É sabido que a sociedade caboverdiana forjada por mais de cinco séculos de dominação colonial caracterizou-se na sua fase final por um colonialismo clássico quase sem colonos e na qual a literatura erudita pré-modernista foi introduzida e cultivada por uma elite islenha autóctone e castiçamente caboverdiana ou, pelo menos, muito marcada do ponto de vista cultural e identitário pela caboverdianidade, se bem que também enredada nas malhas armadilhadas da cissiparidade pátrida. É neste contexto que considera o estudioso Rui Guilherme da Silva que a literatura criadas e cultivada pelos nativistas caboverdianos foi equiparada à literatura colonial dos outros países africanos colonizados e, por esta via, indelevelmente marcada com o selo de uma alegada inautenticidade literária, não só porque do ponto de vista da sua temática teriam arredado Cabo Verde da sua literatura, como, porque do ponto de vista estético, se teriam limitado a imitar (e mal, invectiva-se!) os modelos portugueses dominantes na metrópole colonial e nas colónias/províncias ultramarinas (e os únicos disponíveis, ou pelo menos, os mais facilmente acessíveis).
SEGUNDA PARTE
II
O MODERNISMO LITERÁRIO CABOVERDIANO E A TRANSFIGURAÇÃO DE CABO VERDE COMO MATÉRIA EXCLUSIVA DA ESCRITA LITERÁRIA CONCOMITANTEMENTE COM A AFIRMAÇÃO DO CÂNONE CLARIDOSO COMO O CÂNONE LITERÁRIO MODERNISTA DOMINANTE E/OU EXCLUSIVO E SINÓNIMO DE UMA SUPOSTA CABOVERDIANIDADE CULTURAL AUTÊNTICA E/OU DE UMA LITERATURA GENUÍNA E VERDADEIRAMENTE CABOVERDIANA
1. A acima referida cissiparidade pátrida no plano literário só viria a ser superado e ultrapassado com a eclosão do modernismo literário e plástico que em Cabo Verde teve uma feição eminentemente telúrica.
E essa ultrapassagem/superação far-se-ia de forma radical e a vários níveis. No plano temático, Cabo Verde e o seu povo tornam-se matéria (quase) exclusiva da escrita literária, quer a vazada em verso, quer a lavrada em prosa.
A nível estético a opção é, na poesia, por um modernismo versilibrista (com algumas excepções em Manuel Lopes, ainda muito cultor da rima e, um pouco menos, da regularidade métrica em número assinalável dos seus poemas, e, mais tarde, em Arnaldo França, o poeta modernista caboverdiano que manteve o soneto - incluindo o soneto inglês - a sua forma versificatória predilecta), versilibrismo esse predominantemente incidente sobre o caboverdiano humilde, anónimo, meu irmão, encurralado pelas crises das estiagens e por outras crises (como a do Porto Grande da ilha de São Vicente), vegetando nos pequenos dramas da nossa terra e acossado pelo terra- longismo e pelo dilema bipartido consignado no célebre binómio dilemático Querer partir e ter de ficar e Querer ficar e ter de partir. Binómio dilemático esse que foi formulado pela primeira vez por Pedro Corsino Azevedo no poema “Terra-Longe” e retomado de forma consequente no evasionismo psicológico e no terra-longismo de Jorge Barbosa, por isso mesmo considerado ultra-evasionista e abjurado como o sumo-pontífice do evasionismo no célebre livro-manifesto Consciencialização na Literatura Cabo-Verdiana. Relembre-se neste contexto que esse mesmo livro foi editado pela Casa dos Estudantes do Império (CEI) e assinado por Onésimo Silveira, o autor do opúsculo de ficção Toda a Gente Fala: Sim, Senhor e do livro de poesia Hora Grande, já na altura identificado e marcado pelas autoridades colonial-fascistas como um feroz crítico e opositor da situação vigente, todavia desde há algum tempo assumido e reconhecido como mero, vivo e personificado, se bem que politicamente rebelde e sócio-culturalmente inconformista, pseudónimo de Manuel de Jesus Monteiro Duarte, o seu verdadeiro autor. Manuel Duarte que, de algum modo, foi obrigado a envergar as prudentes e anónimas vestes de ghost-writer do contundente livro-manifesto do nacionalismo cultural caboverdiano de matriz pan-africanista acima referenciado, em razão da semi-clandestinidade política a que eram todos coagidos pelas garras persecutórias da censura e da polícia política portuguesa nessa altura por demais sombria da história colonial-fascista e que, aliás, levou o mesmo Onésimo Silveira ao exílio e a viver prodigiosas aventuras pelo mundo fora, todas narradas e recontadas no livro de entrevistas Onésimo Silveira - Um Mar de Histórias, de José Vicente Lopes, lançado no nobre espaço da nossa confluência intelectual e cidadã intermediada pelo idioma comum da nossa atribulada história que é a sede da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa).
