O Presidente da República, José Maria Neves, considera o Orçamento do Estado (OE’2022) “demasiadamente” sustentado no consumo público, e criticou a ausência de investimentos necessários em serviços públicos e infra-estruturas essenciais para uma maior dinâmica económica.
De acordo com a mensagem enviada ao parlamento, na sequência da promulgação do diploma a que a Inforpress teve acesso, José Maria Neves salientou que o excessivo consumo provocado, sobretudo, pela via das despesas de funcionamento, se faz em detrimento dos “necessários investimentos em serviços públicos e infraestruturas essenciais para uma maior dinâmica económica”.
Aliás, como tinha sido referido anteriormente, o chefe de Estado sublinhou na nota a ausência de “medidas mais vigorosas visando a tão necessária, vital racionalização e contenção das despesas públicas”.
“Com efeito, constata-se que mesmo diante de uma forte redução das receitas as despesas correntes reduziram-se apenas em 2,2% face ao orçamento rectificativo de 2021, que compara com uma relativa forte contracção do investimento público, na ordem dos 6,3%”, sustentou.
Na sua perspectiva o OE’2022 deveria ser o início de medidas de política e reformas estruturantes visando a urgente redução da despesa corrente do Estado.
Outro aspecto criticado por José Maria Neves é o aumento do tecto de endividamento interno de 3% para 6% aprovado no parlamento depois de um consenso entre todos os partidos políticos com assento parlamentar.
O Presidente da República sublinhou que tendo em conta a taxa de endividamento, “que já era elevada”, Cabo Verde ficou ainda “muito mais exposto aos problemas críticos da insustentabilidade da dívida pública”, com todas as consequências daí advenientes, no futuro próximo.
“Estas consequências são, designadamente, a falta de credibilidade externa para a contracção de mais dívida externa, o enorme peso do serviço da dívida, o enxugamento da liquidez interna e, o mais grave, a falta de recursos para os investimentos imprescindíveis e/ou absolutamente necessários. Aliás, com a prorrogação das moratórias já anunciadas, designadamente por Portugal, espero que esse tecto não venha a ser plenamente realizado”, referiu.
Outro aspecto que José Maria Neves declarou como preocupação é o facto de o montante previsto para o serviço da dívida pública, no valor de 24,4 milhões de contos, perfazer 59,2% das receitas fiscais (impostos) previstas, o que significa que mais de metade dos impostos que os cabo-verdianos pagarão em 2022 será utilizada para a amortização e o pagamento de juros da dívida soberana.
“Trata-se, obviamente, de uma situação que não pode continuar, sob pena de Cabo Verde hipotecar o futuro da sua população em favor do consumo de hoje, pelo que tenho por recomendável que seja substancialmente melhorada a capacidade e o sistema de gestão da dívida pública”, realçou.
O chefe de Estado salientou também o facto de o OE’2022 não prever um quadro macroeconómico e macro-fiscal alternativo, caso ocorra uma situação muito diferente pela negativa da que serviu de base para os seus pressupostos.
Na perspectiva de José Maria Neves, trata-se de um “uma falha grave”, uma vez que, em se concretizando tal situação, tudo mudaria em relação a praticamente todas as projecções das principais variáveis macroeconómicas e macro-fiscais, com especial destaque para o nível de arrecadação das receitas fiscais, que ficaria muito abaixo do previsto, impactando, negativamente, o défice orçamental e o endividamento público.
Apesar de todos reparos, José Maria Neves explicou que promulgou o diploma, tendo em conta a urgência do combate à pandemia, bem como a adequada recepção das medidas de estímulo à economia e de mitigação dos efeitos económicos e sociais da pandemia.
“Em concreto, contribuíram especialmente para a decisão as medidas de relançamento da economia e de compensação da perda de rendimentos e de reforço do sistema nacional de saúde. A sua importância recomenda que entrem em vigor a 1 de Janeiro de 2022”, sublinhou o chefe de Estado.
O OE’2022, no montante de cerca de 73 milhões de contos, prevê um crescimento económico entre 3,5 e 6%, uma inflação de entre 1,5 e 2%, com défice público a atingir os 6,1% e a dívida pública a situar nos 150,9%.
Comentários