Antropólogo Brito-Semedo afirma que as ilhas cabo-verdianas não são africanas
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Antropólogo Brito-Semedo afirma que as ilhas cabo-verdianas não são africanas

O antropólogo Manuel Brito-Semedo afirmou hoje que as ilhas cabo-verdianas não são africanas e que o destino deste país não é África, pois a sua viragem é “toda para a Europa”.

“Nós nunca tivemos um destino africano”, disse à agência Lusa o investigador, que na próxima sexta-feira apresenta em Lisboa o seu mais recente livro: “Cabo Verde: Ilhas Crioulas – Da Cidade-Porto ao Porto-Cidade (Séc. XV-XIX)”, editado pela Rosa de Porcelana Editora.

Uma obra que dá conta do complexo processo que resultou na “cultura compósita” que é a cabo-verdiana, “a primeira nação crioula do mundo”.

“Nós não somos ilhas africanas. Por razões políticas, geográficas e outras, sim, mas a nossa cultura é uma cultura crioula”, disse.

E acrescentou: “Desde sempre, Cabo Verde esteve de costas viradas para o continente. As ilhas estão dispostas no formato de meia-lua, de costas viradas para o continente. Culturalmente sempre foi assim. Nós não nos conhecemos e há uma relação de desconfiança deles em relação a nós por causa disso”, adiantou.

Brito-Semedo recordou que, nos anos 50 do século XX, tendo em conta os movimentos anticolonial e pró-independência, os intelectuais consideraram que “era preciso negar Portugal e voltar para África”.

O antropólogo Brito Semedo é perentório ao afirmar que “não é verdade” que Cabo Verde seja uma sociedade africana: “Somos é uma sociedade crioula por razões estratégicas e económicas, políticas e geográficas. Estamos ligados a África, mas temos a noção que importamos de África uma coisinha de nada e a nossa viragem é toda para a Europa”.

“Temos de ser pragmáticos, sim. Não é tentar forçar livremente a escolhermos o nosso destino africano”, observou.

O investigador enumerou vários contributos para a cabo-verdianidade, como o processo do povoamento das ilhas (século XV), as secas e as fomes, determinantes para uma emigração, primeiro para os Estados Unidos, também a emigração forçada para São Tomé, para trabalhar nas roças” do cacau.

Após a independência, em 1975, o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) – que governava em regime de partido único em Cabo Verde e na Guiné-Bissau – declara que foi livremente escolhido o destino africano de Cabo Verde. “É falso”, denunciou.

A partir dos anos 80 (do século XX) há “uma viragem mais para Cabo Verde e é aí que começa a cabo-verdianidade, quando há rotura dentro do PAIGC e se confirma que era uma utopia haver a unidade de Cabo Verde e Guiné-Bissau”.

Para Manuel Brito-Semedo, Cabo Verde não precisa de se cingir a um só aspeto da sua identidade, pois seria mutilar a cultura cabo-verdiana.

E deu o exemplo da forma como a Cidade Velha, na ilha de Santiago, é apresentada a quem a visita, com enfoque no aspeto africanista e na escravatura.

“Está lá, sim, mas a cidade não é importante por causa disso, é reconhecida como Património da Humanidade [da UNESCO] por ter sido uma cidade europeia. Foi a primeira cidade europeia dos trópicos”, declarou.

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