Na prosa de ficção, a necessidade de encontrar os meios estéticos mais adequados para a expressão da total comunhão entre o homem caboverdiano e a sua terra agreste, mas muito estimada, propicia a criação do chamado português literário caboverdiano, talvez a maior invenção literária claridosa.
No plano da convivialidade e do relacionamento intergeracional, a questão é por demais ambígua. Se no plano pessoal, as relações entre os claridosos e os seus predecessores nativistas são isentas de qualquer animosidade intelectual e geracional, e, até, assaz amistosas e marcadas pelo respeito mútuo e por alguma “admiração recíproca”, como testemunham Baltasar Lopes da Silva e Gabriel Mariano referindo-se às suas relações pessoais com o seu parente próximo, José Lopes da Silva, em entrevistas a Michel Laban, insertas na obra em dois volumes intitulada Cabo Verde- Encontro com Escritores, Volume I, até por força das relações familiares e da necessidade de co-existência pacífica e cordial numa pequena sociedade de forte interconhecimento, no plano estético-ideológico a ruptura parece total. É assim que tanto a estética como a memória dos letrados pré-claridosos é quase completamente rasurada da obra e da palavra escrita dos claridosos, salvo esparsas referências a Eugénio Tavares, enquanto cultor do crioulo literário e da morna, e as repetidas chamadas de atenção de António Aurélio Gonçalves para a devida valorização do contributo das gerações pré- modernistas caboverdianas para a ancoragem da literatura e da cultura erudita na nossa sociedade crioula.
Mais do que isso, considera-se que a escrita literária anterior à claridosidade padecia de falta de autenticidade, por isso, não podendo ser considerada como literatura verdadeiramente caboverdiana. Parece ter ocorrido neste caso o que ocorrera em outros países nos quais a construção dos sistemas literários nacionais se fez em oposição e em negação da literatura colonial primacialmente cultivada por colonos, isto é, por estrangeiros, quase que exclusivamente brancos europeus, radicados no território colonizado e privilegiados enquanto classe colonial com o exercício exclusivo e quase monopolista de todas as dimensões do poder e do saber erudito, como parece ter ocorrido na generalidade das colónias terceiro-mundistas das potências europeias (ou, pelo menos, com a representação soberana e simbólico-política, repartida desigualmente em algumas das suas instâncias com as elites letradas e burocrático-administrativas locais, das dimensões estratégicas do poder efectivo e do saber oficial exercidos a partir de um centro exterior situado na metrópole colonial, como parece ter sido em Cabo Verde). É sabido que a sociedade caboverdiana forjada por mais de cinco séculos de dominação colonial caracterizou-se na sua fase final por um colonialismo clássico quase sem colonos e na qual a literatura erudita pré-modernista foi introduzida e cultivada por uma elite islenha autóctone e castiçamente caboverdiana ou, pelo menos, muito marcada, do ponto de vista cultural e identitário, pela caboverdianidade, se bem que também enredada nas malhas armadilhadas da cissiparidade pátrida. É neste contexto que considera o estudioso Rui Guilherme da Silva que a literatura criada e cultivada pelos nativistas caboverdianos foi equiparada à literatura colonial dos outros países africanos colonizados e, por esta via, indelevelmente marcada com o selo de uma alegada inautenticidade literária, não só porque do ponto de vista da sua temática teriam arredado Cabo Verde da sua literatura, como, porque do ponto de vista estético, se teriam limitado a imitar (e mal, invectiva-se!) os modelos portugueses dominantes na metrópole colonial e nas colónias/províncias ultramarinas (e os únicos disponíveis, ou pelo menos, os mais facilmente acessíveis).
