Subsídios para um Melhor Sistema Marítimo e Portuário Nacional
Colunista

Subsídios para um Melhor Sistema Marítimo e Portuário Nacional

Um dos mais recentes anúncios relacionados com o mar dá conta de extinção da AMP (Agência Maritima e Portuária) para se repor o anterior figurino IMP (Instituto Marítimo e Portuário). Não conheço o «framework» do retomado figurino em termos de atribuições e de correções ao sistema em geral pelo que proponho, nas linhas abaixo, as seguintes caraterísticas do sistema marítimo portuário , como contributo para sua melhoria a nível nacional:

1. Não extinguir a AMP mas sim aproveitar o estudo de sua estruturação em curso pela consultoria IOS Partners ( o tesouro nacional está a atribuir, para o efeito, a quantia de 357. 961, 84 dólares americanos), para formatá-la de forma a se prestar por um modelo mais adequado de exercício de administração marítima e de regulação compatível com os objetivos atuais do novo governo;

2. Assumir, assim como se fez com o setor de aeronáutica civil, esse figurino misto de prestação para administração e regulação, já que o argumento é absolutamente similar: um setor muito especializado cujas atribuições se realizam na base de aplicação rigorosa de parâmetros, diretivas e leis de natureza internacional aos quais C. Verde está vinculado por via de adesão, ratificação e implementação de instrumentos, designadamente convenções marítimas internacionais e demais normas de organismos da comunidade marítima internacional;

3. Moldar a atual assistência técnica da IOS Partners á AMP de modo a não só assegurar as mudanças atualmente exigidas pelo governo mas também se assegurar os seguintes relevantes estabelecidos, e bem, nos Termos de Referência:

  1. a) Uma nova orgânica, com um desenho de estrutura organizacional que reflita a atual dinâmica do negócio marítimo e portuário nas várias ilhas de modo a não perpetuar a ausência atual de estruturas e meios de resposta á dinâmica e exigência dos operadores na maior parte das ilhas de norte a sul. Desta forma deverão ser estruturados tanto a norte (barlavento) com a sul (sotavento) representações e meios ao mais nível, com a novel AMP;
  2. b) Um sistema de informação que permita prestações em articulação com a sede mas de forma autónoma e com prontidão em relação a todas as demandas/serviços de administração e regulação dos operadores e «users» em qualquer representação da AMP nas ilhas;
  3. c) Conformar as instalações de segurança e comunicação maritimas como os VTS, rádios, GMDSS, Navtex etc para reinstalar o sistema de segurança marítima, que inclui o centro nacional a norte e o subcentro a sul para assegurar serviços de controle do tráfego marítimo, SAR e de prevenção e combate á poluição marítima com as competências e eficiência operacional que garantam igual capacidade dessas prestações em todo o território nacional;
  4. d) Um plano de formação na base do levantamento e definição de todas as formações necessárias para o novo paradigma de funções e desempenho da novel AMP, incluindo um esquema de sua implementação (com a indicações de instituições formadoras e meios necessários para execução;
  5. e) Análise das taxas recentemente elaboradas pela AMP que atualiza e adequa o seu âmbito e aplicação e produzir recomendações de aplicação e de melhoria do sistema financeiro geral da instituição;
  6. f) Propor na base da alínea a) e c) o quadro de pessoal a adotar e analisar aplicação dos instrumentos de gestão muitos deles já elaborados pela AMP;
  7. g) Propor um plano de curto e longo prazos de desenvolvimento de atividades da AMP.

4. De uma forma geral, a formatação da AMP, deverá, ainda, refletir as atuais exigências de sua prestação em relação á segurança marítima incluindo as suas obrigações internacionais e nacionais em relação ao SAR (Busca e Salvamento), prevenção combate á poluição marinha, controle do tráfego marítimo/navios (VTS) e gestão costeira. Aliás o anuncio da migração da taxa de segurança para outros destinatários terá sido lapso de discurso, pois as atribuições em relação á segurança marítima, os equipamentos, a gestão e utilização e os próprios projetos de respetiva instalação do sistema inerente foi trabalhado pela e para AMP! Essa e outras taxas, incluindo as relacionadas com a gestão costeira (esta por partilha com outros organismos da câmara, ordenamento do território e do ambiente – é a minha proposta), continuarão ser base da sustentabilidade financeira da AMP que funcionará sem um tostão proveniente do Estado mas sim assegurando meios financeiros razoáveis para o tesouro!

Por esse motivo, a estruturação futura da AMP, deverá ser numa lógica de inclusão (e não de exclusão) num sistema formado por outras instituições (ambiente, ordenamento território, camaras municipais, guarda costeira, policia marítima e proteção civil), garantindo que cada um cumpra com as respetivas especializações e obrigações numa articulação que garanta um desempenho fiável, competente e em tempo útil em relação aos serviços públicos demandados. No quadro da tal estruturação é mister rever a situação das capitanias que há muito já não tem a polícia marítima, vertente que dava forma ao exercício indispensável de autoridade marítima. O papel das capitanias deverá, no futuro, integrar um quadro de prestações que, em conjunto com organismos não civis, e prover os serviços de fiscalização e de «law enforcement» no mar, constituindo assim uma estrutura complementar do sistema de administração, regulação e autoridade marítima, consistente com o engajamento do país nas estratégias regionais de segurança e tráfego marítimo no nosso corredor atlântico. A parte de regulação, deverá permanecer com a agência devido á especialização, obrigação e de exigência de exercício independente, subjacente aos serviços da AMP (e não ao de um outro organismo), necessitando também da autonomia e meios financeiros para a exercer com a eficiência que só um organismo independente que muito custou-nos constituir, poderá garantir. Para adequar essa prestação, já que se critica o seu desempenho basta capacitar ( e não extinguir!) os departamentos de regulação técnica e económica e instalá-los, e bem, no o norte e sul das ilhas.

