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Construções clandestinas em  São Martinho Pequeno. Cumplicidade ou incompetência da CMP?
Sociedade

Construções clandestinas em São Martinho Pequeno. Cumplicidade ou incompetência da CMP?

Um grupo de pessoas, entre as quais deputados nacionais, altos funcionários do estado e do município da Praia – resolveu “assaltar” a zona de São Martinho Pequeno, mais concretamente na localidade de Lém Dias, com construções de habitações, quintas e outros investimentos, na ausência de qualquer titulo de propriedade ou licença municipal de construção. São mais de 30 mil metros quadrados de terreno. A Câmara Municipal da Praia (CMP), tentou impedir as construções, porém sem sucesso até agora.

Do grupo estão devidamente identificados os senhores, Aldino Gonçalves Cardoso, Anatólio Manuel Fonseca Lima, Aristides Ribeiro Gonçalves Cardoso, Daniel dos Santos Lobo, Edmilson Amaro Tavares, Filipe Fonseca da Silva, Lenine Freire Joaquim Varela, Jeir Gomes de Figueiredo Gonçalves, José Gomes, Marino Vieira do Canto, Octávio César Silva Vieira, Melício Pires, Justiniano Gomes Moreno, que intentaram uma ação judicial contra a CMP, quando esta resolveu proceder à demolição das suas obras. Mas fontes de Santiago Magazine garantem que os deputados do MpD, Emanuel Barbosa e Isa Costa, constam entre os investidores, para além de outros altos dirigentes da administração e da própria CMP.

São obras de grandes dimensões, como, aliás, reconhece a CMP, podendo os investimentos ascender aos 30 mil contos neste momento, uma vez que as construções clandestina continuaram até hoje. Para já, em janeiro de 2019, ou seja, há um ano e meio, os 14 indivíduos acima identificados haviam declarado junto dos tribunais que o total dos investimentos até então realizados totalizava 17, 7 mil contos.

Dos factos. No dia 31 de Dezembro de 2018, o presidente da CMP, Óscar Santos, assinava um despacho, cuja cópia este diário digital teve acesso, onde determinava que a direção da Guarda Municipal e demais serviços municipais competentes, procedessem ao entulho dos caboucos e demolição da raspais construídos ilegalmente naquela zona.

Na carta, Óscar Santos, escrevia que “não obstante as várias diligências levadas a cabo, até à presente da data (31 de dezembro de 2018), não foi possível identificar os infratores, pois que as obras são executadas à socapa, desafiando a autoridade municipal e causando prejuízos consideráveis ao município”, acrescentando que “as referidas obras põem em causa os futuros planos urbanísticos que a Câmara Municipal da Praia pretende criar e implementar naquela zona da cidade”.

No dia 10 de janeiro de 2019, ou seja, 11 dias após o despacho para a demolição das construções, Óscar Santos, assinava uma carta dirigida à Polícia Judiciária onde pedia a colaboração dessa corporação policial na identificação dos infratores e o consequente apuramento das responsabilidade criminais dos seus atos.

Nessa carta, Óscar Santos, reafirmava que os serviços municipais não tinham conseguido identificar os infratores porque estes trabalhavam na calada da noite, dificultando assim a fiscalização, por um lado, e por outro, os infratores punham-se sempre em fuga face à presença dos Guardas Municipais, complicando ainda mais a intervenção da Câmara Municipal.

São Martinho Pequeno, terra de ninguém?...

Ora, se faz evidente que com essas investidas da CMP, o cerco sobre os infratores ia-se apertando. E é nesse ambiente que os 14 individuos acima identificados requereram uma providencia cautelar judicial sobre o despacho municipal de demolição das suas obras, alegando, em síntese, que são donos e legitimos proprietários das referidas obras, que não foram notificados da demolição, o que constitui violação dos seus direitos de proprietários, que os terrenos não são da CMP, nem de ninguém, tratando-se de terrenos abandonados.

No dia 24 de julho de 2019, o Tribunal da Relação de Sotavento proferiu o douto Acórdão n.º 104/19, nos Autos Cíveis de Apelação – Providência Cautelar n.º 53/19, no qual os Senhores Juizes Desembargadores acordaram em conceder provimento ao recurso interposto pelo Município da Praia, declarando a incompetência em razão da matéria do juízo cível da Comarca da Praia, e em consequência absolver o requerido da instância, por tratar-se de uma matéria da competência do Supremo Tribunal de Justiça  

O douto Acórdão convalidou o despacho n.º 89/2018, datado de 31 de dezembro de 2018, em que o presidente Óscar Santos ordenou a demolição dos raspais e caboucos ilegalmente construidos na zona de São Martinho Pequeno.

O referido Acórdão não foi objeto de recurso, tendo, por isso, transitado em julgado nos termos estabelecidos na lei de processo, facto que reconfirma que os denunciados ocuparam de forma ilegal e ilícita uma área superior a de 30.000 m2 (trinta mil metros quadrados).

Mesmo tendo sido notificados dessa decisão judicial que reconhece como válida a decisão do presidente da CMP, e não tendo recorrido dessa decisão, os denunciados continuaram com as suas construções, desobedecendo dessa forma o Acórdão do Tribunal da Relação de Sotavento.

E essa atitude terá eventualmente servido de exemplo para outras pessoas que a partir desse momento também ocuparam várias outras parcelas de terreno, levando a cabo construções similares, mesmo sabendo que a sua conduta era ilegal e ilícita, e desobedecendo uma decisão judicial.

Aliás, o próprio Acórdão sugere que os denunciados não podem desconhecer a ilegalidade e a ilicitude da sua conduta, visto serem pessoas com responsabilidades e com formação superior (comandantes de polícia, jornalista, empresários e engenheiros), podendo ainda estar implicados Deputados Nacionais, de acordo com informações de pessoas residentes na mesma localidade.

No mesmo sentido, diz o Acórdão, que a CMP procedeu a demolição das construções porque as mesmas eram clandestinas e, não conseguiu identificar os denunciados, que realizam as construções de noite e à socapa, tendo inclusive feito queixa crime à Polícia Judiciária, sendo que os denunciados, pessoas com formação superior e com responsabilidades, não deviam estar a praticar estes actos manifestamente ilegais e ilícitos.

Este caso de São Martinho assume alguma similitude com o processo da construção da Praça de Palmarejo. Entretanto, no caso da construção da Praça do Palmarejo, logo que saiu o Acórdão judicial, a CMP autorizou imediatamente a retoma das obras, que se encontravam até aquela data suspensas, em cumprimento de uma decisão judicial.

Esta comparação é aqui feita, porque para as nossas fontes, a CMP não agiu com o mesmo profissionalismo em relação à situação das construções clandestinas em São Martinho Pequeno, sendo certo que, um ano depois do Acórdão judicial, ainda as pessoas continuam a construir todos os dias, sem qualquer consequência.

E questionam por que razão, até este momento, a CMP não procedeu às demolições, trazendo à colação as demolições das barracas do do Alto da Glória. “Porquê que a CMP não age em São Martinho Pequeno com o mesmo zelo e rapidez com que agiu no caso nas barracas do Alto da Glória”, perguntam.

Santiago Magazine tentou falar com a CMP para ouvir da sua justiça. De todo o modo, vai tentando para ver se o país estará face a um ato de cumplicidade ou incompetência do concelho que é simultaneamente a capital do país.

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Redação