Código Civil vigente. E num tom tranquilizador, expôs como um bom justiceiro:
– Caríssimos, o deputado Macaco tem razão. Indubitavelmente, ele também tem direito de comer. É o ditame da sobrevivência, um imperativo inalienável e inquestionável. Ele não tem carro, não tem loja nem casa. Vive nas íngremes e côncavas lapas, sem portas nem janelas, nem casa de banho para fazer a sua necessidade. E não o vejo com forças suficientes para fazer essas diabruras pelo qual estão a acusá-lo. Não estarão a caluniá-lo tão simplesmente? Não estarão a ser gratuitamente injustos para com a sua simpatia?
Quiçá, pelo respeito ou receio em contrariar o Leão, continuou a flutuar na sala um fúnebre silêncio. Só a Macaca ousou emitir um sorriso, ao remeter para o marido um tranquilizador piscar de olho. Sorriu para não chorar e rabendar [imitar, copiar, repetir, reproduzir] ao marido que, só não ficou mudo porque ainda conseguia gaguejar. E com olhar notoriamente desafiante, a Macaca argumentou num tom bem-humorado, à altura de uma brilhante causídica:
– Ah! Estão calados?! Seus fala-baratos! Engoliram a língua?! Falem agora! Bando de indecentes – virando-se para o Leão. – Muito obrigado pela sua justiça. Você é um verdadeiro Salomão das selvas. Um autêntico filho de David, parente distante de Jesus Cristo.
– Amém!
Responderam todos, à exceção do deputado Crocodilo que se sentiu beliscado com o pronunciamento da frase «estão calados?» pela Macaca. Considerou deselegante, inoportuna e desadequada essa observação, pelo que protestou num tom bem desafiador:
– Estamos calados, mas não é por que não temos nada a dizer. Todos sabemos que a ladroagem está enraizada no âmago da vossa alma e não nos vossos franzinos músculos. Não têm força, mas têm habilidades e são malabaristas particularmente. Isto é que falta ao rei Leão perceber.
– Que desajeitada mentira – Recalcitrou a advogada sem carteira – E cala-te, deputado sem vergonha. Não tens moral nem idoneidade para dizer nada contra nada. O teu ato vergonhoso ultrapassou todas as fronteiras da decência. Inclusive, a tua desavergonhada postura suscitou uma máxima que perdura e perdurará no tempo. Uma máxima que diz: – Não venhas chorar lágrimas de Crocodilo – virando-se para plateia – Sabem o que é isso?
Uma Zebra moçambicana, eleita entre todas as outras, trajava um pijama de riscas brancas e pretas, como se tivesse fugido de uma prisão de alta segurança vigiada pelos impiedosos jiahdista do Daesh, baixou a cabeça, rodopiou na sala, abanou a curta cauda e disse:
– A Macaca tem razão. O Crocodilo faz coisas horríveis, depois chora e finge-se arrependido. Às vezes até se finge de vítima.
– Por que não te calas, guindaste? Tens provas? – reagiu deputado Crocodilo.
– Guindaste são esses teus olhos! Sabes perfeitamente que tenho provas.
– Então regurgita lá mais uma das tuas tóxicas mentiras.
– Então podes preparar-te para ouvir.
Sabendo que não era necessário ouvir para admitir, o deputado Crocodilo tapou os ouvidos com os dedos indicadores, murmurou com voz estrangulada:
– Deixa-me proteger os meus tímpanos das tuas pontudas mentiras.
