...é evidente que o País não precisa de um “engavetador geral da República”, antes precisa muito de celeridade processual, transparência e justiça. Porque é isso que se exige de um Estado de Direito democrático e de instituições que se devem reger pelos princípios republicanos. Entre ambiguidades, desmentidos e engavetamentos, as suspeições sobre a gestão do dossier Mercado do Coco irão manter-se, o que não é nada bom para o ambiente político e para a nossa democracia.
O comunicado da Procuradoria-Geral da República (PGR), tornado público a 30 de setembro, começa logo por fazer uma acusação grave ao presidente do Tribunal de Contas (TC), alegando que este terá faltado à verdade, porquanto “até à presente data, não foi remetido ao Ministério Público, pelo Tribunal de Contas, qualquer relatório” referente ao “dossier sobre o Mercado do Coco”.
No referido comunicado, faz-se, ainda, alusão a uma “denúncia crime” contra o Município da Praia efetuada por “militantes do Partido Africano da Independência de Cabo Verde– PAICV”, com data de 19 de fevereiro de 2019, onde se alegava “indícios de má gestão e de irregularidades que põem em causa bens e recursos públicos”.
Uma denúncia crime que foi arquivada por despacho de 12 de abril de 2019, “por não conter factos que indiciam a prática de qualquer ilícito criminal”. Isto é, a PGR, que não se pauta propriamente pela celeridade processual, antes pelo contrário, não tem quaisquer dúvidas em arquivar um processo dois meses após a apresentação da denúncia.
No mínimo, gestão danosa e prejuízo para o erário público
É com este argumento da inexistência de qualquer ilícito criminal, utilizado pela PGR, que o MPD tem vindo a esgrimir em defesa da governação municipal de Ulisses Correia e Silva.
No entanto, mesmo que se desse por seguro não haver qualquer vestígio de corrupção (ou seja, que alguém tenha metido dinheiro ao bolso) na gestão municipal do dossier Mercado do Coco, no mínimo, haveria que achar muito estranho que um projeto desta envergadura tenha sofrido uma tão grande derrapagem, até por uma razão objetiva: o projeto foi lançado (na ocasião, para fins meramente eleitoralistas) e iniciadas as obras sem que, para tal, tenham sido efetuados os necessários e rigorosos (!) estudos técnicos ao solo e aos impactos da obra.
Isto é, no mínimo, Ulisses Correia e Silva e a sua gestão municipal, no decurso de uma investigação rigorosa (o que não nos parece ter sido o caso), deveriam ser responsabilizados por gestão danosa e prejuízo para o erário público.
Por qual razão o presidente do TC faltaria à verdade?
São discutíveis os critérios da PGR no arquivamento de processos. E isto não decorre de qualquer preconceito nosso, antes de uma opinião balizada na conduta da instituição, que, inclusive, para fundamentar as suas posições, não vê qualquer problema em desmentir o presidente do Tribunal de Contas.
A questão é esta: que interesse teria o presidente do TC em faltar à verdade, sabendo que logo a seguir poderia ser desmentido?! Não faz nenhum sentido.
Por outro lado, é evidente que o País não precisa de um “engavetador geral da República”, antes precisa muito de celeridade processual, transparência e justiça. Porque é isso que se exige de um Estado de Direito democrático e de instituições que se devem reger pelos princípios republicanos.
Entre ambiguidades, desmentidos e engavetamentos, as suspeições sobre a gestão do dossier Mercado do Coco irão manter-se, o que não é nada bom para o ambiente político e para a nossa democracia.
Comentários
Casimiro Centeio, 1 de Out de 2024
Uma coisa não é certa, é certíssima: se a referida Câmara fosse gerida pelo PAICV o barulho que se fazia seria superior á explosão de uma bomba atómica !
Se as derrapagens relativas ao MERCADO DE COCO fossem da responsabilidade do PAICV, o caso tiraria sono da atual Justiça cabo-verdiana. Ninguém é idiota !!!!!
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