Ecologia do homem
Ponto de Vista

Ecologia do homem

A atual crise ecológica é expressão e exteriorização da crise ética, cultural e espiritual que, presentemente, se verifica. Por isso, sanar a relação do homem com a natureza e o meio ambiente passa, antes de mais, por curar as próprias relações humanas, ou seja, “não haverá uma nova relação com a natureza, sem um ser humano novo. Não há ecologia sem uma adequada antropologia.” (LS 118).

No fundo, este parágrafo quer dizer: como se poderá proclamar uma ecologia sem, simultaneamente, promover o autêntico crescimento do homem na justiça e na paz? Como se poderá exigir do ser humano um compromisso para com um mundo se, ao mesmo tempo, não se reconhecem nem se valorizam os vários rostos humanos que constantemente são descartados em vários cantos do mundo? Como se poderá falar de uma ecologia integral se constantemente voltamos as costas à exigência e às necessidades dos mais pobres, dos sofrimentos que os migrantes suportam devido à guerra, à pobreza de massa e às ditaduras?

Como diz o Papa Francisco, a “ecologia estuda as relações entre os organismos vivos e o meio ambiente onde se desenvolvem.”[1] Isto porque, “quando falamos do meio ambiente, fazemos referência a uma relação particular: a relação entre natureza e a sociedade que a habita.”[2] No fundo a proposta do Papa “é uma ecologia que integre o lugar específico que o ser humano ocupa neste mundo e as suas relações com a realidade que o circunda.”

Certamente, esta visão nova que o Santo Padre nos apresenta “impede-nos de considerar a natureza como algo separado de nós ou como uma mera moldura da nossa vida.”[3] Desta forma, é fundamental diligenciarmos “soluções integrais que considerem as interações dos sistemas naturais com os sistemas sociais.”[4] Ou seja, “as diretrizes para a solução requerem uma abordagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cuidar da natureza.”[5]

Por outro lado, esta ecologia integral, segundo o Papa Francisco, exige também uma “ecologia económica, capaz de induzir a considerar a realidade de forma mais ampla.”[6] Porque, “se tudo está relacionado, também o estado de saúde das instituições de uma sociedade tem consequências no ambiente e na qualidade de vida humana: toda a lesão da solidariedade e da amizade cívica provoca danos ambientais”[7]. Com muitos exemplos concretos, o Papa Francisco afirma e reafirma o seu pensamento: há uma ligação entre questões ambientais, económicas, sociais e humanas que nunca pode ser rompida. Assim sendo, “a análise dos problemas ambientais é inseparável da análise dos contextos humanos, familiares, laborais, urbanos e da relação de cada pessoa consigo mesma, que gera um modo específico de se relacionar com os outros e com o ambiente. Esta interação entre os ecossistemas e os diferentes mundos de referência social mostra mais uma vez que o todo é superior à parte.”[8]

Portanto, a mudança de comportamentos, que deve ser sistémica (política, económica, social, cultural, espiritual, ética, educacional...), passa pelo concreto das atitudes quotidianas de cada um de nós, ou seja, requer passos decisivos, uma ousadia criativa de pequenos e persistentes gestos que, pouco a pouco, se vão tornando hábitos (virtudes). Assim sendo, “a atitude basilar de se auto-transcender, rompendo com a consciência isolada e a auto-referencialidade, é a raiz que possibilita todo o cuidado dos outros e do meio ambiente” (LS 208).

[1] FRANCISCO, Carta Encíclica Laudato Si: sobre o cuidado da casa comum, Paulus Editora, São Paulo, 2015, IV, 138.

[2] Ibidem, IV, 139.

[3] Ibidem, IV, 139.

[4] Ibidem, IV, 139.

[5] Ibidem, IV, 139.

[6] Ibidem, IV, 141.

[7] Ibidem, IV, 141, 142.

[8] Ibidem, IV, 141.

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