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ORÇAMENTO DO ESTADO PARA O ANO ECONÓMICO DE 2024 - MEDIDAS DE POLÍTICAS DE PATRIMÓNIO PÚBLICO – AQUISIÇÕES DE BENS E SERVIÇOS - TITULO II: PARTE VII
Ponto de Vista

ORÇAMENTO DO ESTADO PARA O ANO ECONÓMICO DE 2024 - MEDIDAS DE POLÍTICAS DE PATRIMÓNIO PÚBLICO – AQUISIÇÕES DE BENS E SERVIÇOS - TITULO II: PARTE VII

Juntos na diulgação da Lei do Orçamento do Estado e do decreto de execução orçamental.

I.        CONTEXTUALIZAÇÃO:

O Orçamento do Estado (OE) para o ano económico de 2024 é aprovado pela Lei nº 35/X/2023, publicada na I Série – nº 134, do B.O., de 31 de dezembro, para vigorar durante o exercício económico de 2024.

O ano económico coincide com o ano civil, pelo que, vigora de 1 de janeiro a 31 de dezembro.

No Capítulo IV (dos artigos 17.º a 37.º) do Decreto-lei nº 1/2024, de 3 de janeiro, que define as normas e os procedimentos à execução do OE para o presente ano económico está consagrado o regime de AQUISIÇÕES E PATRIMÓNIO PÚBLICO – Aquisições Públicas - na Administração Pública (AP).

Nesta parte debruçar-nos-emos sobre o regime das compras públicas – aquelas aquisições em que, pelo menos um dos contraentes, é o Estado ou um ente publico (mesmo aqueles comparticipadas por capital público) celebradas por uma entidade adjudicante referida no artigo 5.º do CCP (Código da Contratação Pública), aprovado pela Lei nº 88/VIII/2015, de 14 de abril.

O regime de compras públicas é aplicável à formação dos contratos de empreitada de obras públicas, locação e aquisição de bens móveis, aquisições de serviços, serviços de consultoria, conceção de obras públicas, e conceção de serviços públicos, ao abrigo do nº 1, alíneas a) a f), do artigo 3.º do CCP.

O regime estende-se ainda, à formação dos contratos retro mencionados celebrados por quaisquer entidades, desde que financiados em mais de 50% (cinquenta por cento) pelas entidades adjudicantes, referidas ao abrigo do artigo 5.º do CCP.

Porém, é mister que tenhamos em atenção os contratos excluídos no âmbito do artigo 4.º do referido código, bem assim as nuances referidas pelos nºs 3 e 4 do artigo 3.º do diploma sub judice, para efeito de melhor enquadramento e qualificação jurídica dos contratos - enquanto contratos públicos de per si, e sujeitos a um regime sui generis.

Por conseguinte, o regime substantivo dos contratos públicos, obedece o previsto no Decreto-lei nº 50/2015, de 23 de outubro, republicado, que define as normas aplicáveis ao Regime Jurídico dos Contratos Administrativos (RJCA).

Portanto, as relações contratuais administrativas são regidas pelo CCP, pelo RJCA ou por lei especial, sem prejuízo da aplicação subsidiária daqueles quando os tipos contratuais não afastem as razões justificativas da disciplina em causa.

Já no âmbito dos contratos sujeitos a um regime de direito privado são aplicáveis aos órgãos da AP as disposições do CPA (Código do Procedimento Administrativo), aprovado pelo Decreto-legislativo nº 1/2023, publicado na I Série - nº 103 do B.O., de 2 de outubro de 2023.

É claro que, nesta análise, furtar-nos-emos ao regime substantivo das aquisições públicas e, muito menos, abordamos a dicotomia doutrinal de matriz europeia que diferencie contratos públicos de contratos administrativos.

Assim sendo cingir-nos-emos, apenas, nos procedimentos impostos pela Lei do OE para o presente ano económico (normas que já vêm de exercícios económicos precedentes).

