Os Lambe-botas e o círculo do poder
Ponto de Vista

Os Lambe-botas e o círculo do poder

Em Cabo Verde, há quem pense que o poder emborracha e emporcalha. E outros até defendem que se está perante um sistema que considera privilégios (corporativos, hereditários, sociais, etc.) em função da posição social, da arte de bajular e do poder político. De todo modo, parece ser legítimo e imprescindível que existam os lambe-botas, que premeiam e divulgam as “avaliações positivas” do desempenho dos políticos sem as quais dificilmente seriam. Sendo assim, o que fazer com esses “comedores” que brotam à sombra de quem tem o poder?

Uma boa parte dos cabo-verdianos, principalmente os que frequentaram mais tempo a escola, tornou-se adepto de uma crença de que, na administração pública, para se ascender ao topo, já não precisa fazer carreira, muito menos da meritocracia, enquanto valores que estabelece que a regra para a ocupação de posições em uma organização deve ser derivada do mérito de cada um, ou seja, do merecimento por seu desempenho individual. Descobriu-se uma fórmula muito mais fácil que é “lamber a bota” aos políticos que estão no poder. Certamente que, desta forma, também se consegue usufruir das benesses do que é público.

Com este modelo, assiste-se ao surgimento, principalmente depois das eleições, de claque de bajuladores, seres moralmente desvigorosos, que não tendo outros meios para subir na hierarquia administrativa e satisfazer seus egos e seus sonhos macabros, tentam “abraçar e beijar” os eleitos políticos.  Muitos, nunca tiveram opinião nem argumentos. Nunca criticaram porque aprenderam sempre a estar do lado de quem tem o poder, ou “em cima do muro”.

Entretanto, agora surgem cheios de vontade de “prestar serviço” insurgindo até contra os que aprenderam sim a admirar, reconhecer e até elogiar, mas também avisar e criticar sempre que haja erro.

Diz o ditado que “quem não puxa o saco, puxa a carroça”. Com isso, atendendo que a nova geração de cabo-verdianos tem uma propensão muito forte de conquistar as coisas de forma mais fácil, essa prática parece que convida a atitudes de diversas formas de mendicância por parte de muitos pilantras e trambiqueiros.

Mesmo sabendo a classe política cabo-verdiana que atualmente a sua repulsa pela população é enorme, o que o tem levado a jogos de cintura, muitas vezes de duvidosa e incompreensível legalidade para se conseguir ganhar uma eleição, crê-se de que existem políticos que gostam dos engraxadores. Mas, a esse respeito, Friedrich Nietzsche também já tinha ensinado que “Aquele que sabe mandar encontra sempre quem deva obedecer”.

Talvez, por isso, os políticos continuam nomeando os “engraxadores” para cargos de elevada responsabilidade sem que nunca, nenhum desses manteigueiros tivessem problemas em aceitar ainda que de forma imoral, incompetente e indecente, qualquer função ganha pelo simples fato de ser lambe-botas. Pior ainda é que, na perspetiva dos políticos que os nomeiam, tratam-se de “gestores natos”, que jamais precisam sequer prestar contas do ato da sua administração “que sempre cumpre seus objetivos com ganhos visíveis”.

Entretanto, deve-se tirar o chapéu a muitos quadros cabo-verdianos que são pessoas íntegras e trabalhadoras, que dão tudo de si para o País. Trabalhadores que, de acordo com Day Anne, “preferem puxar a carroça do que carregar o ego dos outros nas costas”.

Em Cabo Verde, há quem pense que o poder emborracha e emporcalha. E outros até defendem que se está perante um sistema que considera privilégios (corporativos, hereditários, sociais, etc.) em função da posição social, da arte de bajular e do poder político.

De todo modo, parece ser legítimo e imprescindível que existam os lambe-botas, que premeiam e divulgam as “avaliações positivas” do desempenho dos políticos sem as quais dificilmente seriam. 

Sendo assim, o que fazer com esses “comedores” que brotam à sombra de quem tem o poder?

Cabo Verde parece estar apinhado deles e desabrocham espontaneamente que nem bichos depositados por moscas em matérias em putrefação. Por isso, não resta outra saída a não ser preparar-se para conviver com eles. Pois, poucos acreditam na implementação de um sistema eficiente e satisfatório baseado na meritocracia para todos.

Um bem-haja a todos os leitores!

Cidade da Praia, 04/05/2021

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