Cabo Verde deverá assumir a presidência da Comissão da CEDEAO, a partir de 2018, de acordo com o estipulado no protocolo adicional A/SP.14/02/12, que define a ordem alfabética dos países como um dos principais critérios de atribuição desse posto aos Estados-Membros desta organização sub-regional. Assim, considerando que tanto o Benim como o Burkina Faso ocuparam já a presidência da Comissão da CEDEAO, o próximo na lista, seguindo a ordem alfabética, é Cabo Verde.
Por outro lado, o cumprimento de obrigações no campo da democracia e da taxa comunitária, constituem os dois restantes critérios, para a alocação desse importante cargo. Se, no que diz respeito à democracia e à boa governação, Cabo Verde é uma referência na África Ocidental, já em matéria de pagamento da taxa comunitária, o país tem, de fato, um problema, pois não tem estado a cumprir, de forma rigorosa, esse pagamento. Essa taxa, que é cobrada nas alfândegas e corresponde a 0.5% das importações provenientes de países que não pertencem à CEDEAO, depois de cobrada deverá ser depositada na conta da CEDEAO no BCV. A verdade é que o país faz a cobrança, mas não deposita.
Com a visita a Cabo Verde, em Fevereiro de 2017, do atual Presidente da Comissão da CEDEAO, Sr. Marcel de Souza, o Governo terá encetado negociações visando pagar os atrasados e, aparentemente, terá já transferido o montante correspondente a 2017. É neste contexto que o Governo liderado pelo Dr. Ulisses Correia e Silva anunciou publicamente que Cabo Verde deverá assumir a presidência da Comissão da CEDEAO a partir de 2018 e por um período de 4 anos. Entretanto, a decisão final sobre esta matéria só será tomada pelos Chefes de Estado e de Governo na próxima cimeira ordinária, que deverá ter lugar a 16 de Dezembro do corrente ano.
Se a decisão for favorável a Cabo Verde, o Governo, em concertação com S. Excia o Sr. Presidente da República, deverá escolher um candidato do país a esse posto de Presidente da Comissão da CEDEAO. Assim, o cidadão Cabo-verdiano que vier a assumir essas funções, passará a estar ao serviço da CEDEAO, pelo que, de forma bastante clara, o próprio protocolo adicional A/SP.14/02/12, que define as modalidades de alocação dos postos de Presidente, Vice-Presidente e Comissários da CEDEAO, estipula, no seu artigo 10 que “O Presidente da Comissão da CEDEAO deve ser um cidadão de um Estado-Membro, com uma comprovada competência e integridade, demostrando uma visão global de questões políticas, económicas e integração regional”.
Contrariamente àquilo que muitos andam a apregoar, em nenhum momento se fala da necessidade de ser um ‘político de carreira’ ou de se ter ocupado postos ministeriais como pré-requisito para se assumir as funções de Presidente da Comissão da CEDEAO.
Na verdade, depois do anúncio feito pelo governo de que um Cabo-verdiano deverá ocupar o posto de Presidente da Comissão a partir de 2018 várias pessoas manifestaram já a sua disponibilidade para ser o candidato de Cabo Verde: O Professor Doutor Isaías Barreto da Rosa, atual Comissário da CEDEAO para as Telecomunicações e Tecnologias de Informação; o Dr. Orlando Pereira Dias, Deputado e atual 4º Vice-Presidente do Parlamento da CEDEAO; e o Professor Doutor Júlio Carvalho, Vice-Presidente da UCID e Professor Universitário nos Estados Unidos da América.
Os três pré-candidatos, num processo de transparência e de comunicação com a sociedade civil cabo-verdiana, revelaram já as suas ideias e propostas, caso venham a ser escolhidos pelas autoridades nacionais e confirmados pela Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da CEDEAO, para desempenharem essas funções.
O Doutor Isaías Barreto da Rosa conta com um amplo consenso à sua volta, sendo expressivas as manifestações de apoio a uma eventual candidatura sua, provenientes de vários quadrantes da sociedade civil. Informações divulgadas na imprensa nacional dão conta que Barreto é igualmente o candidato que tem a preferência da Nigéria, país que tem mais de metade da população da CEDEAO e que cobre mais de metade das despesas de funcionamento desta organização. Entretanto muitos dizem que o seu handicap prende-se com o facto de não ser militante de nenhum partido político, uma vez que em Cabo Verde tudo é politizado e que há grande probabilidade dos nossos decisores políticos aproveitarem esta oportunidade para pagarem eventuais dívidas políticas na escolha do candidato.
O Deputado Orlando Dias, membro da Comissão Política do MPD conta com o apoio de uma parte do seu partido e é aparentemente o preferido do Sr. Presidente da República. Recorda-se que Dias foi sempre um grande apoiante de Jorge Carlos Fonseca nas campanhas eleitorais, pelo que, aparentemente, o nosso PR parece ter uma certa dívida política por pagar, dívida essa que estaria agora a ser cobrada.
Já o Professor Júlio de Carvalho, sendo Vice-Presidente da UCID, conta naturalmente com o apoio deste partido. Todavia, fala-se igualmente no nome do Doutor José Luís Livramento, atual Presidente do Conselho de Administração da Cabo Verde Telecom, que, até ao momento, não se pronunciou publicamente sobre o assunto.
Consta que o Dr. José Luís Livramento tem a preferência do Primeiro-ministro e do Ministro dos Negócios Estrangeiros. Recorda-se que Livramento, à semelhança de Dias, é membro da Comissão Política do MPD e, depois de fracassada a sua tentativa de liderar a Comissão das Nações Unidas para África, a Presidência da Comissão da CEDEAO parece estar agora na mira de Livramento.
Aliás, informações circuladas nas redes sociais dão conta que o Governo de Cabo Verde terá já entregue uma carta ao Governo do Togo, país que assume a presidência da Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da CEDEAO, manifestando o interesse do nosso país em assumir a Presidência da Comissão. Esta carta terá sido entregue em Nova Iorque, às margens da última Assembleia Geral das Nações Unidas e terá sido acompanhada pelo currículo do candidato escolhido pelo Governo: o Dr. José Luís Livramento.
Recentemente, um dos jornais cabo-verdianos, refere que a indicação de José Luís Livramento seria uma “recompensa pelos desaires anteriores” dentro do MpD, nomeadamente no caso de Presidência da Assembleia Nacional e no lugar de Embaixador de Cabo Verde nos Estados Unidos da América.
A ser verdade tais informações, compreende-se perfeitamente porque Livramento não estará a falar muito sobre este assunto, uma vez que tudo estará a ser tratado muito discretamente. Mas o que é preocupante nisto tudo é que aparentemente o Presidente da República não foi “nem tido nem achado” neste processo, quando esta deveria ser uma decisão concertada entre o Governo e o Presidente da República. É caso para dizer que tudo terá sido cozinhado à surdina e mantido num grupo bastante restrito.
O velho ditado popular diz que “onde há fumo há fogo”. Esperamos que, desta feita, não haja fogo nesse fumo, pois é fundamental que o processo de escolha do candidato de Cabo Verde ao posto de Presidente da Comissão da CEDEAO seja conduzido de forma absolutamente transparente. A pessoa escolhida irá representar o nosso país e a sua boa ou má performance afetará a imagem de Cabo Verde na sub-região. Enquanto Cabo-verdianos merecemos pelo menos um processo transparente.
Alcides Miranda
Licenciado em Estudos Cabo-verdianos e Portugueses
Pós Graduado em TIC- Especialidade em Ensino
Professor do Ensino Secundário
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