Silêncio, uma prisão invisível!
Colunista

Silêncio, uma prisão invisível!

O medo só perde a força quando TODOS erguermos a voz, rejeitando as sombras que intimidam e abrindo espaço para que a verdade floresça por mais difícil ou desconfortável que ela seja. Nenhuma nação cresce sustentando silêncios impostos. Como aprendemos ao longo da nossa história, não há cadeia que possa prender um povo que decide falar, unido e consciente.

“Por vezes a palavra representa um modo mais acertado de se calar, do que o silêncio.” Simone de Beauvoir

Muitas vezes acreditamos que o silêncio é a escolha mais segura, um refúgio que nos protege de julgamentos ou confrontos. Contudo, há momentos em que calar significa assumir uma responsabilidade maior do que a nossa consciência pode suportar.

Simone de Beauvoir lembra-nos que, em certas ocasiões, uma palavra sabiamente colocada tem o poder de dizer o “indizível”, construindo pontes onde o vazio apenas aumenta a distância. A distância entre indivíduos cresce, quando mal-entendidos prevalecem ou palavras são sufocadas.

A palavra quando dita com cuidado, pode ser uma denúncia contra injustiças, um bálsamo para a dor, um desabafo ou mesmo um grito abafado no meio do caos. Não é a simples ausência de silêncio, mas a transformação do silêncio em algo pleno de significados. Uma amiga certa vez aconselhou-me a desconfiar dos “silêncios ruidosos”...

A palavra ponderada carrega peso, intencionalidade e, muitas vezes, a capacidade de transformar realidades.

Que não confundamos o calar com a ausência de acção. Escolhamos falar quando o mundo precisa de ouvir, mas com a profunda consciência de que a palavra só cumpre o seu papel quando emerge da verdade. Afinal, quem se cala nem sempre é sábio. Mas quem usa as palavras como um acto de humanidade deixa uma marca que transcende o tempo.

Portanto, que saibamos quando falar e, mais importante, que as nossas palavras sejam capazes de abraçar ou desafiar – como quem se cala no momento certo para depois fazer o mundo escutar.

Em Cabo Verde, muitas vezes o silêncio transforma-se numa prisão invisível.

A “política do medo” lança as suas raízes no receio de falar, na autopreservação de quem teme represálias ou exclusão. Neste contexto, o silêncio não é uma escolha, mas uma imposição. É assim que muitos aprendem a sobreviver num sistema que desencoraja a voz crítica e a verdade frontal.

Simone de Beauvoir inspira-nos a reflectir: - E se a palavra fosse a libertação de tantas consciências que hoje se calam?

Não se trata de falar por impulso ou de lançar acusações sem fundamento, mas de transformar o discurso num acto de coragem e renovação.

Cabo Verde, a terra da Morabeza e da luta, merece um povo que, na sua diversidade, reivindique o direito à palavra sem receios ou temores.

A política do medo ergue muros invisíveis entre as pessoas, gera desconfiança e alimenta ciclos de conformismo.

Ao optarmos pelo silêncio, permitimos que o medo se torne lei, que as desigualdades permaneçam intocadas e que as vozes mais frágeis sejam silenciadas.

Quando escolhemos a palavra – escolhendo-a bem – rompemos as amarras do medo. Assim, a palavra passa a ser denúncia, mas também esperança; pode ser coragem e, sobretudo, um convite à mudança.

Em Cabo Verde, onde tantas histórias de resistência e superação moldaram o seu povo ao longo dos séculos, que as nossas palavras não sejam gritos vazios, mas a materialização daquilo que queremos construir.

O medo só perde a força quando TODOS erguermos a voz, rejeitando as sombras que intimidam e abrindo espaço para que a verdade floresça por mais difícil ou desconfortável que ela seja.

Nenhuma nação cresce sustentando silêncios impostos. Como aprendemos ao longo da nossa história, não há cadeia que possa prender um povo que decide falar, unido e consciente.

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Comentários

  • Domingos Cardoso, 26 de Jan de 2025

    Este texto é de leitura obrigatória para todos os caboverdeanos, sobtretudo aqueles que, tendo conhecimento e coisas para dizer, optaram pelo silêncio. Obrigado Any Delgado!

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