5. Por outro lado, considerando que o mar tem sido assumido como o principal desígnio nacional de desenvolvimento e que as ilhas (ou algumas delas), como nas Canárias, têm potencialidades quase similares de desenvolvimento do setor, desaconselho totalmente quaisquer medidas de exclusividade que, de novo, venham aumentar assimetrias ilegítimas que perpetuaram o fraqueza de condições e de governação do setor na maior parte das ilhas e vão contra as argumentações dos principais paladinos da regionalização. Há que promover o desenvolvimento deste setor em todas as ilhas e permitir que a futuras regiões possam emparceirar e administrá-lo para, á semelhança das canárias, uma e outra ilha possam lutar pela vida, em pé de igualdade, em termos de serviços de «bunkering», intermediação logística, infraestruturação e capacitação institucional próprias e formação de seus dirigentes (as ilhas não vêm seus técnicos tomarem parte nas missões para parcerias e desenvolvimento lá fora), operadores e jovens a procura de emprego cujo índece máximo negativo vem afetando muitos concelhos cá em Santiago, S.Vicente …, nos últimos anos, por exemplo (em Santiago e em muitas outras não há práticamente, neste momento, pessoal de pescas e do shipping formado e documentado e tem custos insuportáveis irem efetuar um simples exame e cursos de conformação em S.Vicente, particularmente para aqueles que vêm da diáspora para o efeito!

6. Devo dizer que sempre que visito I.Canárias, me animo com a dinâmica tanto da I.Grã Canárias como também da I.Tenerife com seus portos e suas instituições marítimas com autonomia e capacitação qb para, Tenerife, por exemplo, operar enormidades de toneladas de transbordo no seu porto de Santa Cruz e, Grã Canárias, por seu lado, operar 6 plataformas petrolíferas atracadas simultâneamente (6 atracadas e não ao largo, como aqui acontece só uma vez em dois anos mas com grande bazofaria e alarido!) . Ou seja, em arquipélagos como o nosso, normalmente sem escala e com um número reduzido de atividades económicas para sobrevivência e desenvolvimento, é ilegítimo, injusto e irracional, excluir ou criar programas exclusivos de desenvolvimento numa só ilha, inviabilizando possibilidades de equipamento de outras (mesmo que tenham potencial) para também se fazer á vida, como aliás se faz em todas as ilhas mas noutros setores (turismo, agricultura etc!).

Concluindo, gostaria de ver privilegiar-se a abordagem de estudar o que não funcionou com a AMP, com seus dirigentes, com o pessoal e meios, e atuar com bom senso no sentido de adotar pessoal compatível, capacitar setores dos serviços com fraco desempenho e projetar o organismo para novos patamares de desempenho sem prejuízo de muita coisa boa que o sistema produziu até hoje, até porque, em muitos países, o figurino ideal para boa governação do mar tem sido uma busca incessante!

Faltará a instalação adequada da AMP nas várias ilhas, de capacitação e melhor desempenho na regulação, melhores instrumentos financeiros (as taxas e sistema de contabilidade já estão finalizados), conformação com standards marítimos internacionais (a auditoria já foi realizada e preparativos para a tal conformação está e curso), e melhores condições institucionais / operacionais para o exercício de autoridade e melhor segurança marítima no contexto atual das ameaças e ilícitos no mar, mas muito já foi feito nesses domínios faltando a tal estruturação a apoio do governo e da comunidade marítima internacional para, com o estatuto de agência (e não outro!), evoluir para o nível de prestação preconizado pelo governo.

Em relação ao resto do setor marítimo e portuário, estou convicto de que o mapa de prioridades para o setor, podia incluir rebocadores novos para Praia e Sal (mais Boavista), financiados, como sempre previstos, em parte, pelo ORION e não o de 2ª mão que vi a concurso, porto completo para Maio (com rampa ró-ró e gare de passageiros), concluir melhorias á faculdade do mar em S.Vicente para servir barlavento e estruturação, no seio do campus, da unidade de formação para o mar na Praia para servir sotavento, porto para Santiago Norte, melhoria dos estaleiros em S.Vicente e implementar o estaleiro no quadro do complexo de pesca no Santiago Sul, melhorias das condições para navios cruzeiros em Santo Antão e no Fogo como alternativa á construção de terminais de cruzeiros para os quase vazios portos da Praia e de S.Vicente, conclusão dos portos de Boavista, Sal e melhoria do de S.Nicolau, terminal de cabotagem e instituição da autonomia do Porto da Praia e de outros portos com condições para esse status (atendendo particularmente à necessidade de compatibilização com a regionalização e á privatização das operações portuárias no país). Assim como para a marinha, para o porto e para as pescas, sotavento necessita de instalação das estruturas da economia marítima para, nessa parte do território, melhorar radicalmente as fracas condições de desenvolvimento que tem caraterizado a assimetria regional do estado do setor.

De uma forma geral proponho que os poderes regionais se empenham para estruturação desse setor, mudando e participando nos figurinos de administração dos portos autónomos, e tragam também parcerias especiais para desenvolvimento das regiões marginalizados no setor para também servirem o negocio internacional no corredor atlântico, cujo potencial aumentará com o maior dimensionamento do canal de Panamá e com o crescimento económico previsto para africa ocidental (de realçar a sistemática demanda do porto da Praia sem resposta nacional, pelos parceiros da africa, asia, Brasil e Europa para retomar as ligações com a Africa e desenvolver a economia/negócio marítimo na região).

Praia, 18 de Abril de 2018.

José Jorge Costa Pina – Mestre em Gestão de Transporte Marítimo e Cabo-Verdiano

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