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Março, percursos e coragem de uma mulher
Ponto de Vista

Março, percursos e coragem de uma mulher

Natural de São Salvador do Mundo, Picos, os seus pais são originários de dois pontos extremos da ilha de Santiago. A mãe é também de Picos e o pai de Praia Baixo, facto que, além de estender os seus laços familiares, marcaram sua infância dividida entre Picos, nomeadamente Fundura, Boca Larga e Burbur, Praia Baixo e ainda Renque Purga, onde os seus pais, depois de casados, fixaram definitivamente a residência.

Sua infância foi dura, como a de qualquer outra mulher da geração de 60 que nasceu no campo, mas, mesmo assim, não a impediu de sonhar com uma vida midjor. Assim, em finais dos anos 70, rumou para a Praia, fixando residência primeiramente em Calabaceira e, posteriormente, em Vila Nova.

Na Praia, trabalhou inicialmente como doméstica em casa de pessoas e, depois de fixar residência em Vila Nova, começou as lides da rabidância, facto que ainda hoje marca a sua vida, vendendo roupas usadas que vinham dos Estados Unidos no mercado desta zona, fazendo complementarmente pequenas costuras em casa, rendas e bordados, vendendo freskinha e fazendo as suas poupanças, em cofres de madeira ou através de totokaxa, sempre com um objectivo em vista.

Mais tarde, foi para o mercado de Sucupira, onde ficou até 1999. Sem saber ler ou escrever oficialmente, começou a viajar para Dakar e, mais tarde, com algumas incursões pela Gâmbia, durante vários anos para adquirir produtos para a venda, sobretudo vestuário, mas também utensílios de uso pessoal e doméstico que não existiam no mercado interno. Em 1999/2000, face a dificuldades várias e porque o mercado tradicional de Sucupira começava a ser ameaçado pela concorrência das lojas chinesas, em emergência, e pelos produtos trazidos do Brasil por outras rabidantes, decidiu, em busca de uma vida midjor, pon y skola para os seus filhos, seguir os destinos da emigração, fixando a sua residência em Portugal, onde vive até hoje. Com isso, conseguiu realizar esse objetivo, mandando dinheiro, encomendas diversas, através de amigos e familiares, e bidões ou caixotes com comida, roupas e outros utensílios para consumo e venda. Apesar dos anos, continua ainda a trabalhar por uma vida midjor como se ainda estivesse em tenra idade. Não perdeu o seu gosto pela rabidância, agora sua actividade secundária, e quase todos os anos, na época festiva, vem para a sua casa em Vila Nova vender os seus produtos, sobretudo os destinados às “donas de casa”.

A regularidade das suas vindas, nos últimos anos, permitiu-lhe criar uma clientela. E quando se aproxima a época festiva, todos ficam ansiosos e a perguntar quando ela vem, se já tirou a karga di alfândega, ou que tipo de produtos ou variedades ela trouxe.

É a esta mulher - nascida no primeiro dia do mês de Março, no ano de 1961, que deu à luz dois dos seus filhos também em Março, e que hoje, Dia Internacional da Mulher, me inspirou estas linhas - que dedico a morna “Amor de Mãe”, cantada de forma sublime e com muita emoção por Morgadinho, que é igualmente o compositor, em dedicação a todas as mães do mundo.

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Redação