Ao aproximarmo-nos do 3º aniversário da data em que o SINAPOL protagonizou uma das mais bem-sucedidas greves na história do sindicalismo cabo-verdiano, gostaria de aproveitar este ensejo para apresentar aos lideres sindicais e a todos os elementos da Polícia Nacional que estiveram envolvidos nessa luta e às suas martirizadas famílias, a minha sincera homenagem.
Foi em dezembro de 2017 que o sindicato da Polícia entregou um pré-aviso de greve à entidade patronal, no caso a Polícia Nacional, onde, de entre outras exigências, constava a atualização salarial, redução da carga horária e atribuição de subsídio de condição policial aos agentes da guarda fiscal.
A dupla, Diretor Nacional da Polícia e o Ministro da Administração Interna, fizeram de tudo para transformar a pré-anunciada greve dos polícias em nado-morto, subestimando a capacidade mobilizadora dos líderes nos diversos concelhos do país; chantagearam e ameaçaram subchefes e agentes para não aderirem à greve.
De início, recusaram sentar-se à mesa para buscar pontos de convergência, mas com o aproximar da data prevista para a greve, tendo informações de que a mobilização andava em bom ritmo, resolveram, dias antes do início da greve, enviar uma equipa de negociadores inábeis e sem poder de decisão para junto do SINAPOL, sempre muito bem orientado pelo veterano e experiente sindicalista, José Manuel Vaz, da CCSL (Confederação Cabo-Verdiana de Sindicatos Livres) e Direção Geral do Trabalho, passar a ideia de que estavam disponíveis para negociar. A impreparação dos enviados da polícia era tanta que tiveram de se ausentar da sala variadíssimas vezes, fingindo que iam esvaziar a bexiga, aproveitando para pedir assessoria (via telefone) sobre como deviam posicionar-se perante determinadas exigências.
Por causa dessa manobra delatória e, consequentemente, sem qualquer entendimento, o líder do SINAPOL deu uma conferência de imprensa, afirmando que a única saída que tinha ficado era a greve nos dias 27, 28 e 29 de dezembro de 2017.
O ministro, que não conhece a classe e estava mal informado, resolveu também ir à comunicação social para dizer que os cabo-verdianos podiam estar tranquilos que a greve não afetava em nada a ordem e tranquilidade pública. Com essa declaração, ludibriou o próprio Primeiro-Ministro que panha mau como veremos mais adiante.
Dado à má fé dos negociadores da polícia, não houve entendimento quanto aos serviços mínimos, pois, queriam um serviço com 100% de polícias. Até a meia-noite da véspera do dia da greve não tinham ainda distribuído a lista dos serviços mínimos. Tanta era a impreparação da Direção Nacional que fizeram aquilo que é insólito no mundo laboral: apresentar uma lista de serviços mínimos superior ao próprio efetivo da polícia. Explico! Foram de madrugada e pegaram numa lista antiquíssima que integrava efetivos, finados, reformados, expulsos, estudantes no exterior e pessoas de licença de longa duração e mandaram publicar.
Quando eram 8 horas do dia 27, a greve iniciou-se em todas as ilhas com uma adesão acima dos 90%. No entanto, a Direção Nacional afirmava que era de 44%. Por isso, houve Esquadras encerradas e Comandos Regionais que receberam ordens para entregar viaturas de serviço policial às Forças Armadas.
Conforme tinha afirmado, o nosso primeiro-ministro panha mau porque, confiante nas palavras do ministro, em como a greve não teria impacto na vida das pessoas, ao sair de manhã para a sua faina diária ouviu de um dos seus guarda-costas: Chefe Ka ta da pa sai porque seguranças de nhô sta de greve”. O obediente primeiro-ministro, deu meia-volta e foi sentar-se na varanda a ler o jornal, até que a Direção de Proteção de Entidades conseguiu recauchutar a sua segurança, “catando” pessoas de outras unidades.
Senhores grevistas, esta situação e o pior da greve que veio no terceiro dia, com o assalto ao Banco Comercial de Negócios na Boa Vista, tendo como instrumento de crime uma metralhadora AKM-47, foram as principais razões que enfureceram todo o elenco governamental, mas também, é a causa da pesada sanção que vocês acabaram por sofrer.
