A remodelação, portanto, vai além das aparências. Trata-se de um realinhamento de forças, uma resposta calculada à perceção pública de que o governo se tornara refém de figuras incapazes de corresponder às expectativas criadas. Ulisses Correia e Silva, ao apagar a fúria de Olavo Correia e ao reintegrar de forma gradual Eurico Monteiro, opera uma manobra de sobrevivência política: dissipa o desgaste de um governo em erosão e tenta renovar a sua base de apoio com novos equilíbrios internos.
Na intrincada teia da governação cabo-verdiana, onde os equilíbrios políticos são meticulosamente calibrados, a recente remodelação governamental operada por Ulisses Correia e Silva não se reveste apenas de um rearranjo de pastas e de nomes. Trata-se, sobretudo, de um exercício de silenciamento e contenção, uma manobra política pensada para diluir a omnipresença de Olavo Correia, vice-primeiro-ministro, cuja ascendência parecia desmedida e sem freios.
Nos últimos anos, Olavo Correia encarnou o papel do entusiasta infatigável, desdobrando-se em fotografias nas redes sociais, a multiplicar promessas de projetos grandiosos que jamais saíram do papel. Um espécime peculiar de tecnocrata-político, que conjugava o discurso reformista com a incapacidade manifesta de transformar intenções em realidades tangíveis. No setor dos transportes, por exemplo, o seu falhanço foi retumbante: a ilusão de soluções estruturais desvaneceu-se perante a permanência dos problemas crônicos de ligação inter-ilhas, e a população, cada vez mais descrente, deixou de dar crédito às suas promessas reiteradas.
O primeiro-ministro, perspicaz como um xadrezista, leu nas entrelinhas da insatisfação popular e compreendeu que Olavo Correia, outrora uma peça fulcral no tabuleiro, se tornara um fardo. A remodelação surge, pois, como um mecanismo subtil de atenuar a sua presença, de reduzir-lhe o protagonismo sem que isso represente uma humilhação ostensiva. Ulisses Correia e Silva soube executar essa coreografia política com uma maestria fria: a fúria de Olavo foi mitigada sem que a sua saída do centro das decisões fosse abrupta ou ruidosa.
Neste novo cenário, ganha relevo a figura de Eurico Monteiro, regressado da Embaixada de Cabo Verde em Portugal e que, numa jogada de fina estratégia, passa a ocupar parte do espaço deixado vago por Olavo Correia. Para muitos, esta ascensão não deixa de ser surpreendente, dado o histórico de confrontações entre Monteiro e a liderança do MpD. Recorde-se que, em tempos, Eurico Monteiro ousou disputar a liderança do partido com Ulisses Correia e Silva, um ato de insubmissão que lhe valeu o afastamento dos círculos centrais do poder. Todavia, quando percebeu que o seu projeto não reunia a confluência necessária, recuou estrategicamente, evitando um embate fratricida que poderia comprometer o seu futuro político.
Agora, com um regresso meticulosamente calculado, Eurico Monteiro ressurge como um ator determinante. A sua reaproximação ao MpD tem sido feita de forma prudente, sem movimentos bruscos que possam despertar hostilidades latentes. Apesar de o seu nome ter sido, em tempos, sinônimo de dissidência, há um esforço evidente para reconstruir pontes e restabelecer confianças. O que ainda se desconhece é se esta nova posição lhe permitirá recuperar plenamente o espaço perdido ou se estará, como Olavo Correia, condenado a um papel secundário dentro da engrenagem governativa.
A remodelação, portanto, vai além das aparências. Trata-se de um realinhamento de forças, uma resposta calculada à perceção pública de que o governo se tornara refém de figuras incapazes de corresponder às expectativas criadas. Ulisses Correia e Silva, ao apagar a fúria de Olavo Correia e ao reintegrar de forma gradual Eurico Monteiro, opera uma manobra de sobrevivência política: dissipa o desgaste de um governo em erosão e tenta renovar a sua base de apoio com novos equilíbrios internos.
Resta saber se esta estratégia será suficiente para reverter a percepção pública de um governo que, apesar dos rearranjos, continua a ser acusado de inoperância e esgotamento. A população cabo-verdiana, habituada a promessas incumpridas e a estratagemas políticos, observa com cepticismo. No xadrez do poder, a próxima jogada poderá ser decisiva.
Comentários
Inácio Pereira, 6 de Mar de 2025
Que divertido! Um perfil falso a acusar-me de fazer uso de um perfil alheio. Porca miséria! Ao compatriota por detrás do “Olavo Spencer”, eu só tenho a dizer o seguinte: eu tenho a coragem e a verticalidade suficientes para criticar e atacar politicamente e argumentar com quem quer que seja, nas redes sociais, sem precisar de me recorrer a perfis alheios. E já dei provas disto, ao longo de todos estes anos. Entretanto, eu tenho a perfeita noção que como esta trama originou.
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Octávio vieira moniz, 4 de Mar de 2025
Gosto de Monteiro. Fui simpatizante do pai por ele. Deixei de sê-lo por ele. Fui simpatizante do ex. Pcd por ele. Tornei apenas cabo verde, por mim. Ele foi o meu bom professor de direito administrativo no antigo CENFA. Saudades.
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Olavo Spencer, 4 de Mar de 2025
A propósito do que escreveu o Cândido, há dias, o Inácio Pereira, mais conhecido por Junvêncio Cabral, estava a dizer no "Parlamento" do Plamarejo que está desiludido com o seu amigo Olavo e que já não nutre grande respeito por ele, considerando-me um bluff e pouco sério. Aliás, é o que muitos pensam do Olavo, mas não o dizem, temendo perder os seus bons e bem pagos tachos.
Inácio Pereira, 6 de Mar de 2025
Após ter consultado o tal perfil, que me acusam de estar a utilizar, vi logo, num post bastante escaldante, a confirmação desta minha suspeita. Relativamente àquilo que o “Olavo Spencer” disse que eu afirmei sobre o VPM/MF, eu só digo isto: “paxenxa na mundu!” Estas velhas táticas dos regimes marxistas de outrora já não são o que eram no passado. Publiquem isto, por favor!Responder
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