Gozando de uma aura quase mítica/mística na sociedade caboverdiana aquando da eclosão do modernismo literário, os Antigos não se deixaram intimidar. Respondendo a um escrito dos inícios dos anos trinta em defesa do modernismo literário, de Quirino Spencer Salomão, contemporâneo dos claridosos, Pedro Cardoso contesta-o numa “Profissão de Fé”, publicado no jornal praiense Eco de Cabo Verde, acusando os modernistas literários de bolchevismo literário e reiterando a sua defesa das regras clássicas de metrificação e de construção do poema, argumentando que o verso construído segundo essas rígidas regras continuava a ser “a vestimenta mais adequada à poesia”.
Facto é que a démarche claridosa fez escola e perdurou por um longo período. Tendo tido acolhimento no Amílcar Cabral do ensaio intitulado “Apontamentos sobre a Poesia Cabo-Verdiana”, publicado, em 1952, no Boletim Cabo Verde, a óptica e a postura teórica de considerar que a literatura cabo-verdiana só teve verdadeiramente início com os escritores e ensaístas claridosos seria acesa e acerrimamente defendida por vários intelectuais das gerações claridosas e das várias vagas neo-claridosas seguintes, com destaque para Jaime de Figueiredo, Henrique Teixeira de Sousa, Manuel Ferreira e Gabriel Mariano. Por tal forma, que o cânone literário claridoso, quer na poesia, quer na prosa de ficção, quer ainda no ensaio, tornou-se sinónimo de literatura caboverdiana.
É isso mesmo que ficou plasmado nas duas primeira grandes antologias da literatura caboverdiana, a Antologia de Ficção Cabo-Verdiana Contemporânea, organizada por Baltasar Lopes da Silva, prefaciada por António Aurélio Gonçalves e introduzida por Manuel Ferreira, e a antologia Modernos Poetas Cabo-Verdianos, organizada e prefaciada (apresentada) por Jaime de Figueiredo.
Editadas por ocasião das celebrações oficiais do Meio Milénio do Achamento de Cabo Verde, essas mesmas que mereceram uma crítica abordagem de Jorge Barbosa no poema “Meio Milénio” e os seguintes versos de Ovídio Martins: “Sol ou chuva/para vós as glórias do achamento/para nós os sonhos em ampulhetas”, as duas antologias serviram aos seus organizadores para provar e ilustrar de forma firme, eloquente e insofismável a existência de uma literatura caboverdiana, consistente, qualitativamente pujante, ainda que escassa do ponto de vista quantitativo, e, sobretudo, auto-suficiente e autónoma em relação à literatura portuguesa ou a qualquer outra literatura conhecida, mesmo se a tendo influenciado muito, como efectivamente ocorreu com o papel de alumbramento que a literatura brasileira nordestina e a forte influência que as literaturas portuguesa, francesa, norte-americana e russa exerceram sobre alguns dos mais proeminentes escritores modernistas criadores da moderna literatura caboverdiana.
E nisso residiu a sua inteligência: aproveitar as brechas e as oportunidades consentidas pelo sistema colonial-fascista vigente para a sua própria afirmação como escritores de uma literatura específica, a moderna literatura caboverdiana, nessa altura em processo de céleres afirmação e consolidação.
Tendo conhecido três fases (a primeira, de 1936/1937, a segunda, de 1947/1948/1949 e a terceira, de 1958/1960) e apesar de ferozmente contestada pela geração nacionalista de cinquenta, a claridosidade pôde afirmar-se e consolidar-se não só como um movimento literário modernista, mas sobretudo como uma ética e uma estética de comunhão com a terra e o o povo caboverdianos servidas pelo chamado português literário caboverdiano e sustentadas numa compreensão sociológica e antropológica da sociedade caboverdiana como sociedade crioula com predominante teor cultural europeu (pelo menos, tendencialmente se considerada a totalidade das ilhas) e na qual a pobreza de recursos naturais teria optimizado uma ampla mestiçagem biológica e uma cabal miscigenação cultural, tendo, por isso, supostamente esbatido os conflitos raciais e acelerado a diluição de África na cultura caboverdiana, pelo menos do ponto de vista identitário e no plano antropológico-cultural.
