Abandalhando o Estado
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Abandalhando o Estado

O referido ministro/candidato não pede demissão do cargo governamental que ocupa, faz campanha partidária diariamente, no país e na diáspora, e recebe os salários, os subsídios, e todos os demais direitos de um governante, porém, sem trabalhar. Deixou São Vicente, a sede de um dos ministérios sob sua tutela, sem dar cavaco a ninguém, com o país inteiro assistindo, impotente, porque ele faz o que bem entender, como se as leis não existem para ele e para o Governo a que pertence. Ora, um ministro é um funcionário público, está vinculado ao dever de assiduidade, e nessa qualidade, ele só deve receber os salários e demais direitos laborais se for trabalhar. Caso contrário, ele fica sujeito a um processo disciplinar, como todos os funcionarios públicos. O chefe do Governo deve uma explicação ao país quanto à situação laboral do seu ministro Abraão Vicente, cujo nome de campanha é Korpu Rixu.

As eleições autárquicas estão se aproximando e os sinais que nos chegam das autoridades políticas e governativas são muito preocupantes, na medida em que anunciam um Estado capturado por interesses particulares, partidários, onde as demandas do desenvolvimento não fazem parte da agenda pública e nem das prioridades dos gastos públicos.

Tudo é programado e executado no quadro do ciclo eleitoral e dos resultados político/partidários que se esperam venham a sair das urnas.

Está claro aos olhos de toda a nação cabo-verdiana que de um tempo a esta parte o Governo de Cabo Verde demitiu-se das suas funções constitucionais de órgão executivo do poder do Estado, com responsabilidades de tutela sobre a administração pública e gestão dos recursos nacionais, para se assumir como gestor do dossier autárquico do MpD, concebendo programas e liberando fundos públicos detinados única e exclusivamente ao condicionamento do voto consciente, visando transferir as intenções de voto para os seus candidatos.

É o que tem acontecido com o Fundo Mais, que conheceu um aumento exponencial de mais de 500% no orçamento do Estado para o ano em curso.

É o que aconteceu com a “transferência” de cerca de 70 mil contos para a MORABI, uma organização próxima do MpD, presidida por uma vereadora desse partido na Câmara Municipal da Praia, detinados á construção de casas de banho e distribuição de Cestas Básicas na capital do país, numa clara concorrência com a Câmara Municipal da Praia e nítida intenção de “comprar” votos nos bairros pobres da cidade.

É o que está a acontecer com o lançamento de programas de financiamento de construção de habitações de interesse social em municípios liderados pelo MpD, um pouco por todo o país.

É o que está a acontecer com a distribuição de apartamentos de complexo Casa Para Todos, estratégica e irresponsavelmente abandonados e desprezados por este governo desde 2016, e que agora estão sendo usados como moeda de troca nestas eleições.

É o que está a acontecer com a proliferação de distribuição de tarifas sociais de água e energia eléctrica para as famílias de baixa renda, quando foram simplesmente ignoradas esses anos todos, como se não estivessem aqui ou não existissem.

É o Estado abandalhando o Estado. E nesta saga, o Governo de Cabo Verde teve o desplante de extorquir 193 mil contos de fundos do PRRA, mobilizados junto da Bolsa de Valores de Cabo Verde, destinados à Câmara Municipal da Praia, sem qualquer justificação legal, orçamental e financeira, com um único objetivo que é impedir a execução de obras de requalificação urbana no maior município do país, para prejudicar o mandato de Francisco Carvalho, passando por cima de interesses dos praienses e desprezando os seus legitimos anseios e aspirações.

Com este mesmo propósito, o Governo de Cabo Verde continua a recusar a transferência de fundos do Turismo destinados ao município da Praia, uma receita consignada, violando todos os princípios de gestão que vinculam as instituições do Estado.

Para cúmulo dos cúmulos o Governo acaba de escolher um dos seus membros para candidato às eleições autárquicas previstas para teceiro trimestre deste ano. Aqui Cabo Verde está perante algo inédito: um ministro do Estado é candidato a uma Câmara Municipal, usando meios do Estado para fazer campanha partidária, em clara e pública violação das leis, dos princípios éticos e das boas práticas da República de Cabo Verde. Aqui deixou definitavamente de haver separação entre o interesse do Estado e o interesse do partido político MpD.

O referido ministr/candidato não pede demissão do cargo governamental que ocupa, faz campanha partidária diariamente, no país e na diáspora, e recebe os salários, os subsídios, e todos os demais direitos de um governante, porém, sem trabalhar. Deixou São Vicente, a sede de um dos ministérios sob sua tutela, sem dar cavaco a ninguém, com o país inteiro assistindo, impotente, porque ele faz o que bem entender, como se as leis não existem para ele e para o Governo a que pertence. Ora, um ministro é um funcionário público, está vinculado ao dever de assiduidade, e nessa qualidade, ele só deve receber os salários e demais direitos laborais se for trabalhar. Caso contrário, ele fica sujeito a um processo disciplinar, como todos os funcionarios públicos. O chefe do Governo deve uma explicação ao país quanto à situação laboral do seu ministro Abraão Vicente.

É certo que as instituições democráticas estão fragilizadas, mas a nação cabo-verdiana não pode admitir estas coisas. É excessivamente grave o que está a acontecer em Cabo Verde, 49 anos após e independência e 33 anos após o advento da democracia pluripartidária. Estaremos a regressar ao regime de Partido/Estado?

Enfim, são posições e sinais que não podem ser ignorados, sobretudo pela sua gravidade no quadro da construção de uma sociedade democrática saudável, altruista, fundamentada na defesa do interesse público e na promoção da satisfação das necessidades coletivas.

O Estado de Cabo Verde está sendo abandalhado no seu fundamento, nos seus princípios constuticionais, legais e políticos.

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SOBRE O AUTOR

Domingos Cardoso

Editor, jornalista, cronista, colunista de Santiago Magazine

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