    II.        DA ANÁLISE/APRECIAÇÃO:

a)    Tramitação eletrónica dos processos da contratação pública:

Vive-se a era da transição pelo que, o físico é substituído pelo digital. Com isto, consagra-se o tão designado período de “secularização documental e procedimental” – mediante a tramitação eletróncia dos procedimentos contratuais por parte dos integrantes do SNCP (Sistema Nacional da Contratação Pública) – Autoridade Reguladora das Aquisições Públicas (ARAP), Tribunal de Contas (TC), Direção Geral do Património e Contratação Pública (DGPCP), Operadores Económicos (OE), Entidades Adjudicantes (EA), Unidades de Gestão de Aquisições (UGA), Júris e cidadãos.

A tramitação eletrónica nos procedimentos quer contratuais quer administrativos é hoje, por regra, uma imposição legal ao abrigo do regime ex novum definido com a aprovação e entrada em vigor do novo CPA ao consagrar o princípio da governação eletrónica pelo que, urge a AP reformatar sistemas, implementar plataformas e desenvolver softwares para se fazer acelerar o processo de modernização administrativa e automatização dos atos a praticar.

Razão por que a lei do OE veio derrogar a aplicação do CCP, na parte que interessa, impondo o DEVER LEGAL de todos os integrantes do SNCP a utilizar a PECP (Plataforma Eletrónica de Contratação Pública), para tramitar procedimentos de contratação pública.

Um DEVER LEGAL em que sua inobservância constitui infração disciplinar, punida nos termos da lei.

b)    PAA (Plano Anual de Aquisições):

Definiu-se a continuidade, existência e vigência do PAA, no contexto das aquisições públicas. Porém, durante esse exercício económico consagrou-o como DEVER LEGAL. Assim, as entidades adjudicantes DEVEM elaborar, anualmente, a proposta do PAA, com todos os seus elementos essenciais, a ser submetido à aprovação pela entidade competente para autorizar despesas, por via eletrónica, até o final do mês de maio do ano anterior aquele a que diz respeito.

As entidades a quem incumbe autorizar as despesas com a contratação pública são aquelas que estão definidos na lei e variam de órgãos de serviços centrais ao Conselho de Ministros, dependendo do valor do contrato a celebrar.

O PAA depois de aprovado é publicado na PECP, até 31 de janeiro do ano vigente, contanto que visado pela DGPCP, também através da plataforma.

O incumprimento do previsto sujeita às entidades adjudicantes no cometimento de infração disciplinar grave mediante instauração do competente processo de natureza contraordenacional ao abrigo do CCP.

c)     Contratos Públicos de Aprovisionamento:

Introduziu-se o conceito de “Contrato Público de Aprovisionamento”, nos termos do qual os fornecedores ficam adstritos à prestação de determinados bens de acordo com as condições acordadas, designadamente o preço, para um conjunto de entidades públicas.

Pelo que, nos termos definidos na lei e tendo por base o Protocolo firmado entre a DGPCP e os fornecedores, os contratos de aquisição de bens e serviços, tais como, de eletricidade, água, telefone, internet, seguro auto, devem ser celebrados entre a DGPCP ou serviços equiparados de cada ministério e o fornecedor direto, em observância ao previsto do CCP.

Já os contratos de aquisição de bens e serviços, designadamente, serviços de segurança e vigilância privada, serviços externos de limpeza, manutenção de equipamentos e instalações, só podem ser celebrados mediante procedimentos de contratação pública adequado, promovido pela UGA ou pela UGAC (Unidade de Gestão de Aquisições Centralizadas), ou serviço equiparado.

Tais contratos não devem ser renovados findo o prazo de 3 (três) ou mais anos, sem que haja uma nova consulta do mercado, observando o estipulado por lei e em conformidade com a modalidade de aquisição.

Por seu turno, a formação dos contratos para aquisição e locação de bens, serviços e obras, serviços de consultoria feita no âmbito dos Projetos de Investimentos, pode ser conduzida pela Unidade de Coordenação dos Projetos, contanto que cumpra com o previsto no CCP.

