Colocar as mulheres como candidatas à Presidência de Câmara não é 'assassiná-las politicamente', como o deputado sugeriu de forma desdenhosa, mas sim reconhecer o seu direito legítimo e capacidade de ocupar cargos de liderança e governança.
As declarações do deputado do MpD Vander Gomes, em entrevista ao jornal A Nação, são um atestado de menoridade a todas as mulheres cabo-verdianas e clarifica a posição de alguns elementos do partido no poder sobre o papel da mulher na nossa sociedade. São políticos que ainda não entenderam que é necessário lutar por um mundo em que homens e mulheres sejam livres para fazer suas escolhas, usufruindo das mesmas responsabilidades, direitos e oportunidades.
Esse senhor deputado, cujo nome faço questão de ‘esquecer’ rapidamente, é um jovem (dada a idade) com mentalidade de “velho do Restelo” (expressão que designa os políticos fascistas portugueses do antigo regime salazarista). Na dita entrevista, só faltou ao jovem deputado, e dirigente da juventude do MpD, considerar que o lugar da mulher é em casa a cozer meias.
As mulheres na nossa sociedade continuam, infelizmente, a suportar uma carga desproporcional de trabalho doméstico e a sofrer desigualdades nos seus papéis na esfera profissional e politica. Ainda não têm as mesmas oportunidades e opções que os homens têm no que diz respeito ao trabalho fora da família.
Ao contrário do senhor deputado, o Papa Francisco considera que a mulher desempenha um papel central na chamada sociedade ocidental, lembrando que a sua participação na política é essencial para garantir uma representação verdadeiramente democrática e inclusiva.
O jovem/velho deputado esquece que o processo de equiparação da participação das mulheres passou por várias lutas pela igualdade, migrando de uma fase onde não havia espaço algum para a participação das mulheres na política para este novo momento onde as mulheres cada vez mais ocupam cargos e postos de destaque na sociedade e no meio político.
Mas este processo ainda está longe de alcançar o resultado esperado, uma vez eleitas, as mulheres continuam a encontrar dificuldades funcionais para a sua atuação, enfrentam preconceitos explícitos quanto a capacidade de seu gênero, e a imagem que persiste é a de que tal preconceito está enraizado na política nacional.
Como dizem as mulheres cabo-verdianas nas redes sociais: “Cada vez mais os cabo-verdianos estão perdendo confiança nos políticos devido ao comportamento de certos governantes e responsáveis do MPD. Somos mulheres. Não somos bonecos. Temos sentimentos e exigimos respeito. Somos livres para tomar a nossa própria decisão e fazer as nossas escolhas”.
Por isso, é que consideram ultrajante ouvir um deputado nacional proferir tais palavras misóginas e ultrapassadas. A afirmação de que as mulheres não possuem competência é não apenas falsa, mas também uma afronta à dignidade e ao valor das mulheres em todos os setores da sociedade.
Colocar as mulheres como candidatas à Presidência de Câmara não é 'assassiná-las politicamente', como o deputado sugeriu de forma desdenhosa, mas sim reconhecer o seu direito legítimo e capacidade de ocupar cargos de liderança e governança.
Esta cultura machista e patriarcal, presente no pensamento do deputado, pretende que a mulher seja criada para as atividades voltadas ao âmbito privado, centrando seus esforços na unidade familiar, com comportamento dócil e apaziguador. Enquanto isso, os homens são criados para exercer sua capacidade de liderança no âmbito público, nos espaços das negociações do mundo do trabalho e da política eleitoral.
As mulheres cabo-verdianas sabem que são insultos deste tipo que lhes dão mais força para continuar a luta, contribuindo para a justiça social.
A luta é todos homens e mulheres.
António Santos
Comentários