Relembre-se neste contexto que, segundo os termos propostos no esquema introduzido e fundamentado pelo sociólogo brasileiro Artur Ramos no seu livro O Negro Brasileiro e entusiasticamente adoptado pelos claridosos-fundadores e pelos seus seguidores, o devir histórico e a evolução das comunidades humanas postas em contacto cultural repressivo e assimétrico com outras comunidades humanas por via da dominação colonial-escravocrata (sendo, por isso, a cultura da comunidade dominante considerada sempre como a superior) processar-se-iam de forma paulatina, mas irreversivelmente, da fase da reacção (isto é, de confronto entre as duas culturas e de resistência da cultura da comunidade dominada em relação à cultura da comunidade dominante) passando pela fase de adaptação (isto é, de cedências mútuas e reelaboração das culturas originalmente em confronto, com decisiva adequação da cultura da comunidade dominada às exigências e solicitações da cultura da comunidade dominante) disso resultando o surgimento de uma cultura-síntese) culminando na fase de aceitação da cultura da comunidade dominante por parte da comunidade dominada . Na óptica dos claridosos, com destaque para o Baltasar Lopes da Silva dos ensaios “A Linguagem das Ilhas” (publicado na primeira fase -1936/1937-da revista Claridade) e “Uma Experiência Românica nos Trópicos” (publicado na segunda fase -1947-1949- da mesma revista) bem assim de “Cabo Verde Visto por Gilberto Freyre” (publicado, em 1956, em formato de livro pela Imprensa Nacional de Cabo Verde), de João Lopes dos dois ensaios publicados na primeira fase da revista Claridade e de Pedro de Sousa Lobo, do ensaio publicado no nono e derradeiro número da mesma revista, todas as ilhas caboverdianas estariam, dos pontos de vista cultural e antropológico, na fase da aceitação da cultura europeia/portuguesa dominante, com alegada excepção da ilha de Santiago, considerada a mais africana e a mais atrasada das ilhas caboverdianas dos pontos de vista cultural e antropológico. Com efeito e na opinião desses mesmos letrados integrantes de várias vagas claridosas, ultrapassada a fase da reacção, considerada a primeira fase no processo de aculturação de uma comunidade dominada, e acima referido, a mesma ilha de Santiago - ou, pelo menos, o seu hinterland (interior rural) - encontrar-se-ia atolada ainda na fase de adaptação, não atingindo ainda, como as demais ilhas irmãs caboverdiianas, a fase da aceitação.
Pontos de vista mais ou menos diferentes viriam a defender o claridoso de segunda vaga Henrique Teixeira de Sousa, designadamente no ensaio Cabo Verde e as Suas Gentes, publicado em 1954, como separata do Boletim Cabo Verde, e o nova-largadista Gabriel Mariano, do ensaio “A Mestiçagem: O Seu Papel na Formação da Sociedade Cabo-Verdiana”, publicado no número único do Suplemento Cultural, e do ensaio “Do Funco ao Sobrado ou o Mundo que o Mulato Criou”, apresentado em forma de comunicação aos Colóquios Cabo-Verdianos, realizado em Lisboa, em 1958, e publicados no livro homónimo pela Junta de Investigação do Ultramar, constando os dois supra-referidos ensaios do livro Cultura Caboverdeana, de Gabriel Mariano, colectânea que reúne todos os seus ensaios.
Com efeito, Henrique Teixeira de Sousa defende de forma expressa que o processo de aculturação ocorrido em Cabo Verde teria culminado na fase de adaptação correspondente à mútua assimilação entre as duas comunidades em contacto no processo de aculturação e à diluição das duas culturas inicialmente presentes e em confronto (a afro-negra e a europeia) numa nova cultura emergente, a cultura crioula caboverdiana, na qual prevaleceria com maiores fulgor e vigor a componente cultural de matriz europeia, do que a de matriz africana, aliás, considerada em irreversível processo de diluição, tal como apregoado por Baltasar Lopes da Silva e pelos seus seguidores neo-claridosos.
