O chefe do Estado-Maior das Forças Armadas cabo-verdianas admitiu hoje que o condutor da viatura que em abril capotou no combate a um incêndio, provocando oito mortos, terá perdido o controlo do camião e “entrado em pânico”.
“Há estes dois fatores. O fator humano e o fator contributivo, que tem a ver efetivamente com a falha na mudança, na redução ou aumento da marcha. E não tendo conseguido fazer essa alteração da marcha, [o condutor] entendeu que devia embater o camião na rocha para tentar reduzir a marcha em que seguia”, afirmou António Duarte Monteiro.
O contra-almirante falava em conferência de imprensa, na Praia, para apresentar as conclusões do inquérito que o próprio chefe do Estado-Maior das Forças Armadas (CEMFA) instaurou ao acidente.
Em causa está o incêndio que deflagrou em 01 de abril, no Parque Natural Serra Malagueta e Figueira das Naus, ilha de Santiago, 50 quilómetros a norte da Praia, cuja coordenação ao combate foi assumida pela Proteção Civil de Cabo Verde com apoio no terreno de militares e bombeiros.
No dia seguinte, uma viatura das Forças Armadas despistou-se quando seguia para o local, provocando a morte a oito militares e ferimentos em outros 23, tendo ainda morrido nas operações de combate um técnico do parque.
“O condutor, ao perder o controlo da viatura e ao ter uma avaliação errónea na sequência de várias tentativas de alterar a marcha da viatura em que seguia, com a alavanca [da caixa de velocidades], partiu. Certamente terá entrado em pânico, porque não conseguiu alterar a velocidade ou a marcha do veículo, e decidiu, de forma deliberada, embater o camião na rocha para tentar pará-lo”, acrescentou António Duarte Monteiro.
“É claro que no fator contributivo nós dissemos que a falha no procedimento de mudança da marcha do veículo e a consequente perda do controlo do mesmo após várias tentativas e que resultaram na quebra da parte superior da alavanca”, apontou o contra-almirante, recordando que as perícias não encontraram “indícios” de travagem.
O camião, que transportava o segundo contingente militar de apoio ao combate ao incêndio tinha partido na manhã de 02 de abril da Praia, com 31 militares, três na cabine e 28 na carroçaria, tendo como destino Figueira das Naus para a Ribeira da Prata.
Ao elencar diretamente as conclusões do inquérito, que contou com o apoio de peritos externos às Forças Armadas, o CEMFA referiu que o camião, da marca Dong Fang e fabricado em 2021, estava “em condições operacionais de utilização”, não tendo sido “nenhuma avaria ou anomalia”, e que a estrada estava seca e em boas condições.
“Esta constatação ficou confirmada com os trabalhos de peritagem realizados no sistema de travão, direção e outros órgãos do veículo que não acusaram qualquer anomalia” disse, referindo que o condutor “estava devidamente habilitado para condução do veículo acidentado” desde 2017 e que tinha estado de serviço nas 48 horas anteriores.
“A peritagem multissetorial é de entendimento de que a origem do acidente teve início na recolha de informações por parte do condutor sobre a via e na tardia decisão e efetiva execução em relação à curva e o necessário abrandamento”, explicou.
E acrescentou: “Esta falha na adequação da velocidade às condições da via - portanto curva muito fechada - e do veículo - comprimento de 8,5 metros, e em relação ao peso que possuía, embora encontrava-se com o peso menos daquilo que é permitido transportar -, levou à perda de controlo do veículo, tendo o condutor decidido embater o veículo na rocha, contornando o declive da mesma, atingindo uma altura de 4,6 metros a partir da estrada e de seguida capotar”.
Referiu igualmente que “analisados todos os factos e evidências recolhidas durante o processo de investigação”, incluindo as perícias técnicas e depoimentos, “concluiu-se que a causa direta do acidente é a perda do controlo da viatura por parte do condutor na sequência da alavanca se ter partido, associado por uma incorreta avaliação institucional que resultou na decisão de embater com o camião na rocha, aliado à falta de evidências da utilização dos travões”.
“O fator contributivo é a falta no procedimento de mudança da marcha do veículo e consequente perda do controlo do mesmo, após várias tentativas e que resultaram na quebra da parte superior da alavanca”, salientou.
De acordo com o CEMFA, o inquérito concluiu igualmente sobre sete ações a serem adotadas pelas Forças Armadas para “incrementar a segurança operacional nos meios de transporte terrestres”, cuja implementação “se iniciará de imediato”.
“Incrementar a formação contínua dos condutores, incluindo a realização de exercícios teóricos e práticos baseados em cenários diversos, com vista a preparar os condutores, a enfrentarem e reagirem com discernimento e sangue frio a qualquer tipo de avarias com viaturas em movimento. Implementar a formação de condução defensiva e evasiva”, apontou.
Vai ainda passar pela “capacitação transversal dos recursos humanos que trabalham na área de manutenção, operação, condução e administração de viaturas”, nomeadamente “através de intercâmbios técnico-científicos com instituições com ‘expertise’”, além de “dotar as viaturas de transporte geral de melhores condições de segurança para o transporte de pessoal nas carroçarias”.
Outras medidas passam por “equipar as viaturas das Forças Armadas, quando operacionalmente adequado, com equipamentos de segurança e controlo, tais quais sejam tacógrafo ou sistemas de GPS, bem como limitadores de velocidade”.
“Implementar procedimentos sobre a utilização de equipamentos de proteção individual para proteção de militares a serem transportados em viaturas de caixa aberta” e “dotar a Oficina Central das Forças Armadas de melhores equipamentos, visando garantir de forma autónoma a reparação e manutenção dos seus meios de transporte terrestres” completam as ações.
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