"Ora, não tendo o arguido feito nem uma coisa nem outra, é lícito inferir que, também para ele, esse erro de impressão, erro material, ou erro de escrita, não assume qualquer relevância jurídica".
Exmo. Senhor Director
do Jornal Santiago Magazine
Por incumbência superior, e com os nossos cordiais cumprimentos, levamos ao conhecimento de Vossa Excelência a presente tomada de posição.
No passado dia 30 de Outubro o vosso jornal publicou uma peça, assinada pelo Senhor Jornalista Hermínio Silves, com o bombástico título “Amadeu Oliveira impugna Acórdão do STJ por eliminar “deliberadamente” 24 provas a seu favor”.
Prossegue a peça com a afirmação de que o Acórdão do STJ “descartou, arrancando do processo, 24 factos” dados como provados pelas instâncias, que confirmariam que Oliveira agiu na qualidade de defensor oficioso e não como deputado da Nação.
Não sendo próprio das instituições se ocuparem deinverdades que, de tão grosseiras, acabam por desmentir a si próprias,ainda assim,no caso em apreço opta-se por reagir, ao menos à intenção de se esclarecer a opinião pública:
1. Desde logo, é falso que “Amadeu Oliveira impugna Acórdão do STJ por eliminar “deliberadamente” 24 provas a seu favor”.
2. Falsidade cuja reprodução, sobretudo com semelhante destaque, teria sido facilmente evitada, caso o jornal tivesse exigido à sua fonte essa coisa bem simples: a prova de que o acórdão do STJ foi impugnado com tal fundamento.
3. Outrossim, aquilo que é, insidiosamente, designado por “arrancar provas ou factos do processo”, mais não é que uma omissão involuntária, tão inócua, a ponto de ter também passado completamente despercebida ao próprio arguido, Amadeu Oliveira, que, notificado dessa decisão, não requereu, de imediato, a rectificação de qualquer erro ou outra anomalia.
4. Efectivamente, no processo de impressão na Secretaria do ficheiro contendo o referido acórdão, já aprovado pelo colectivo dos Juízes Conselheiros, certo segmento desse documento acabou por ser omitido, muito provavelmente devido à reformatação a que o mesmo foi submetido, originando, assim, um hiato, um salto, no encadeamento da exposição, donde a apontada omissão.
5. Está-se, pois, perante um erro mecânico, facilmente evidenciado pelo contexto e pelo sentido da decisão.
6. Decisão da matéria de facto que, como resulta de uma mera leitura, consistiu em confirmar integralmente todos os 145 factos julgados provados pelo Tribunal da Relação, tal como constam do acórdão dessa instância,peça de que se fez pertinente transcrição, e que,por seu turno,permanece intacta no processo.
7. Por conseguinte, se, como se alega na notícia de Santiago Magazine, os factos de 1 a 24, são “favoráveis ao arguido”, por “comprovarem que o mesmo agiu na qualidade de defensor oficioso e não de deputado”, tais factos, longe de terem sido “arrancados”, continuam, para todos os efeitos,intactos no processo, tal como foram julgados pelo Tribunal da Relação e confirmados pelo STJ.
8. Acresce que erros mecânicos na impressão de uma sentença ou de um acórdão são passíveis de ocorrer, sobretudo em se tratando de um documento com a extensão de 192 páginas.
9. Tanto assim é que aLei, no caso o artigo408º, do Código de Processo Penal, concebe os mecanismos para, sem necessidade de se recorrer a insultos, se corrigir tais erros, por iniciativa do Tribunal ou a requerimento de qualquer interveniente processual, nomeadamente do arguido.
10. Para quem é interveniente processual, o procedimento indicado é a reclamação, no próprio processo,logo que do erro se tenha apercebido.
11. No caso em apreço, é certo que o arguido Amadeu Oliveira, depois de ter sido notificado da decisão que julgou improcedente o seu recurso, apresentou, no dia 26 de Junho de 2023, uma reclamação contra esse acórdão do STJ. Mas, nas extensas 248 páginas dessa sua reclamação, em momento algum (sublinhe-se, em momento algum!) chamou à atenção de que teria ocorrido qualquer erro ou anomalia no texto dessa decisão.
12. Do mesmo modo, e ao contrário daquilo que a fonte levou Santiago Magazine a escrever, a questão não foi suscitada no recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade, interposto, no dia 6 de Julho de 2023, para o Tribunal Constitucional, sendo totalmente fantasiosa a narrativa de que o fundamento desse recurso tenha sido a supressão pelo STJ de “provas ou factos” que pudessem beneficiar o arguido.
13. Ora, não tendo o arguido feito nem uma coisa nem outra, é lícito inferir que, também para ele, esse erro de impressão, erro material, ou erro de escrita, não assume qualquer relevância jurídica.
14. Por outras palavras, é, salvo sempre melhor entendimento, um erro absolutamente inócuo.
15. Assim sendo, vir arguir essa omissão na imprensa, demais a mais muitos meses depois de se ter expirado o prazo para se o fazer pelos meios próprios no processo, só pode soar a propósitos inconfessáveis.
16. E só se lamenta que um jornal, aparentemente circunspecto, como Santiago Magazine, se tenha deixado levar dessa forma.
Praia, 13 de Novembro de 2023
A Secretária do Supremo Tribunal de Justiça
Adélia Almeida Correia
*Título da responsabilidade da redacção
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