Por seu lado, afirmando que Cabo Verde é uma nação que nasceu na culatra do colonialismo, Gabriel Mariano caracteriza a cultura caboverdiana como, a um e simultâneo tempo, um continente cultural uno na sua unidade e e homogeneidade, e um arquipélago cultural, plural e multifacetado na sua diversidade cultural emergente da diversidade das suas ilhas, das suas populações e das suas expressões e manifestações linguísticas (incluindo o seu crioulo), preferindo situar na ampla diversidade arquipelágica caboverdiana as especificidades da ilha de Santiago (cuja cultura, aliás, vivenciou e conheceu muito bem, por aí ter vivido parte importante da sua infância e da sua adolescência, e em cuja variante dialectal escreveu todos os seus poemas em crioulo).
Assumindo-se como um movimento modernista marcado pelo telurismo, a revista Claridade pôde absorver as gerações de escritores (esmagadoramente modernistas) que se seguiram aos claridosos-fundadores e a uma claridosidade a consolidar-se como uma estética quase confundível com a própria caboverdianidade literária.
É isso mesmo que ficou confirmado e consagrado nas duas antologias acima referidas.
Apesar do seu importante e significativo legado na poesia, na prosa de ficção e na escrita jornalística, de continuarem a gozar de enorme prestígio junto das elites e do povo caboverdianos e das autoridades coloniais portuguesas e não obstante um deles (José Lopes da Silva - 1870-1960), permanecer vivo durante todo o magistério e ao longo da intermitente existência da revista Claridade (1936-1960), se bem que assaz acomodado e/ou largamente recuperado pelo poder colonial-fascista vigente, os escritores anteriores aos claridosos são simplesmente ignorados e totalmente esquecidos e rasurados nas publicações periódicas e unitárias, em suma, nas obras editadas ou patrocinadas pelos claridosos e pelos seus seguidores das várias vagas neo-claridosas bem como pelos seus adversários modernistas e nova-largadistas das várias gerações, sendo ademais, e, até, estético-ideologicamente desprezados, vituperados e/ou vilinpendiados por alguns deles, o que todavia não impede a sua coexistência pacífica, por vezes pontuada por alguma polémica, nas páginas ecléticas e muito conviviais do oficioso e culturalmente muito aberto Boletim Cabo Verde.
Assim, a afirmação do cânone claridoso, dos seus pontífices, epígonos e discípulos ocorre, a par e passo, com a denegação/renegação do cânone anterior de muitos teores e faces e de múltiplas dimensões ((ultra)romântica, neo-classicizante, arcádica e simbolista) e a redução da validade da sua escrita àquela vazada em crioulo e/ou em defesa do crioulo, vertente, aliás, comum a todas as gerações literárias caboverdianas, sendo todavia a cissiparidade pátrida claridosa, relevante sobretudo na vertente ensaística e cívico-política do seu labor, uma pálida imagem da exemplar e indomável combatividade cívico-política dos nativistas.
Apesar da sua concretizada pretensão de absorção no seu seio modernista teluricista de todas as gerações literárias que se lhe seguiram e de (quase) todos os seus protagonistas, a própria claridosidade não se viu isenta de críticas, por vezes demolidoras.
Beneficiando embora do alargamento da sua área de jurisdição literária mediante o contributo de poetas e prosadores oriundos das ilhas de São Vicente (com o mais velho António Aurélio Gonçalves e os mais novos Aguinaldo Fonseca, Nuno de Miranda, Ovídio Martins, Corsino Fortes, Onésimo Silveira e Yolanda Morazzo), de Santiago (com Maria Helena Spencer, António Nunes, Arnaldo França, Euclides Meneses, Pedro Duarte e Virgílio Pires), do Fogo (com Henrique Teixeira de Sousa), de São Nicolau (com Gabriel Mariano), de Santo Antão (com Guilherme Rocheteau, Tomás Martins, Teobaldo Virgínio e Luís Romano), da Boavista (com Terêncio Anahory) e do Sal (com Pedro de Sousa Lobo e Jorge Pedro Barbosa) e do enriquecimento dos pressupostos estético-ideológicos da sua literatura e dos fundamentos antropológicos, sociológicos e históricos da sua explicação da sociedade caboverdiana, sobretudo através dos ensaios de Henrique Teixeira de Sousa, Gabriel Mariano, Pedro de Sousa Lobo e António Carreira, a claridosidade e os claridosos-fundadores em particular viriam a ser severamente contestados pelos escritores modernistas e nacionalistas dos anos cinquenta/sessenta do século XX.
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