É muito importante que as pessoas conheçam a história do assalto ao banco, na Boa Vista, porque, na minha ignorância sobre a 7ª arte, dava para fazer uma curta metragem, com dois atores principais: Estaline e Paulo Rocha e um possível secundário que seria o primeiro-ministro. Peço encarecidamente ao meu amigo e cineasta Júlio Silvão que pense nisso.
Esses dois atores, tinham conhecimento que, há mais de 20 dias, antes da greve, se encontrava desaparecida da Esquadra da Boa Vista uma arma, não uma arma qualquer, uma metralhadora de guerra com capacidade para 30 cartuchos, capaz de atingir 3000 m (três mil metros) e, na posição de rajada, fazer 600 (seiscentos) disparos em um minuto.
Alguém já deverá estar preparado para perguntar: que culpa tem o diretor e o ministro pela perda de uma arma numa esquadra? Boa pergunta e respondo: Sim, têm culpa por aquilo que fizeram e por aquilo que não fizeram!
O que é que fizeram? Encobriram o caso, mandaram um grupo de oficiais que não são peritos de investigação criminal, de emergência para a ilha, na tentativa de, em sigilo, descobrir o paradeiro da metralhadora. Consequência: uma semana depois, os oficiais regressaram à cidade da Praia de mãos vazias.
Aquilo que não fizeram: para a investigação de assuntos relacionados com armas e explosivos, a competência é da judiciária que fora inicialmente mantida à margem desse acontecimento, houve blackout informativo. Já agora, se há coisa que me deixou atónito, e, para a qual, apesar de muito esforço não consigo entender, é porquê que o ministro Paulo Rocha, sendo inspetor da judiciária, não confiou nos seus pares para passar essa informação atempadamente.
Sr. Primeiro-Ministro, o possível ator secundário, o Sr. sabendo da iminência de greve na Polícia Nacional, também sabia que na Boa Vista havia uma arma de guerra desaparecida há mais de 20 dias, antes do fatídico assalto?
Se sim, o Sr. é também cúmplice do assalto e deve apresentar-se perante o cineasta Júlio Silvão, para, querendo, utilizá-lo no filme. Se não tinha conhecimento, ainda é muito mais grave porque tanto o Diretor Nacional como o ministro foram desleais para consigo.
Só por isso é que houve assalto ao banco e, infelizmente, o agente foi o único condenado a par dos civis; e os grevistas apanharam por tabela.
Em Portugal, no mesmo ano de 2017, também roubaram armas militares em Tancos. Lá, sendo Europa, com prática de autorresponsabilização e um grande Presidente da República, Dr. Marcelo Rebelo de Sousa, sem titubear, pede o “apuramento de tudo, de alto a baixo, até ao fim, doa quem doer”.
Quais foram as consequências, mesmo depois de as armas serem recuperadas? Cinco Comandantes exonerados e duas cabeças roladas: a do Ministro de Defesa, Azeredo Lopes e, a do Chefe do Estado Maior do Exército, Rovisco Duarte.
Senhores agentes grevistas, fizeram um bom trabalho. Tudo foi bem feito? Não! Dirigir uma greve com mil e tal agentes em 22 Concelhos de Cabo Verde não é tarefa fácil. Algo pode falhar, mas uma coisa é certa: todos os efetivos da Polícia Nacional, mesmo aqueles que vieram a entrar depois desta greve, reconhecem o vosso mérito. Os próprios triunviratos da Direção Nacional da Polícia que, afinal, foram os principais beneficiários, porque viram duplicar os seus salários, que são duas vezes superior ao de um deputado da nação, superior ao do PR e do Primeiro-Ministro. Portanto, também vos devem um grande favor e, certamente, no ambiente íntimo, vos elogiam. Digo-vos isso, por experiência própria. Eles, na intimidade, têm discursos diferentes. Então não ouvi há dois anos, no Sal, doutro lado da linha telefónica, uma pessoa com muita responsabilidade na PN, dizer-me: “Kumandanti, nhu tem razon, ma nhu tem que entendenu, nu sa ta ser pressionado pa telefone au mais alto nível pa toma medida”. Como o nosso meio é pequeno, três dias depois de chegar à Praia, já sabia quem pressionava a PN a alto nível.
É falsa a declaração dos deputados, no Parlamento, quando enchem o peito e dizem: Nós é que aumentamos o salário da Polícia. O mérito é todo vosso, agentes grevistas. Eles nunca levaram uma única proposta nesse sentido. O efeito da greve extrapolou o muro das Esquadras para penetrar também nas casernas das Forças Armadas. Foi um Tenente Coronel que me disse: Comandante, é graças à vossa luta por um melhor salário que o nosso estatuto remuneratório é o que é, hoje.
