Autarquias, Infras e Supras…UMAS A MAIS E OUTRAS A MENOS?
Ponto de Vista

Autarquias, Infras e Supras…UMAS A MAIS E OUTRAS A MENOS?

A dependência financeira gritante das autarquias relativamente ao poder central não fere de morte a sua autonomia que é um comando Constitucional?

Portugal, através da reforma administrativa de 2013, procedeu a fusão das juntas de freguesia, passando de 4260 para 3082. Isto é, foram extintas 1168 juntas de freguesia, cerca de 30%!!!

Em Portugal para criação de juntas de freguesia estão estabelecidos critérios objetivos relacionados com "a população e território, a prestação de serviços aos cidadãos, a eficácia e eficiência da gestão pública, a história e identidade cultural e a vontade política da população manifestada pelos respetivos órgãos representativos".

Esta breve introdução tomando como referência Portugal, país do qual herdamos o modelo da organização do Estado, serve para questionarmos a nossa realidade em matéria das autarquias locais, nomeadamente da sua sustentabilidade, tendo em conta a forma como está pensada e a maneira como têm sido implementada.

Em Cabo Verde, a Constituição da República reza no seu artº 227 que “As autarquias locais são os municípios, podendo a lei estabelecer outras categorias autárquicas de grau superior ou inferior ao município”. 

Relativamente as categorias autárquicas de grau superior houve uma tentativa da realização da Constituição da República, que foi inviabilizada no parlamento na legislatura passada. Estou a falar da criação das regiões.

Porém, nunca houve nenhuma iniciativa no sentido de criar as de grau inferior, digamos, as juntas de freguesias. 

Isto nos leva a uma reflexão sobre o perfil dos municípios que temos. Isto é, pergunto:

Será que numa certa altura a criação de autarquias não observou os critérios fundamentais para o efeito e levou a proliferação e banalização das mesmas?

Neste quadro, ainda, pergunto: a divisão territorial adotada foi inapropriada de tal forma que muitas autarquias ficaram sem escala para enquadrar categorias autárquicas de grau inferior?

Respostas afirmativas as estas perguntas suscitam de imediato mais algumas:

Como contextualizar e compreender que, ainda assim, existam vozes que continuam reivindicando criação de novas autarquias com mesmo perfil das existentes?

Esta falta de escala é uma das razões que compromete a sustentabilidade, nomeadamente a financeira das autarquias?

A dependência financeira gritante das autarquias relativamente ao poder central não fere de morte a sua autonomia que é um comando Constitucional?

Será que existe discernimento e abertura para se fazer este debate e mostrando-se necessário haveria coragem política e se conseguiria os entendimentos entre os partidos políticos necessários para a fusão de algumas das autarquias?

Estas perguntas devem servir para ponderarmos com sensatez sobre o equilíbrio a estabelecer entre a premissa de que quanto mais pequeno é a autarquia mais próxima está e melhor serve os seus munícipes e a premissa de que a autarquia deve ter escala suficiente para que tenha elementos desenvolvimentistas capazes de empreender o desenvolvimento local com a intensidade e a aceleração desejadas.

As perguntas apresentadas devem, sobretudo, convocar a todos para uma reflexão desapaixonada, particularmente, para que a sociedade civil possa, quiçá, ter a iniciativa de abrir este debate.

Pois, entendo que existem debates que os partidos, legitimamente, muitas vezes não estão disponíveis para fazer, mas que a sociedade pode e deve no âmbito do exercício da cidadania introduzir na agenda política e fazer com que certas matérias relevantes para vida do país sejam discutidas com maior amplitude, envolvendo todas as forças vivas da sociedade.

Votos de bom fim-de-semana.

Artigo publicado pelo autor no facebook

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