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Santiago Norte só recebe banha de cobra para o seu desenvolvimento estrutural*
Ponto de Vista

Santiago Norte só recebe banha de cobra para o seu desenvolvimento estrutural*

No início do século XXI, melhores auroras pareciam chegar a Santiago Norte. Eletrificação dos recônditos povoados, abertura de zonas encravadas e a construção das barragens (seis de uma só acentuada) levavam esperança aos massacrados camponeses que tantas revoltas e manifestações fizeram para melhorar o seu destino. Hoje, o que pulsa e mantêm viva a esperança das gentes são os seus emigrantes e o cadastramento social. Sim o cadastramento social, ideologicamente engenheirado, para garantir um mínimo de miséria aos descamisados que a rudimentar agricultura, a pecuária e a pesca não conseguem alimentar.

Aos olhos nus, a demarcada Região Eleitoral de Santiago Norte transforma-se em uma ilha dentro da ilha de Santiago.

“Desilusão é pior que contestação”, disse-me um revoltado septuagenário, de Achada Bimbirim, a propósito do atual Governo de Cabo Verde. Compreende-se, quando ordeira e expressiva, a contestação fornece âmbitos que úteis são para arrepiar caminhos e melhorar o processo decisório. De facto, há uma serenidade aparente, mediante o contexto social em que se vive em Cabo Verde. Nem os desempregados, nem as corporações profissionais que perderam, drasticamente, o seu poder de compra contestam. Aliás, coletivamente não há contestações. Mas, existe uma forte e sisuda desilusão com este Governo do MPD. O senhor de Achada Bimbirim não é o único. É preciso sair da ilha, do conforto interesseiro criado, para se poder ver a ilha, como dizia Saramago

De entre outras constatações dignas de registo a desilusão é a que melhor expressa o sentimento mapeado na visita prolongada que há quatro meses vinha fazendo, de forma Pessoal e Discreta, á Região de Santiago Norte, através dos seis municípios que a compõem. Encerrei, na sexta-feira passada em Ribeirão Manuel estas visitas.

Não sem grandes esforços, e tristemente, pude notar que a ilha de Santiago alberga hoje uma outra ilha no seu seio. Santiago Norte, com os seus aproximadamente 121 mil habitantes, é uma ilha dentro da própria ilha de Santiago. Jovens com e sem diplomas, desempregados, pessoas de terceira idade, vulneráveis e desprotegidas que com desconfiança aceitam falar com estranhos. Animais esqueléticos a procura de arbustos em vastas leiras ressequidas de terras. Úmidas esquecidas ribeiras esperam mais tecnologia e mais ciência para o desenvolvimento. O imenso azul do mar que em meia lua banha Santa Cruz, São Miguel, Tarrafal e as pobres zonas costeiras de Rincão e Porto de Ribeira da Barca, constituem parte do ecossistema que faz a nova ilha, ombreado com irrefletidas e descontextualizadas ações antrópicas que replicam corredores de asfalto, faixas de minguantes pedonais e pequenas orlas marítimas.

Quem de forma atenta atravessar estes municípios, tanto pelo interior como pelas encostas marítimas, pergunta pelas fontes de sobrevivências das gentes que ladeiam as estradas e protegem-se nas sombras das acácias, eucaliptos ou velhas mangueiras deixadas pelo colonizador, em tempos idos.

Embora potencialmente rica, a RSN, nos últimos tempos, parece só receber banha de cobra para o seu desenvolvimento estrutural. Hoje demonstra também ter o seu elevador social avariado. Educação e Formação de Quadros que muito empoderaram a vida dos seus camponeses, pescadores e emigrantes, não mais funcionam. Os seus aportes são escassos ou quase nulo. Investir na Educação, mandando o seu filho a cursar na Universidade, não constitui garantia mobilidade familiar.  Não há complementaridades em investimentos públicos que as enquadram e encaixam estas ações.

Santa Catarina é o exemplo-padrão da nova ilha da Ilha de Santiago. O eclético e gigante concelho, em termos de potencialidades, retrocede-se em sonolência e auto estrutura-se como epicentro da nova ilha.

No início do século XXI, melhores auroras pareciam chegar a Santiago Norte. Eletrificação dos recônditos povoados, abertura de zonas encravadas e a construção das barragens (seis de uma só acentuada) levavam esperança aos massacrados camponeses que tantas revoltas e manifestações fizeram para melhorar o seu destino. Hoje, o que pulsa e mantêm viva a esperança das gentes são os seus emigrantes e o cadastramento social. Sim o cadastramento social, ideologicamente engenheirado, para garantir um mínimo de miséria aos descamisados que a rudimentar agricultura, a pecuária e a pesca não conseguem alimentar.

*Título da responsabilidade da redação

Artigo publicado pelo autor na facebook

 

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