Governar um país é assunto sério. A soberania de um Estado não pode ser objeto de aposta num jogo de rifa. Este país já foi sério no concerto das Nações. Há que resgatar a história para salvar a honra nacional. O cabo-verdiano é um povo nobre. Em todos os sentidos e dimensões. A verdade jamais será vencida!
Este Governo vai ficar lembrado também como aquele Governo que, antes de chegar ao poder, sabia tudo, tinha todas as contas feitas, tinha todos os estudos elaborados, e que, afinal, ao ganhar as eleições veio revelar que não sabia nada, estava despreparado, meteu os pés pelas mãos, caiu inúmeras vezes em contradição, perdeu várias vezes a coerência e agiu com base na intransparência nos negócios do Estado, acabando com o sistema de concurso para o acesso à Administração Pública e escondendo contratos, por exemplo, nos casos da Binter, Cabo Verde Inter Ilhas e TACV/CVA.
A prova desta impreparação foi apresentada várias vezes em diversos setores da governação, mas aqui vamos analisar apenas uma área que é a diplomacia e olhando somente para o caso ainda em desenvolvimento relacionado com o venezuelano Alex Saab.
A diplomacia cabo-verdiana deste mandato 2016-2020 vai ficar como uma nódoa na história da diplomacia deste arquipélago que um dia foi amplamente elogiado na arena internacional pelo reconhecimento da competência e discrição dos seus diplomatas, homens e mulheres, que desempenharam papéis fundamentais em dossiers altamente sensíveis como, por exemplo, o processo de construção da paz na África Austral e inúmeras missões de diálogo entre partes em conflito.
Mas, que não se pense que a questão da diplomacia diz respeito somente ao Governo no seu todo e ao ministro dos negócios estrangeiro em particular. Nada disso. A diplomacia, no caso de Cabo Verde, está intimamente ligada, aliás faz parte dela, ao próprio Presidente da República. É ele o responsável máximo pela política externa de Cabo Verde e é ele que detém o poder de veto, designadamente, na nomeação de embaixadores políticos. Pior do que ter batido o record histórico de nomeação de embaixadores políticos – nomeou de tudo, desde presidentes de partidos políticos a destacados membros fundadores de partidos, presidentes de câmaras de cores partidárias, até líderes de bancadas parlamentares também de partidos – pior do que a quantidade de nomeações de embaixadores políticos, é o facto de, o mesmo Presidente da República ter recusado anos antes a nomeação de um embaixador, invocando o facto desse ser “excessivamente partidarizado” e vir depois deixar esta outra nódoa na sua presidência ao nomear de uma assentada tanta gente “excessivamente partidarizada”, deixando para a história da presidência e da diplomacia uma injusta atitude de dois pesos e duas medidas.
Mas, que não se pense ainda que a lista das responsabilidades por este período de nódoa histórica fica por aqui. Há um derradeiro lote de responsáveis por esta situação que são os próprios diplomatas. Sempre muito ciosos dos seus direitos, os diplomatas cabo-verdianos criaram só para eles um estatuto que é só deles, repleto de regalias que até muito recentemente ultrapassavam os próprios emigrantes, com direito a um contentor com carro e tudo o que mais lhes aprouver, de cada vez que regressam ao país depois de um período de três ou mais anos de serviço numa embaixada no exterior. Como é possível que uma classe tão ciente do seu valor e da sua importância se tenha remetido ao silencio e à conivência com uma gestão a todos os títulos desastrosa da imagem do país no mundo? Como é possível que homens e mulheres não se tenham erguido para defender a honra da sua classe? Se não fosse pela honra em si mesma, ao menos que fosse pelos privilégios que usufruem! Várias vozes respondem que tamanha inação é devida a medo de represálias e, sobretudo, calculismo em garantir uma boa colocação, num posto diplomático na Europa ou na América!
O caso do Alex Saab é tão somente o desastroso desfecho de uma diplomacia e uma governação sem norte, às apalpadelas, com base no improviso e no mais elementar “achismo” e amadorismo. É consequência direta do desmantelamento do ministério de negócios estrangeiros, afastamento de quadros com experiência internacional acumulada e, claro, venda de consciência dos próprios diplomatas.
Só num contexto assim seria possível ter emissários internacionais deste calibre: um revendedor de máscaras em plena pandemia e um recém demitido diretor geral por se ter envolvido em negócios de sobrefaturação na organização de feira. Quem faz escolhas de emissários desta natureza é porque não esteve e nunca virá a estar preparado para dirigir os negócios estrangeiros e pior ainda dirigir um país. O resto são estórias de embalar para animar e entreter a malta que, há muito, vendeu também a sua consciência e só vê o país do tamanho do umbigo.
A direção
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