– Também não é necessário que tu oiças. Quem precisa de saber são estes aqui que talvez até te possam tomar por um bicho de valiosa estimação e de um Espírito Santo incorporado – voltou para plateia. – Caríssimos, uma vez, a minha família e eu fomos comprar cacau a São Tomé e Príncipe para a minha mãe fazer bolo e mousse de chocolate para a festa do casamento da minha irmãzinha. Ora, quando já íamos a atravessar o rio Yo Grande, já estávamos quase próximos da outra margem, para lá da barragem hidroelétrica, o Crocodilo despontou debaixo de um lamaçal e, de forma sorrateira, atacou mortalmente o meu irmão. Aflita, a minha mãe desferiu-lhe dois coices no queixo, ele pôs-se a chorar lágrimas e ranho. Acreditem que o desgraçado pediu desculpas à minha mãe, disse que foi um incidente fortuito e muito contra a sua vontade. E a minha mãe, crédula na sinceridade deste bicho traiçoeiro, confiando piamente na sua inocência, pôs-se de cócoras a fazer massagem e respiração boca-a-boca ao meu irmão para ver se o reanimava, o Crocodilo atirou-se a ela pelas costas, agarrou-a ao pescoço enquanto ria e lacrimejava. Matou também a minha mãe.
O Crocodilo ficou calado e com os dedos tapando os ouvidos. O Leão então rugiu, querendo saber o porquê daquele horripilante silêncio crocodiliano e, qual a razão para o cometimento daquele monstruoso Zebracídio.
– Que tal, Crocó? Já não falas? A tua boca virou pequena para a língua se mexer? Mas tens razão! Quando cometemos barbaridades desta dimensão, temos é que engolir Sapo.
Todo o hemiciclo ficou alvoroçado com um inédito e insólito acontecimento. Uma Rã que estava mais ou menos perto do deputado Crocodilo, sonambulando e, de vez em quanto escapulia um coaxante ressono, despertou subitamente e com os olhos fora da órbita, ainda cansados do sono, pôs-se a correr pelos cantos da enorme sala, até que se enfiou e escondeu-se no bolso das calças do Leão, tremendo de medo, borrando-se toda, embora com os poros ativados, pronto para expelir o veneno que lhe servia como defesa. Porém, o ambiente tornou-se cómico e hilariante quando se aperceberam de que a máxima popular utilizada pelo Leão, «Quando cometemos barbaridades desta dimensão, temos é que engolir Sapo» terá provocado um curto-circuito na descodificação comunicativa. Havia-lhes caído como um Fake News em como algum atentado terrorista ou ajustes de conta estivessem iminentes. Pois, aquele encontro era equiparado a um ato político, porém, de alto risco.
O deputado Macaco congratulou-se com a interventiva defesa da Zebra.
– Muito obrigado, senhora deputada Zebra. E já agora… os meus sentidos pêsames pela trágica perda dos teus dois entes mais queridos. Deus há-de devolver-te o sossego e castigar aqueles que te importunam e, sem vergonha, nem sentem remorsos.
– Muito obrigada – agradeceu Zebra, por sua vez. – Que Deus te devolva o sossego e, também, que castigue os teus perseguidores.
– Amem! – Deputado Macaco retribuiu os agradecimentos e continuou – Os Homens-Bichos sim. Eles roubam e guardam para virem bazofiar depois. Para comprarem bons carros, construírem ou comprarem vivendas luxuosas na Prainha, dúplex com varandas em Quebra Canela, majestosos prédios no Palmarejo ou em Achada de Santo António, triplex com vista para o mar na Cidadela e em Palmarejo Grande. Arranjam bués namoradas, algumas até, esposas dos seus melhores amigos. Comem boa comida, calçam sapatos de marca como: Vela, DR Martens ou Timberland. Viajam de avião para o estrangeiro na classe executiva, com tudo pago pelos zezinhos, fazem abuso aos colegas e até à própria família. Eu nunca pus dinheiro no bolso, muito menos depositado no Banco. Não bebo, não fumo, não uso drogas, não jogo batotas, não vou aos bordéis, nem faço paródia da pesada, com lagostas e whisky velho. Nunca pus sapatos nos pés, nem gravata ao pescoço ou os óculos nos olhos. Não tenho amantes, nem amigas especiais. A minha única esposa é esta aqui – aponta o dedo à Macaca. – Coisa fêmea mais linda que alguma vez a Natureza arquitetou, o Santo Deus concebeu, a Mãe Macaca engendrou, o mundo conheceu e um macho teve a feliz sorte de tê-la por esposa. Eles vão de férias de 3 em 3 meses, acompanhados por uma amante de cada vez.
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