O poeta cabo-verdiano José Luiz Tavares propôs hoje a criação de um prémio e de uma estátua em homenagem ao escritor Arménio Vieira, o primeiro Prémio Camões de Cabo Verde.
“Seria um acto de justo reconhecimento o município (da Praia) criar um prémio literário com o nome de Arménio Vieira, propondo-me para jurado (evitando, deste modo, que eu concorra) assim como o patrono do prémio, e um terceiro elemento, o que garantirá a qualidade da obra que eventualmente venha a ser distinguida. A sugestão já foi apresentada à câmara municipal e, agora, aguardamos que tenham a clarividência cultural de a pôr em prática”, sugeriu.
José Luiz Tavares falava à Inforpress, na cidade da Praia, no âmbito da sua participação, à margem do XII Encontro de Escritores de Língua Portuguesa, numa tertúlia por ele idealizada com o Arménio Vieira, no dia 05 de Setembro, no Café Sofia, intitulada «Conde Silvenius e a corte dos poetas no seu segundo castelo, o Café Sofia».
Serão intervenientes, para além do próprio Arménio Vieira, o poeta José Luiz Tavares, o pintor Tchalê Figueira e o escritor Daniel Mendes.
“Será um momento descontraído de poesia e de escuta do primeiro Prémio Camões de Cabo Verde (e, durante muito tempo, o único) que muitos hoje fazem por tentar apagar”, salientou José Luiz Tavares.
“Na senda da ‘bustificação’ infrene, inaugurada pelo Abraão Vicente, sugeria a feitura duma estátua do Arménio Vieira, a ser colocada na praça em frente ao Café Sofia. Deverá ser uma verdadeira estátua, e não esses bustos serializados, de baixa qualidade quer estética, quer ao nível dos materiais. Deveria convidar-se um escultor da cidade, como o Kassanaya, por exemplo, ou abrir-se um concurso nacional ou internacional. Se a Câmara não tiver meios para tal, abra-se uma subscrição, que os inúmeros admiradores da figura e da obra do Arménio Vieira de certeza contribuirão para a sua perpetuação no seu local de eleição na cidade da Praia”, propôs o poeta.
Para José Luiz Tavares, existem poucas cidades no mundo que tenham um escritor que assim que surge o seu nome é ligado imediatamente a essa cidade.
“Acontece com o Arménio Vieira e a cidade da Praia, o que faz dele o seu maior ícone cultural. Preciso é cultura e visão para se entender isso. O dinheiro da cultura não pode ser apenas para os regabofes dos festivais de praia em que, anualmente (ou até com outra maior frequência) todas as câmaras municipais, independentemente da cor política e da sua dimensão, enterram o pouco dinheiro que há”, criticou
José Luiz Tavares diz existir apenas um único caso de uma Câmara Municipal que criou um prémio literário para homenagear um dos seus grandes, o prémio Teixeira de Sousa, criado pelo município de S. Filipe, na ilha do Fogo.
“Mas ao mesmo tempo que teve esse significativo gesto, ‘paroquializou’ o prémio restringindo-o a obras escritas na variante do crioulo do Fogo, assim tendo em cada edição uma média de três obras concorrentes, às vezes nem isso. É óptimo criar condições para a existência de obras literárias nas variantes da língua cabo-verdiana de menor expressão sociológica, mas não matando uma iniciativa meritória com paroquialismos abstrusos. Esse aspecto deveria ser apenas um critério valorativo, e não uma condição de participação”, sugeriu.
O autor de “Paraíso Apagado por um Trovão” disse que gostaria que outras câmaras municipais seguissem o lado bom desse exemplo, sobretudo o do Tarrafal, seu torrão natal, que tem dois dos escritores “mais relevantes da actualidade”.
“Eu e o Mário Lúcio, tem um grande poeta em língua cabo-verdiana, o Princezito, tem uma Associação Literária, pioneira em Cabo Verde, a ALTAS, com uma grande dinâmica, tem um historiador local muito activo, o Carlos Ferreira, tem uma icónica poeta em língua cabo-verdiana, Eneida Nelly, falecida em circunstâncias trágicas, por tudo isso deveria aproveitar toda essa dinâmica, todo esse capital local para criar um verdadeiro festival literário, mas, ao invés, o que vemos: a mesma dose cavalar de festivais de areia ou de poeira, ano sim, ano sim, ‘sempri kanpion’, um mal geral, em todo o lado, até nas terreolas mais recônditas”, lamentou.
Observando uma “limitadíssima e pobre noção do que é cultura” por parte dos políticos, o poeta disse que deveria haver uma lei a limitar, numa certa percentagem, de acordo o orçamento anual das câmaras municipais, o que se deveria gastar nesses festivais.
“Durante o ano inteiro é um deserto, sem nada de relevante ou pedagógico no campo da cultura, sobretudo com relação àquelas áreas mais exigentes, que requerem um trabalho de educação e sensibilização continuados até produzirem frutos adequados”, referiu.
“Eu até proponho mais: que se impeçam as câmaras municipais que não tenham uma biblioteca (ou uma digna desse nome, municiada convenientemente de livros) de realizar esses festivais”, reforçou, reconhecendo que este é um posicionamento que vai “contra o ar dos tempos e o afrouxamento dos critérios de exigência cultural, em favor de um populismo rasteiro, de olho apenas na cruz santa cruz (voto) por alturas das eleições”.
“Pergunte-se: que câmara municipal hoje em Cabo Verde tem uma biblioteca digna desse nome, e municiada convenientemente em termos bibliográficos? A resposta deveria envergonhar-nos a todos”, concluiu.
Comentários
José Rui Lima, 18 de Set de 2024
Pelo texto inflamado, esse senhor José Luis Tavares (que por acaso nem conheço) parece ser um ás da poesia.
O Shakespeare que se ponha a pau !!
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