Processo disciplinar no PAICV. Deputados resistem em responder a nota de culpa do CNJ
Política

Processo disciplinar no PAICV. Deputados resistem em responder a nota de culpa do CNJ

Júlio Correia, José Sanches, José Maria Fernandes da Veiga, José Maria Gomes da Veiga, Odailson Bandeira, Filomena Martins e Carlos Delgado, todos militantes e deputados nacionais nas fileiras do Partido Africano da Independência de Cabo Verde, resistem em responder à nota de culpa formulada pelo Conselho Nacional de Jurisdição (CNJ), no âmbito do processo disciplinar que este órgão do partido entendeu instruir por alegadamente terem violado os estatutos do partido, na sequência da discussão e aprovação da lei da regionalização do país.

Reina um clima de evidente crispação no seio do maior partido da oposição. Um email dirigido ao presidente do CNJ, Manuel Reis Portugal, e subscrita pelos militantes e deputados do PAICV acima referidos, cuja cópia Santiago Magazine teve acesso, espelha o estado de crispação e desconfiança reinante no interior do partido tambarina.

“A sua convocatória, senhor Portugal, indicia ilegalidades e ilegitimidades e tresanda a assédio político que não aceitaremos por aviltarem os princípios e valores do PAICV, e por avacalharem as Leis e a Constituição da República”, avisam os militantes e deputados visados, na referida missiva.

Para além de avisos, com laivos de ameaças, nesta missiva, os subscritores, condicionam a sua resposta a um conjunto de solicitações, cuja resposta da parte do CNJ reportam de urgente, a saber: “imediata identificação da pessoa ou da entidade que formulou queixa contra tais Deputados da Nação; igualmente imediata identificação da acusação, assim como a tipificação do incumprimento e/ou do crime, já agora que linhas de argumentação pressupõe”.

Os referidos militantes e deputados da nação indagam, também, sobre a competência do CNJ “para instruir processos disciplinares aos Deputados da Nação por estes terem exercido, em consciência suas responsabilidades parlamentares”.

E não ficam por aí. Os mesmos sugerem sobre a eventual ilegitimidade e ilegalidade do CNJ instruir processos contra deputados, alegando ser esta competência reservada à Assembleia Nacional.

“Recordar a ilegitimidade e ilegalidade da pretensão de notificar Deputados da Nação, sem a autorização e licença da Assembleia Nacional para o efeito, aguardando mui humildemente o (in)deferimento desta instituição do Estado; recordar também ao seu desconhecimento que os Deputados em questão votam como sujeitos parlamentares, respaldados pelas leis da República e pela Constituição, e que no caso em apreço os processos administrativos e outros só lhes podem ser imputados senão pela Assembleia Nacional (AN) e, mesmo assim, nunca por votarem em consciência; recordar ainda que aguardamos serena e responsabilidade a indicação pela Assembleia Nacional (AN) para respondermos ou não ao que nos solicita ou lhe foi mandado solicitar-nos”, lê-se na referida missiva.

Por fim, deixam a seguinte proposta ao Manuel Reis Portugal: “aguardaremos imediata e urgente resposta de V.Exa sobre esta notificação aos Parlamentares que nos parece misturar as águas que vão turvas e que se calhar devem ser dirimidas nos tribunais do País”, sugerindo que “já agora um tal depoimento a ocorrer um dia, desejaríamos fosse sessão aberta gravada e acessível aos militantes, aos cidadãos cabo-verdianos e à através da Comunicação Social”.

Recorde-se que no âmbito da aprovação da lei sobre a regionalização do país, a bancada do PAICV, liderada por Rui Semedo, decidiu por votar abstenção, alegando uma série de razões, entre as quais o aprofundamento da proposta de modo a provocar uma profunda reforma do Estado, com a consequente redução do número de deputados, a introdução de candidaturas uninomais, a desburocratização do estado com a redução das estruturas e a consequente redução das despesas de funcionamento da máquina administrativa, entre outras razões.

Entretanto, dois deputados, Odailson Bandeira e Filomena Martins, resolveram votar com a favor, José Maria Gomes da Veiga, resolveu votar contra, Júlio Correia, Carlos Delgado, José Maria Fernandes da Veiga e José Sanches resolveram abandonar a sala da sessão no momento da votação.

Tais atitudes resultaram na aprovação da referida proposta de lei, apresentada pelo MpD, e criaram uma série de embaraços ao PAICV, nomeadamente ao líder da bancada, Rui Semedo, à data recém-eleito, numa disputa renhida com o deputado José Sanches, tido como testa de ferro do grupo de reflexão, encabeçado por Felisberto Vieira e Júlio Correia.

Um grupo que, a crer nos factos que no passado haviam ocorrido, não é de hoje. Note-se que foram precisamente estes dois deputados que, em 2011, assumiram o protagonismo na candidatura independente de Aristides Lima ao cargo do Presidente da República, violando as decisões do Conselho Nacional do PAICV, que havia escolhido Manuel Inocêncio Sousa, como candidato oficial do partido.

Na ocasião, três individualidades do PAICV haviam entrado na corrida à escolha do candidato oficial do partido às eleições presidenciais, a saber: Aristides Lima, David Hopffer Almada e Manuel Inocêncio Sousa. David Hopffer Almada saiu derrotado logo na primeira votação, e Aristides Lima na segunda votação. Entretanto, Lima não ficou satisfeito com os resultados e partiu para uma candidatura independente, contando com Felisberto Vieira, à data, líder da Região Política de Santiago Sul, e Júlio Correia, então Secretário Geral do PAICV, como seus principais apoiantes.

Até hoje, esta divisão do PAICV é vista pelos militantes como o caminho que conduziu Jorge Carlos Fonseca ao Palácio do Plateau. Averiguar da veracidade ou não deste sentimento dos militantes e amigos do PAICV pode não ser de muito interesse neste momento, passados mais de sete anos.

No entanto, parece ser oportuna e pertinente averiguar até que ponto essa divisão continua ainda a massacrar os tambarinas.

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