Cabo Verde Narco-estado? Autoridades surdas e mudas…
Editorial

Cabo Verde Narco-estado? Autoridades surdas e mudas…

No ponto em que nos encontramos em Cabo Verde, é crucial que nós mesmos, cabo-verdianos e cabo-verdianas, não nos transformemos em fatores de insegurança. Há desafios nossos que temos de poder enfrentar. Telegraficamente, aponto o seguinte: o desafio da coesão social ou do combate à exclusão, à pobreza, ao desemprego. Esses são contextos propícios à insegurança. Por outro lado, o desafio da qualificação do discurso sobre a segurança, a todos os níveis. A nossa sociedade já é em si fortemente opinativa, pelo que quem esteja em cargos de responsabilidade neste domínio tem de subir a fasquia, com um discurso credível, que signifique ‘Estado’ e transmita conforto. O discurso político não pode ser uma réplica da conversa mundana do comum dos cidadãos nem muito menos transmitir a ideia de uma tranquila diluição de responsabilidades.” Jorge Tolentino

Recorrentemente a Imprensa Internacional, concretamente a Britânica, sai com esta de que Cabo Verde é um Narco-estado. Afirma, questiona, sugere, dá palpites, e em meio a farpas e outros inocentes subentendidos, lá vai preparando a cama do descrédito e da infâmia, na qual eventualmente almeja ver este lindo país deitado.

A última dessas investidas está no London Daily Post, de 20 do mês em curso. Trata-se de um artigo virulento, que ataca diretamente as relações de Cabo Verde com Luxemburgo, particularmente o último acordo de financiamento assinado entre os dois países, no montante de 78 milhões de euros.

A notícia manifesta-se de tal modo incomodada com o referido acordo, ao ponto de escrever que está sendo difícil entender porque é que os Luxemburgueses “consideram Cabo Verde digno dos seus euros”.

As investidas de certos setores da Imprensa Internacional contra Cabo Verde não são de hoje. Aqui vão alguns exemplos: https://www.greydynamics.com/cabo-verde-another-narco-state-in-west-africa/https://www.spectator.co.uk/article/what-lockdown-its-business-as-usual-for-drug-traffickers

Entre os ditos e os não ditos, entende-se que há uma tentativa deliberada de enlamear o nome do arquipélago no contexto internacional, pondo em causa a dignidade do Estado de Direito e o bom nome do país.

As razões serão certamente inúmeras e algumas até inconfessáveis, mas salta à vista desarmada que uma delas se prende naturalmente com o mundo dos negócios, onde o turismo aparece em primeiro plano. Ou seja, há algum interesse em deturpar a imagem deste país no contexto internacional, onde um dos objetivos é precisamente atingir o setor do turismo.

E é sobre este ponto em concreto que o presente editorial quer falar.

Sendo um dos maiores, senão o maior, país europeu emissor de turistas, é natural que o universo empresarial britânico tenha interesses em outros mercados e outras paragens turísticas pelo vasto mundo.

Tendo em conta a selva que é a luta pela sobrevivência num mundo tão concorrencial, como o é o mercado turístico, temos por certo que essas notícias visam enfraquecer, ou até mesmo anular, a ainda que pequena força competitiva que o mercado cabo-verdiano detém no setor turístico internacional.

Nessa perspectiva, temos que a Imprensa Britânica está a atacar a galinha dos ovos de ouro da economia cabo-verdiana, responsável por 25% do PIB, sendo setor que melhor se alinha com a posição geográfica do arquipélago, localizado no meio do mundo e tributário de recursos estratégicos intangíveis, como a boa governação, a estabilidade política e social, a segurança e um Estado de Direito equilibrado e saudável.

E são exatamente esses recursos estratégicos intangíveis é que estão a ser objeto de ataques.

A partir de uma breve visita ao Google, fica-se a saber que Narco-estado (e seus derivados narcocapitalismo e narcoeconomia) é um neologismo destinado a caracterizar a política económica do sistema capitalista em que o comércio de drogas ilegais é um ponto forte e de importância para a economia de um país. O termo Narco-estado se aplica a países cujas instituições políticas se encontram significativamente influenciadas pelo tráfico de drogas, e cujos líderes desempenham simultaneamente cargos como funcionários do governo e são membros das redes de tráfico de entorpecentes ilegais, amparados pelos respectivos poderes legais.

Ora, um Narco-estado é, nos seus fundamentos e propósitos, um estado falhado, porque minado nas suas estruturas e exposto a todo o tipo de perigo. Um estado falhado é um estado sem qualquer equilíbrio político e social, malgovernado, sem segurança, sem justiça e sem qualquer perspectiva de desenvolvimento. 

Desde a independência que Cabo Verde é um país respeitado no concerto das Nações. Posicionou-se (posiciona-se) sempre com elevada autoestima, e tem falado ao mundo com sapiência e sabedoria necessárias para merecer o respeito e a consideração dos seus interlocutores, apesar da sua pequenez territorial e económica.

País insular, territorialmente diminuto e habitado por pouco mais de meio milhão de pessoas, Cabo Verde não deve, e não pode, permitir esses ataques, sem dizer nada, sem se defender. Os órgãos do poder do Estado não devem, e não podem, continuar a ignorar essas investidas que chegam da Europa, concretamente da Inglaterra.

O silêncio das autoridades públicas estará, neste contexto, a abrir flanco, no médio e longo prazos, para imputar grandes prejuízos ao país, tanto interno como externamente.

Daí uma atenção especial ao que escreveu o diplomata Jorge Tolentino, que já foi Ministro da Cultura, das Relações Externas e da Defesa Nacional neste país, que aqui vai transcrito: “No ponto em que nos encontramos em Cabo Verde, é crucial que nós mesmos, cabo-verdianos e cabo-verdianas, não nos transformemos em fatores de insegurança. Há desafios nossos que temos de poder enfrentar. Telegraficamente, aponto o seguinte: o desafio da coesão social ou do combate à exclusão, à pobreza, ao desemprego. Esses são contextos propícios à insegurança. Por outro lado, o desafio da qualificação do discurso sobre a segurança, a todos os níveis. A nossa sociedade já é em si fortemente opinativa, pelo que quem esteja em cargos de responsabilidade neste domínio tem de subir a fasquia, com um discurso credível, que signifique ‘Estado’ e transmita conforto. O discurso político não pode ser uma réplica da conversa mundana do comum dos cidadãos nem muito menos transmitir a ideia de uma tranquila diluição de responsabilidades.”

O aviso está dado!

A direção

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