Ah, ainda sobre deputados, há dias um vangloriava-se de que o país é muito seguro e que estamos entre os dez melhores do mundo, apesar de questões de segurança. Gostaria de deixar apenas algumas perguntinhas:
Acha que um país que tem cerca de dez mil armas ilegais a circularem por todos os concelhos é seguro?
Um país que tem várias dezenas de fábricas (oficina de serralharia) que fazem armas artesanais tão letais que “fazem inveja” às fábricas industriais de pistolas e metralhadoras Glock da Áustria, Walther da Alemanha, Taurus do Brasil e mesmo Makarov da Rússia?
Acha que um país que não consegue controlar a sua fronteira a ponto de entrar milhares de munições de todos os calibres é seguro? Porque, munições, ainda, que eu saiba, não estão a ser fabricados em Cabo Verde e em determinados bairros arrebentam-se de noite como pipocas.
Se somos tão seguros, como se justifica que dos cerca de dois mil polícias nacionais, cerca de 10%, aproximadamente 200(duzentos) agentes, estão exclusivamente destinados à proteção de altas entidades?
A bazófia do crioulo muitas vezes nos deixa de queixo caído. Um microestado, mais pequeno que os distritos portugueses de Évora, Santarém, Castelo Branco e Portalegre, com menos população que Lisboa, Porto, Braga, Setúbal, Aveiro e Faro, que, no entanto, é tão seguro, não é paradoxal que tanto o nosso primeiro ministro, Ulisses Correia e Silva, como o Presidente da República, Jorge Fonseca, tenham mais elementos na sua proteção pessoal que António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa?
Para avaliar o grau de segurança ou de insegurança de Cabo Verde, quem está em melhores condições para o fazer são os cabo-verdianos que estão li na tapadinha, ou seja, a população de Achada Grande Trás, Jamaica, Safende, Alto da Glória, Eugénio Lima, Ponta d´Água, Tira Chapéu, etc. Não empresas de markting ou instituições que estão no exterior e que querem vender os destinos turísticos.
Para não maçar mais aqueles que me leem, fico por aqui, mas não antes de lamentar o expediente adotado pela polícia no sentido de extinguir administrativamente o SINAPOL, no momento que faz muita falta a uma Polícia fora da lei que promove pessoas reformadas, sem reunirem uma das principais condições que é o tempo mínimo no posto, que distribui insígnias ao acaso (mesmo às pessoas com cadastro). Fazem falta vozes críticas quando a hierarquia está em desuso.
Na verdade, há pessoas que já não dispõem de espaço no peito para mais medalhas, enquanto outras com 30, 35 até 40 anos de serviço abnegado nunca viram a cor da medalha. O próprio Diretor Nacional, Staline, nesses 4 anos de péssimo trabalho, já acumulou mais medalhas do que o seu homónimo, general Staline da ex-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas que foi Secretário Geral do PCUS de 1922 a 1952 e primeiro-ministro de 1941 a 1953.
Senhores Intendentes, ex-Comandante Regional da Polícia de S. Vicente Alcides da Luz e ex-Comandante Nacional da Polícia Fiscal Manuel Alves, subscrevo as vossas reações nas redes sociais quanto à forma de condecorar na polícia. Embora tais condecorações (vindas daquelas mãos) valham pouco, julgo ser necessário disciplinar a forma de as atribuir. As medalhas são feitas no exterior, pagas com o dinheiro dos contribuintes e distribuídas ao acaso principalmente no período eleitoral, em busca de alguma simpatia junto da classe (policial) que nunca tiveram.
O mês de abril está próximo. Encontrar-nos-emos nas urnas. Ali será nha bez, e bez de todos os agentes, subchefes, oficiais da polícia e seus familiares. Bez não para negócios com o Estado, mas sim para retribuirmos o mimo a este governo insensível que mais danos causou à Polícia, em toda a história de Cabo Verde independente.
Bem-haja o Sindicato Nacional da Polícia Nacional! Todo o cuidado com a comunicação móvel é pouco, porque há escutas ilegais. Nhôs txuputin nta konta nhôs ou nhôs ranha Comandante Alves. Há também hackers, piratas informáticos, quase do nível do português Rui Pinto.
Praia de nós tudo, 13 de dezembro de 2020
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