Efeito Mircéa Delgado. STJ boicota presença em atos oficiais enquanto se mantiver hostilidade institucional
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Efeito Mircéa Delgado. STJ boicota presença em atos oficiais enquanto se mantiver hostilidade institucional

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) considerou esta quarta-feira, 25, que há um “plano bem urdido” para denegrir a reputação dos magistrados e boicotou a sua presença em atos oficiais enquanto se mantiver o clima de hostilidade institucional.

A denúncia e tomada de posição dos juízes conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) foi tornada pública numa declaração lida pelo juiz conselheiro Benfeito Mosso Ramos, quase um mês após críticas feitas aos juízes no parlamento pela deputada Mircéa Delgado.

Numa intervenção no debate sobre a situação da justiça, ocorrida em 29 de outubro, a eleita do MpD denunciou "conflitos entre cidadãos identificados e alguns juízes”, e fez referência a textos publicados na imprensa cabo-verdiana pelo advogado e ativista Amadeu Oliveira contra determinados magistrados, a quem tem apelidado de “gatunos”, “falsificadores” e “aldrabãozecos”.

Mircéa Delgado lembrou que todas as denúncias já valeram muitos processos-crime a Amadeu Oliveira, mas sem que nenhum tenha conhecido um julgamento ou decisão de condenação.

Na declaração, o juiz conselheiro do STJ Benfeito Mosso Ramos, ladeado pelos outros juízes, inclusive pela juíza presidente Maria de Fátima Coronel, disse que o poder judicial foi nesse dia algo de “uma das investidas mais afrontosas à sua dignidade, de que se tem memória”.

O porta-voz do órgão superior da hierarquia dos tribunais de Cabo Verde reconheceu o direito da deputada e de qualquer cidadão em dar a sua opinião e criticar, mas disse não ser admissível que seja aproveitado para se fazer extrapolações, visando conspurcar o bom nome dos magistrados.

No caso em referência, Benfeito Mosso Ramos afirmou que o mandato parlamentar foi utilizado para “emprestar chancela oficial” a um “bem urdido plano” para denegrir a reputação pessoal e profissional de magistrados, como forma de retaliação pelas suas decisões.

“Objetivo que jamais podia encontrar conforto em que é titular de um órgão de soberania e em sede de um órgão de soberania, como é a Assembleia Nacional”, sublinhou o juiz conselheiro, mostrando-se indignado pelo facto de ninguém ter convidado a deputada a respeitar o bom nome dos magistrados judiciais.

E considerou mais grave ainda o facto de quase um mês depois ainda não se conhecer qualquer demarcação ao que considerou ser uma “afronta ao poder judicial”, apesar de dizer que não se surpreende em Cabo Verde, atendendo aos “crescentes ataques” à justiça e aos magistrados.

Os juízes do STJ repudiaram a tentativa de condicionar o poder judicial em Cabo Verde e exortaram todos os magistrados a prosseguiram o exercício das suas funções, com total lealdade à Constituição da República e aos princípios do Estado de Direito Democrático.

Benfeito Mosso Ramos anunciou ainda que, enquanto se mantiver em Cabo Verde o clima de hostilidade institucional e de desconsideração à dignidade do poder judicial e dos seus titulares, os juízes conselheiros do STJ não vão marcar presença em qualquer ato ou solenidade a que devem comparecer por cortesia institucional.

As declarações de deputada suscitaram várias reações nos dias seguintes, inclusive da presidente do STJ, Maria de Fátima Coronel, que, num artigo de opinião publicado nos jornais cabo-verdianos, indicou que as denúncias contra magistrados judiciais foram investigadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e que foi aberto inquérito a cada uma delas.

“Foram realizadas diligências, durante as quais o denunciante foi ouvido, tendo-se-lhe pedido que apresentasse as provas daquilo que vinha afirmando publicamente”, esclareceu Fátima Coronel, avançando que se concluiu pelo arquivamento das denúncias, porque as mesmas se revelaram totalmente infundadas.

Num comunicado, a Associação Sindical de Magistrados do Ministério Público (ASSIMP) repudiou o “tom irónico, irresponsável e afrontador” da deputada, que respondeu para denunciar uma “tentativa de silenciamento”.

“Vale a pena sublinhar que em nenhum momento tomei qualquer posição contra os juízes na sua totalidade ou contra qualquer juiz, em particular”, esclareceu Mircéa Delgado na nota.

Com Lusa

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