Com dizia o outro, de facto o rei vai nu. Em 2017, na primeira remodelação governamental, o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, deu o dito pelo não dito e aumentou o número do seu elenco governamental para 20 – mais 8 elementos acima dos 12 prometidos durante a campanha eleitoral. Nesta mesma operação, demitiu-se das suas funções, entregando os setores estratégicos da governação do país ao Olavo Correia, passando a chamá-lo de vice-primeiro ministro. Como se isso não bastasse, entregou a coordenação política ao Fernando Elísio Freire, que passou a ser chamado ministro do Estado.
Com esta remodelação, Ulisses Correia e Silva esvaziou-se complemente enquanto chefe do Governo, na medida em que ficou sem pasta governamental. Neste momento, o único setor que se pode atribuir ao primeiro ministro é o da descentralização, que é exatamente onde o governo não conseguiu qualquer resultado até este momento. Sim! Porque aqui, a única promessa digna de nota é a regionalização do país, cuja lei, demandando o voto de 2/3 dos deputados, não passou, ficando o nosso primeiro ministro sem qualquer obra da sua alçada pessoal para apresentar.
Neste momento, o país assiste a um fatiotar de fundos públicos junto dos municípios, a que se convencionou chamar de descentralização. O governo transfere os fundos do turismo e do ambiente para os municípios e estes executam obras, numa relação de promiscuidade em que não se consegue perceber quem é o dono dos projetos, das ideias e dos fundos. As obras executadas, ora são dos municípios, ora são do governo, conforme as circunstâncias e as mensagens que, num momento concreto, se deseja fazer passar.
Cabo Verde está perante um primeiro ministro a fazer de contas que governa. Um homem que não dá cavaco a ninguém, vende tudo aquilo que tem preço, descapitaliza o Estado - os aeroportos do país já estão de malas aviadas para saltar para os privados -, não presta informações ao país, passa a vida se escondendo de todos – dos seus pares, do parlamento, da nação.
Um primeiro ministro que ao invés de prestar contas na casa do povo – o parlamento – como manda a lei, chama meia dúzia de jornalistas para tentar intoxicar a cabeça das pessoas, como se este país fosse habitado por nabos. Enfim, um primeiro ministro que quer transformar este país num circo. E que aposta tudo no embrutecimento da nação.
Por exemplo, neste momento, Ulisses Correia e Silva decidiu delegar poderes do Ministério da Agricultura e do Ambiente aos municípios onde não existe uma delegação daquele departamento governamental, a saber: Paul, Ribeira Grande de Santiago, São Miguel, Tarrafal de São Nicolau, Mosteiros, São Salvador do Mundo e São Lourenço dos Órgãos.
Fernando Elísio Freire falou na Televisão de Cabo Verde e disse que esta medida se inscreve na estratégia de governação para a descentralização em curso, no quadro da complementaridade entre o poder local e o poder central, reforçando as competências e os recursos dos municípios para acompanhar e coordenar no terreno as atividades agrárias e da proteção do ambiente.
Dito desta forma, parece bonito. Porém, faltou ao ministro do Estado informar ao país quando é que o governo vai delegar os poderes dos restantes ministérios que não possuem delegações em vários concelhos do país, como os ministérios da Educação, da Saúde, das Infraestruturas e Transportes, do Turismo, só para citar os mais importantes. Quando?
Faltou ao ministro do Estado informar ao país se, a partir deste momento, vai passar a haver municípios com competências diferenciadas, uma vez que uns terão poderes para coordenar a agricultura e o ambiente e outros não. Passará a haver municípios mais poderosos que outros?
Faltou ao ministro do Estado informar ao país em que escola é que se estuda este modelo de descentralização e de governação, em que uns terão poderes mais que outros, sendo organismos iguais, com as mesmas competências e atribuições, a funcionar no mesmo país e regido pelas mesmas leis. Que escola é esta?
De salientar que os serviços desconcentrados do Estado jamais serão serviços municipais. As autarquias locais se gerem por um estatuto próprio e jamais substituem o poder central. E vice-versa. Assim, faltou ao ministro do Estado informar ao país a que se deve esta salada russa. Porque lá onde não existem serviços desconcentrados, devem ser criados, quando o interesse público e a boa gestão assim recomendar.
São informações importantes para o esclarecimento do país. Sobretudo para que não se pense que são medidas eleitoralistas, cirurgicamente pensadas no quadro de uma visão mercantilista do processo governativo, onde as ações, os projetos, são utilizados como moeda de troca. Porque tudo é possível num país governado por um primeiro-ministro sem pasta. Brincando de governante!
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