
Se o Governo quer pedir mais cinco anos, precisa primeiro de explicar o que fez com os últimos dez. Precisa de enfrentar a insegurança que já mata jovens como se fossem estatística descartável. Precisa de assumir a responsabilidade pela fuga massiva de talentos. E precisa, sobretudo, de parar de fingir que indicadores positivos significam progresso real. O país já não quer discursos, quer resultados, quer segurança, quer oportunidades, quer verdade. E, acima de tudo, quer respeito por tudo quanto não se encontra em relatórios, mas na vida real. A vida real que, neste final do ano de 2025, está a gritar por mudanças.
Há momentos na vida de um país em que o silêncio se torna conivência. E, em 2025, Cabo Verde chegou exatamente a esse ponto. Continuar a aceitar a narrativa triunfalista do Governo é fechar os olhos a uma realidade que se impõe com violência, dor e desespero: jovens a morrer nas ruas, a fugir para o estrangeiro e famílias vitimadas por num país que já não lhes garante segurança, dignidade e futuro.
O Governo continua a exibir números como troféus. Mas os números não enterram filhos. Não consolam mães. Não devolvem esperança a bairros sitiados por medo. Não travam a fuga crescente de jovens que já não acreditam em promessas políticas recicladas.
A insegurança deixou de ser estatística. É luto.
2025 tem sido um dos anos mais sangrentos para a juventude cabo-verdiana. Homicídios sucessivos, confrontos violentos, assaltos, vidas interrompidas sem aviso, sem remorsos. O país antes vendido como cartão-postal da estabilidade transformou-se num espaço onde jovens são abatidos como animais, banalizando a vida, comos se esta tivesse perdido valor.
E o que faz o Governo? Apresenta planos. Fala em “reforço”. Repete que “a situação está sob controlo”. Mas não está. Todos sabemos que não está. Porque quem vive nos bairros sente o contrário. Sente o medo. Sente a ausência do Estado. Sente que a criminalidade deixou de ser exceção para se tornar rotina. E quando a insegurança domina, nenhum número do INE é suficiente para restaurar confiança.
O país está a destruir a sua juventude e a expulsar os sobreviventes
É impossível ignorar que Cabo Verde não esteja a perder a sua maior riqueza: os jovens. Uns morrem aqui. Outros fogem para não serem sucumbidos pela falta de oportunidades.
Mais de 70% dos emigrantes recentes têm ensino secundário ou superior. Este dado deveria envergonhar qualquer governo. É o retrato cruel de um país que não soube transformar educação em oportunidades. Que não soube reter talento. Que não soube oferecer futuro.
E enquanto milhares escapam, o Governo continua a vangloriar-se de que “o desemprego baixou para 7,5%”. Baixou para quem? Para aqueles que estão arrumando malas a correr para os aeroportos? Para aqueles que morreram este ano? Para aqueles que sobrevivem a trabalhar por 12 mil escudos por mês?
O desemprego baixa quando o país perde jovens. O desemprego baixa quando a esperança emigra. O desemprego baixa quando a falha se transforma em estatística.
Os números do Governo não correspondem à vida real correspondem a uma narrativa política
É preciso ter coragem para dizer isto, sem rodeios: estes números só servem ao Governo porque o país sabe que são falsos. Servem para construir um discurso, não uma realidade. Servem para relatórios e conferências internacionais, não para quem tem de apanhar dois hiaces por dia para ganhar um salário que não chega ao fim do mês.
O Governo celebra percentagens. O povo vive consequências. Pois, nenhuma percentagem tem força suficiente para esconder:
· o aumento gritante da insegurança urbana;
· a morte de jovens nas ruas dos centros urbanos;
· o desespero que empurra talentos para voos só de ida;
· a sensação de abandono total;
· a estagnação mascarada como progresso;
Prometeram tudo. Cumpriram quase nada. E agora querem mais tempo
O mais revoltante é ver as mesmas promessas repetidas, como se o tempo não tivesse passado. Como se não existisse memória. Como se não tivéssemos olhos. Como se a juventude cabo-verdiana fosse facilmente manipulável com discursos bem ensaiados.
Os jovens estão a morrer. Os jovens estão a fugir. E o Governo responde com… taxas. Ninguém vive de taxas. Ninguém cria família com estatísticas. Ninguém constrói futuro com anúncios vazios.
Cabo Verde chegou a um limite, a um ponto em que continuar a aceitar explicações é trair os jovens que perdemos. Trair os jovens que fogem. Trair um país inteiro que está cansado de narrativas brilhantes e realidades sombrias.
A governação não se mede pelo que se anuncia, mede-se pelo que se protege, pelo que se transforma, pelo que se salva. E este Governo falhou onde dói mais: falhou na segurança, falhou na juventude, falhou na esperança.
Cabo Verde não precisa de mais promessas, precisa de um choque de verdade
Se o Governo quer pedir mais cinco anos, precisa primeiro de explicar o que fez com os últimos dez. Precisa de enfrentar a insegurança que já mata jovens como se fossem estatística descartável. Precisa de assumir a responsabilidade pela fuga massiva de talentos. E precisa, sobretudo, de parar de fingir que indicadores positivos significam progresso real.
O país já não quer discursos, quer resultados, quer segurança, quer oportunidades, quer verdade. E, acima de tudo, quer respeito por tudo quanto não se encontra em relatórios, mas na vida real. A vida real que, neste final do ano de 2025, está a gritar por mudanças.
Os comentários publicados são da inteira responsabilidade do utilizador que os escreve. Para garantir um espaço saudável e transparente, é necessário estar identificado.
O Santiago Magazine é de todos, mas cada um deve assumir a responsabilidade pelo que partilha. Dê a sua opinião, mas dê também a cara.
Inicie sessão ou registe-se para comentar.
Comentários