Todos, mas sobretudo a classe política, temos de ser capazes de contribuir para um pacto de regime em matéria de Defesa e Segurança. Um desdobramento necessário de tal pacto tem de ser o consenso constitucional para a refundação do Sistema Nacional de Defesa e Segurança. O modelo vigente já está esgotado. Precisamos de um novo e mais ousado desenho que melhor responda à nossa condição de pequeno Estado, arquipelágico, atlântico, vulnerável e sujeito a ameaças globais. Dar a Cabo Verde esse novo desenho equivale a um desafio geracional. Julgo que o Parlamento deveria ter a sagacidade de constituir um comité de personalidades para debater esta matéria e propor cenários. Pois que, a meu ver, não haverá discussão produtiva se ela se confinar aos espaços contaminados pelas lógicas corporativistas e ou pelo despique partidário-parlamentar. É preciso sair dos outeiros tradicionais e entrar nas estradas largas normalmente percorridas pelas academias, pelas fundações, por think-tanks, por pessoas que estudam e reflectem profundamente. Também neste domínio Cabo Verde precisa de pensamento crítico.’
Haverá nesta X Legislatura serenidade e vontade política para, finalmente, se acercar de questões que exigem genuíno envolvimento de todos? Penso em particular nas atinentes à Defesa e Segurança Nacional. De duas, uma: ou faz-se o que tem de ser feito ou continuaremos em regime de angústia ao pequeno-almoço pelos escândalos que vão estalando, seja nas Forças Armadas ou noutra corporação, os quais nos vão dizendo que não adianta continuar a calafetar. Que não adianta contornar o nó dos problemas. Que não adianta alardear ‘bandeiras’ (vg, a da tal reforma das FA) cujo sentido e contornos em boa verdade de há muito deixaram de ser exprimidos com o necessário grau de convencimento e empenho. É só analisar o definhamento institucional do sector da Defesa Nacional... É só perguntar pelo real e substancial contributo de uns e de outros, para lá das proclamações.
Urge sair do rame-rame! Cabo Verde tem de ambicionar algo diferente, melhor necessariamente, mais eficaz com certeza, que garanta resultados e seja menos... dispendioso. Oxalá esta seja uma Legislatura que, em matéria de Defesa e Segurança Nacional, esteja claramente ‘ao ataque’.
E, neste contexto, recupero uma breve passagem de um texto meu intitulado ‘Estado de Direito e (in)Segurança em África’, partilhado em Janeiro de 2020: ‘quero referir-me a um desafio essencial: o da construção de consensos nas matérias relativas à Defesa e Segurança. A politização dessas matérias nas últimas campanhas eleitorais foi um erro tremendo. Eu disse isso logo em 2016, enquanto convidado ao ‘Jornal de Domingo’ da RTC. Continuo a pensar que vamos a tempo de controlar os estragos. Todos, mas sobretudo a classe política, temos de ser capazes de contribuir para um pacto de regime em matéria de Defesa e Segurança. Um desdobramento necessário de tal pacto tem de ser o consenso constitucional para a refundação do Sistema Nacional de Defesa e Segurança. O modelo vigente já está esgotado. Precisamos de um novo e mais ousado desenho que melhor responda à nossa condição de pequeno Estado, arquipelágico, atlântico, vulnerável e sujeito a ameaças globais. Dar a Cabo Verde esse novo desenho equivale a um desafio geracional. Julgo que o Parlamento deveria ter a sagacidade de constituir um comité de personalidades para debater esta matéria e propor cenários. Pois que, a meu ver, não haverá discussão produtiva se ela se confinar aos espaços contaminados pelas lógicas corporativistas e ou pelo despique partidário-parlamentar. É preciso sair dos outeiros tradicionais e entrar nas estradas largas normalmente percorridas pelas academias, pelas fundações, por think-tanks, por pessoas que estudam e reflectem profundamente. Também neste domínio Cabo Verde precisa de pensamento crítico.’
Artigo original publicado pelo autor no facebook
* Antigo Ministro da Defesa num dos governos de José Maria Neves
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