Até sempre, Eugénio
Ponto de Vista

Até sempre, Eugénio

Estranhei a tremenda beleza do luar ontem à noite. Em certos momentos, vendo o prateado reluzente das salgadas águas, pareceu-me ver a lua a irromper-se das profundezas do mar. Quando morrem os deuses os astros conspiram e criam coisas e símbolos transcendentais.

A extraordinária beleza da ocasião enfeitiçou-me a alma e encheu-me de nostalgia.

Abri o jornal online e percebi a plenitude da mensagem: entrava no reino dos céus um grande amigo, de longa data, de muitos momentos, bons e maus, mas amizade é assim mesmo.

Conheci o Eugénio nos idos anos de 79, nas lides políticas em Santa Catarina, era ele do PAIGC, quando terminei o Liceu da Praia. Ficamos amigos e participamos juntos em inúmeras atividades políticas, culturais e desportivas. Quantas cabritadas não fizemos juntos, naqueles tempos de intensa e genuína camaradagem, quando a política era feita de amizade - quem disse que não podemos ser amigos na política? -, generosidade e sentido do bem comum?

Mais tarde, por vicissitudes várias, deixou Eugénio a política para se dedicar integralmente à agricultura. Continuamos amigos, mas a distância era implacável, e só nos víamos muito espaçadamente.

Quando assumi a Chefia do Governo, reencontrei o Eugénio, agora Engenheiro no Ministério da Agricultura. Pude perceber o enorme entusiasmo e a generosidade com que fazia as coisas. A mobilização da água, a criação do agronegócio e a transformação da agropecuária passaram a ser a sua paixão.

Inteligentemente irónico, humilde e generoso, trabalhador como poucos e amigo dos seus amigos, Eugénio deixa-nos eternas saudades.

O céu, a terra e o mar prepararam-se para te receber, caro amigo. Só grandes Homens deixam o mundo dos vivos no meio de tanta beleza, só grandes Homens têm a morte anunciada pela lua, pelas estrelas e pelas águas prateadas e cintilantes do mar.

A minha tristeza é do tamanho do mundo, as salgadas águas que ontem vi cheias de luz e de ternura são parte das minhas lágrimas.

Descansa em paz, meu grande amigo. Até sempre, Eugénio.

Aqui na foto: Eu, Eugénio e Sami, nos idos anos 80, na Praça de Assomada.

Texto publicado pelo autor, José Maria Neves, no facebook.

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