A ligação entre as ilhas do Maio e Santiago, por se distarem a poucas - 15 milhas -, foi sempre regular, graças aos navios movidos à vela, através da chamada “navegação à bolina”, que até rentável era porque aproveitava energia eólica, gratuita.
As duas ilhas ligavam-se por navios, popularmente designados por “falucho”, todos propriedades de naturais da ilha do Maio, pois não existem registos a dar conta que algum deles tenha sido pertences de naturais de outras ilhas:
Pequenas embarcações construídas de madeira, integram a subcategoria de “chalupa”, e ficaram popularmente conhecidas pelo nome de “falucho”.
São de pequeno porte movido a vela latina, composto de um mastro e um gurupé[1] localizado quase na horizontal para o avante da proa do barco.
Dispõem-se abaixo de “cúter” na tabela classificativa da categoria de navios.
Duas dessas embarcações, ‘Belmira’ e ‘Aleluia’ ficaram conhecidas quer no Maio quer em Santiago, particularmente Pedra Badejo, por duas razões:
- Primeiro, pela longevidade, pois são todos da casa de 1920 e inícios de 1990 ainda operavam;
- Segundo, tornou-se no meio de transporte de passageiros sobretudo com o desenvolvimento da emigração maiense para a Europa e dos estudantes que se deslocavam à cidade da Praia para prosseguirem os estudos ao nível do secundário.
Construida em 1924[2], em Biche-Rotcha, na então vila do Porto Inglês, “Aleluia” comportava 10,00 metros de comprimento por 3,20 de boca e uma capacidade para transportar 160 sacos, o correspondente a 4 moios de sal.
Inicialmente baptizado com o nome “Boa Esperança”, “Belmira” foi edificada por volta de 1915, em local ignorado, projectada para carregar 160 sacos, igual a 4 moios de sal.
Propriedade do comerciante e armador bravense, Rafael Anahory que, no conjunto da sua actividade, chegou a possuir 13 navios para viagens inter-ilhas e percurso aos Estados Unidos da América, depois de passar à posse da Casa Costa, na cidade da Praia, o veleiro veio a ser foi adquirido por um natural da ilha do Maio, na década quarenta do século XX, pela quantia de 7.000$00.
Na década de sessenta vendeu-o ao filho.
Os dois barcos – Aleluia e Natal – tiveram uma vida útil de mais de sessenta anos ao serviço da cabotagem, mantendo a ilha do Maio em ligação permanente com Santiago.
‘Aleluia’ quase só fazia viagens Porto Inglês/Pedra Badejo e vice-versa. Já ‘Belmira’, além de Pedra Badejo, fazia ligações com os portos de São Miguel e Manguinho de Sete Ribeira, pois o proprietário tinha negócios por essas localidades. E de vez em quando alcançava Fogo e Brava. Daí, ter-se ficado mais celebrizado.
‘Belmira’ acabou por ficar ainda conhecido em 1981, quando se tornou objecto de notícia internacional, devido a um naufrágio.
O caso deu-se durante uma das regularíssimas viagens entre Pedra Badejo e Maio. Devido a dificuldades atmosféricas, o barco saiu da rota normal e manteve-se quase um mês à deriva, sem qualquer com comunicação, o que causou pânico, pois a bordo encontravam-se mais de uma dezena de pessoas entre tripulantes e passageiros.
Veio a aparecer, um mês depois, em Bubaque na República Guiné-Bissau.
Meados de 1982/1983, beneficiou de reparação e transformado em cúter – categoria de embarcação superior a falucho – com uma dimensão de 13,20 metros de comprimento por 4,50 de boca, e uma amplitude para transportar 240 sacos de sal – 6 moios –, e mudou o nome para “Natal”.
Em 1992, o Governo de Cabo Verde escolheu ‘Natal’ em gesto de homenagear as embarcações de navegação inter-ilhas, cunhou-o numa das moedas de 5$00.
Os dois barcos – Aleluia e Natal – tiveram uma vida útil de mais de sessenta anos ao serviço da cabotagem, mantendo a ilha do Maio em ligação permanente com Santiago.
Deixaram de operar, definitivamente, nos inícios de 1990 e abandonados sobre a areia da praia de “Biche-Rotcha”, na cidade do Porto Inglês.
Em homenagem a essas embarcações, que contribuíram para manter Santiago e Maio ligadas, o então Secretariado Administrativo do concelho de Santa Cruz, construiu sobre o rochedo de Ponta Pedra Badejo, uma esplanada com o nome "Falucho"
[1] “Gurupé”: conhecido na linguagem marítima da ilha do Maio por “Pou di bijerona”, porque suporta a respectiva vela com o nome popular de “bijerona”;
[2] Constantes dos processos de matricula dessas embarcações, arquivadas na Capitania dos Portos de Sotavento-Praia;
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