Às entidades adjudicantes estão VEDADAS a celebrar mais de 2 (dois) contratos de prestação de serviço de carater contínuo com a mesma pessoa singular ou coletiva, por AJUSTE DIRETO, no âmbito da AP central, incluindo Serviços e Fundos Autónomos, Institutos Públicos, Autoridades Administrativas Independentes e as Entidades do Sector Público Empresarial.

Admitiu-se, também, a derrogação do critério regra – valor do contrato - na escolha do procedimento, como forma de dinamizar a economia local aplicável ex vi do nº 6, artigo 30.º, do CCP, a conjugar com o nº 1, artigo 68.º da lei do OE. Tal medida visa implementar programas específicos que impulsionam a economia local e promovam micro e pequenas empresas e empregos locais.

Definiu-se o valor de 20.000.000$00 (vinte milhões de escudos) como montante a partir do qual os contratos públicos, ficam sujeitos a fiscalização preventiva do TC em que, valor inferior, fica sujeita à fiscalização concomitante (através do acesso à SIGOF) e dos mecanismos de controlo da execução orçamental).

   III.        DAS OBSERVAÇÕES/RECOMENDAÇÕES:

a) questiona se as EA estão a CUMPRIR com o estipulado na lei na elaboração do PAA e, consequente publicação no portal de compras públicas até 31 de janeiro? Sem prejuízo da natureza ordenadora do prazo retro mencionado.

b) questiona-se, outrossim, se a Administração (central e local) tem criado as equipas da UGA, e devidamente credenciadas, ao abrigo do Decreto-lei nº 46/2015, de 21 de setembro, enquanto unidade de gestão e de condução de procedimento de contratação pública.  A gestão e condução do procedimento fora desse quadro é ilegal!

c) o procedimento por AD (Ajuste Direto) campeia na AP (v.g. do último Relatório publicado no site da ARAP, consta que cerca de 60% das aquisições na AP central, durante o ano de 2023, foram por AD). E na administração local???).

d) os contratos públicos de valor inferior a 20 milhões de escudos, ficam sujeitos ao controlo e fiscalização concomitante por parte do TC pelo que, dispensam o processo de adoção de visto em sede de fiscalização concreta/preventiva por parte daquele tribunal, ao abrigo do artigo 101º da Lei do OE.

e) há determinados contratos celebrados em regime de aquisições agrupadas que carecem de consulta de mercado, pelo decurso do tempo previsto por lei, in casu, aqueles decorrentes da terciarização de serviços na AP.

f) o decreto orçamental, bem como o CCP admitem a instauração de processos de natureza contraordenacional em desrespeito às regras e procedimentos com as aquisições públicas, com responsabilidade direta ao gestor público, e NÃO AO ESTADO. Se assim é, o Estado não acarreta responsabilidade pelo que, é sacado diretamente ao gestor e ali não prevalece o instituto de “Direito de Regresso”, nunca antes chamado e, muito menos, exercido.

g) porém, a responsabilidade é solidária a todos os infratores em cadeia (legitima e justa).

h) aguarda-se pela realização de auditorias por parte das entidades competentes, maxime, a ARAP e consequente publicação dos relatórios no website, conforme impõe o CCP.

i) no entanto, a tutela da ARAP é nomeada pelo Governo. Em consequência, como regular com independência, se a reguladora é a própria regulada??!!

j) por que não a celebração de “Acordo-quadro”, nos limites impostos por lei nas aquisições de carater continuo na AP?

k) a AP gere dinheiro público (dinheiro dos contribuintes) pelo que, todo o tostão deve ser muito bem gerido, com lisura e transparência.

l) está-se a dar primazia às aquisições agrupadas, com ganhos evidentes em termos de economia de escala?!

m) por fim, e não menos importante, urge implementar as compras eletrónicas, bem como definir mecanismos do E-procurement e desenvolver sistemas de compliance que garantam performance, segurança e modernização do SNCP.

 

Juntos na diulgação da Lei do Orçamento do Estado e do decreto de execução orçamental.

 

*Oficial da Polícia Nacional e Professor Assistente no Instituto Superior de Ciências Jurídicas e Sociais (ISCJS) na Praia.

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