Há lodo no cais III. “Nta dau, bu ta dan”!
Colunista

Há lodo no cais III. “Nta dau, bu ta dan”!

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“Nta dau, bu ta dan!” Tudo aponta ser esta a máxima que irá ditar a relação entre o governo de Ulisses Correia e Silva e o povo cabo-verdiano. A partir de janeiro de 2021 o governo abre os cordões à bolsa, com ofertas de energia eléctrica, água, cuidados de saúde, isenção de taxas e impostos, apoio escolar, numa espécie de adiantamento, e nas eleições legislativas, que devem acontecer entre março e abril, o povo paga com os votos nas urnas. Parece anedota, mas é o que, na essência, fala o orçamento do Estado aprovado semana finda no parlamento. A partir de janeiro, tudo fica mais fácil para todos, particularmente para as famílias mais carentes. Finalmente, a felicidade! Até à apresentação do orçamento do Estado para 2021, seria humanamente impossível imaginar que um governo teria  capacidade para tal desiderato, ou seja, capacidade para promover a mercantilização das eleições e a transformação de um dos atos políticos mais nobres de uma democracia num abjeto jogo de rifa, ou vil aquiescência de troca de favores. Um governo eleito pelo povo, querendo comprar com o dinheiro do povo o povo que o elegera. Surreal!

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Segundo dados do Banco de Cabo Verde, o stock total da dívida pública de Cabo Verde aumentou 9.421 milhões de escudos (85,1 milhões de euros) até agosto, atingindo um volume equivalente a 146% do Produto Interno Bruto (PIB). Ora, até este momento, não se conseguiu entender, e o governo também não quis, ou não conseguiu, explicar os contornos desse fenómeno. O que se sabe é que os investimentos públicos ao nível da infraestruturação do país, circunscrevem-se às obras do PRAA. Não se conhece outros investimentos que justifiquem o agravamento da dívida. A taxa de desemprego manteve-se, apesar de esforços consentidos no domínio de estágios profissionais, enquanto manobra dilatória para conter a onda de descontentamento juvenil e massagear o ego desta que é a camada mais expressiva da população cabo-verdiana.

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Os aviões estão a cruzar os céus de Cabo Verde diariamente. A TAP soma e segue. E no meio desse frenesim de pouso e descolagem aparece a Cabo Verde Connect Service, dirigida por um antigo diretor da TACV, também a explorar as tradicionais linhas internacionais do arquipélago com os aparelhos da SATA. Enquanto isso, os três aviões da CVA continuam a descansar nos EUA, com elevados custos de hospedagem, sem falar dos encargos com leasing junto dos islandeses - Icelandair Group. Todavia, há o vislumbre de uma luz no fundo do túnel. É que no passado dia 9 de dezembro, Antolivio Martins, administrador para área Técnica e Accountability Manager da companhia, escrevia a seguinte carta aos trabalhadores: “queria partilhar convosco aquilo que considero ser um marco muito positivo e importante para a nossa empresa nestes dias. No dia 10 a CVA irá efectuar um voo de MIA para KEF dando assim o primeiro passo para a nossa retoma operacional. Esse voo em especifico irá permitir a manutenção do nosso AOC cumprindo assim com o pressuposto do CV-CAR 9.B.130(a)(3), para isso foram requalificados dois pilotos - o Piloto Chefe (Cte Luís Barbosa) e um Check Airmen (Cte Luís Almeida) que em breve estarão de volta a Cabo Verde com a tarefa de dar inicio aos treinos de requalificação o nosso staff técnico. Em back office, estamos a trabalhar arduamente para fornecer à nossa AAC toda a documentação necessária à boa manutenção dos processos operacionais, análises de risco, planeamento comercial, Planeamento de treinos etc. Estamos certos que 2021 nos trará a “nossa CVA” de volta, a servir e a transportar os caboverdeanos e o turismo possível, à medida que os mercados forem abrindo. Uma coisa é certa, é graças à nossa resiliência, que ainda aqui estamos e vamos poder assistir em breve aos nossos aviões no ar outra vez.” Para maioria dos trabalhadores da CVA, esta não passa de uma manobra de diversão, porquanto a operação acima referida visa tão-somente assegurar a renovação da licença junto da AAC. Para nós, comuns dos mortais, o que interessa mesmo é ter aviões aqui no país para a ligação do arquipélago ao mundo… não é assim mesmo?...

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Transformar o processo eleitoral em feiras de negócio é de uma vileza constrangedora, para além de grave, na medida em que afronta a dignidade democrática e viola os princípios basilares de um processo que se deseja livre e concorrencial. Mas não deixa de ser igualmente violento e pernicioso a não passagem de pasta no maior município do país – Praia. Contam-se já 23 dias sobre a tomada de posse da nova Câmara Municipal da Praia, liderada por Francisco Carvalho, e até este momento a Câmara Municipal cessante não fez a passagem oficial da pasta. Não se pode fugir ao dever de prestação de contas nas sociedades democráticas. Está-se a temer o quê?... A lei é muito clara. Efetivamente, há lodo cais!

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