Em 2017, Cabo Verde viu a comunidade internacional financiar um programa de emergência para a mitigação dos efeitos da seca. Paralelamente a esse financiamento, os parceiros internacionais também financiaram um estudo exaustivo sobre como o nosso país deve enfrentar e conviver com a crise da seca, com recomendações e planos de ação para vários setores da vida económica e social do país. O financiamento, que incluía o vertente emprego público, mobilização de água e salvamento de gado, ficou pelas conversas na televisão e no parlamento, e nunca chegou na vida quotidiana das famílias. O estudo, este, ficou engavetado, e as famílias deixadas à sua sorte até finais de 2020, quando foram lembradas apenas porque as eleições estavam próximas e a “compra do poder” era uma emergência conjuntural.
Cabo Verde está a atravessar um longo período de seca. Nos últimos anos, o país teve pouca chuva, com resultados quase nulos na produção agrícola, sobretudo na agricultura de sequeiro.
A história regista que antes da independência nacional, o povo cabo-verdiano passava fome e carestias de várias espécies, com pestes e mortes muitas vezes em massa.
Com a independência, o país passou por um importante processo de infraestruturação no mundo rural, com programas de exploração de águas superficiais e subterrâneas, conservação de solos, construção de diques e obras de correção de bacias hidrográficas, projetos esses que contribuíram e contribuem para a mitigação dos efeitos da seca e promoveram a economia rural e a qualidade de vida das famílias.
O parlamento cabo-verdiano vai debater a política agrícola. Este debate, se feito com responsabilidade e sentido de missão pública, exige um olhar atento, humanista e com ênfase nas questões sociais.
Impõe-se, antes de mais, que debrucemos sobre alguns aspetos, cuja importância e impacto na política pública e no desenvolvimento do país, são fundamentais para a seriedade da avaliação que somos obrigados a fazer, por várias ordens de razão, entre as quais:
i. Há anos que o país enfrenta uma crise da seca e mau ano agrícola, com fraca ou nula produção.
ii. Os cabo-verdianos, ao longo de gerações, têm convivido com as crises de seca e é tempo de incluir os saberes e as práticas nas políticas públicas.
iii. Mais de metade das famílias do país vivem e dependem, direta e/ou indiretamente, da agricultura e das atividades agrícolas.
iv. Em contextos de seca, o impacto sobre as famílias rurais é profundo, com um peso ainda maior para as mulheres, por terem menos acesso aos recursos, comprometendo a sua autonomia e a de suas famílias.
Cabo Verde apresenta um sistema ambiental com alto grau de fragilidade e vulnerabilidade. Os dados históricos mostram que o país sempre sofreu secas recorrentes, que aliadas à falta de intervenções públicas atempadas, causaram fome e migração forçada. Nos dias atuais, é importante relembrar que associada a esta condição de fragilidade, o país, ainda, possui uma franja significativa da sua população enfrentando situações de vulnerabilidade socioecónomica, com cerca de 35% da população vivendo na pobreza, sendo as mulheres as mais afetadas (IDRF, 2015).
Cerca de 68% das famílias muito pobres de Cabo Verde vivem no meio rural e 54% são mulheres. Estas enfrentam mais dificuldades em termos de acesso ao rendimento e a bens e serviços, como água, saneamento, eletricidade, etc., o que as torna mais vulneráveis e presas no círculo vicioso da pobreza, carecendo de fortes investimentos por parte do Estado através de políticas públicas mais eficazes.
Todavia, não obstante a importância do setor agrícola para a sustentabilidade das famílias rurais, e não só, o MpD, desde 2016, tem diminuído consideravelmente o investimento do Estado no setor. Este desinvestimento tem provocado a precarização do principal meio de vida das famílias rurais, contribuindo para o aumento da taxa de pobreza no seio das famílias rurais, especialmente as chefiadas por mulheres.
Sem um programa para a agricultura e pecuária, sobretudo no capítulo da mobilização da água e de novas técnicas de produção agrícola, as famílias rurais foram abandonadas por este governo, o que equivale dizer que mais de metade da população do país está fora de qualquer programa ou projeto de desenvolvimento.
Este descaso do governo em relação às famílias rurais do arquipélago, ditaram a fome que hoje é uma realidade entre nós, e que nenhuma maquiagem institucional consegue esconder, sobretudo com terminologias de conveniência, como a já célebre “Insegurança Alimentar”.
É preciso falar claro, e dizer que este governo, por incúria, deixou que mais de 180 mil cabo-verdianos chegassem a situação de fome num lamentável regresso à década de 40, de triste memória.
Quase 7 anos no poder, o governo tem-se revelado incapaz de mobilizar água, tanto para consumo como para a agricultura. As pessoas – especialmente as mulheres e meninas – são obrigadas a deslocar-se longas distâncias para apanhar água, com consequências conhecidas e previsíveis na saúde, na qualidade de água, na pobreza de tempo, na segurança.
Em 2017, Cabo Verde viu a comunidade internacional financiar um programa de emergência para a mitigação dos efeitos da seca. Paralelamente a esse financiamento, os parceiros internacionais também financiaram um estudo exaustivo sobre como o nosso país deve enfrentar e conviver com a crise da seca, com recomendações e planos de ação para vários setores da vida económica e social do país.
O financiamento, que incluía o vertente emprego público, mobilização de água e salvamento de gado, ficou pelas conversas na televisão e no parlamento, e nunca chegou na vida quotidiana das famílias. O estudo, este, ficou engavetado, e as famílias deixadas à sua sorte até finais de 2020, quando foram lembradas apenas porque as eleições estavam próximas e a “compra do poder” era uma emergência conjuntural.
É este o quadro que Cabo Verde tem vivido no setor da agricultura e pecuária. Com o governo do MpD, houve retrocessos quanto aos ganhos alcançados no setor e na autonomização das famílias rurais. Ou seja, o governo Rabentola não tem políticas públicas nem para as famílias rurais e nem para os agricultores e criadores de gado, impactando negativamente a vida dos cabo-verdianos, e de forma excecional, a vida das mulheres que são as que mais sofrem com este fenómeno.
Comentários