Acabar com a Pobreza Extrema em 5 Anos!
Ponto de Vista

Acabar com a Pobreza Extrema em 5 Anos!

Querendo reconhecer a gravidade e a complexidade da situação, com o espírito de humanismo e sentido de responsabilidade estatal, que o caso merece, um passo importante para se tomar medidas estruturantes para a combater a sério, seria o de, neste momento, admitir que, face ao aumento galopante dos preços de bens básicos, adicionado aos maus anos agrícolas, muita gente, de entre essas 115 mil pessoas, deve estar a passar FOME. Sim, FOME, não nos moldes dos anos 40 e nem tem que ser naquele conceito definido pelas Nações Unidas. Para quem está a passar a FOME, o que ele sente é FOME! Não é preciso chegar às calamidades de outros tempos para se reconhecer que, neste momento, há pessoas a passar FOME em Cabo Verde.

Diz-se por aí que, no espaço de cinco anos, se vai acabar com a pobreza extrema em Cabo Verde.  Ora, o número de população cabo-verdiana que ainda vive na extrema pobreza está estimado em 115.000 habitantes, num universo de pouco menos de quinhentas mil pessoas que habitam Cabo Verde, de acordo com os dados provisórios do último censo do INE.  115 mil pessoas representam, praticamente, um quarto da população nacional.

Depois de quase 50 Anos, ainda temos esse número de população a viver na extrema pobreza e, agora, de repente, não se conhece por que milagre, ou magia, em apenas cinco anos, vai ser eliminada! O mais estranho ainda, e mesmo paradoxo, é que essa medida milagrosa é proposta numa altura de extremas dificuldades económicas, em que tudo está mais caro, o rendimento das famílias é baixo e o desemprego é galopante!

De acordo com as Nações Unidas, a pobreza extrema se verifica quando a renda é inferior a 1.90 dólares norte-americano, por dia, ou seja, menos de 200$00/dia. Isto significa que, em Cabo Verde, estatisticamente, há 115.000 pessoas a viver com menos de 200$00, por dia. Este quadro estrutural da pobreza no país é muito preocupante e deve envergonhar a todos nós, depois de quase 50 anos da nossa independência!

Se se pretende combatê-lo a sério e de forma sustentável, isto é, cortar as cadeias de continuidade e de reprodução, naturalmente, leva o seu tempo que, racionalmente pensando, nunca será possível em apenas cinco anos. Questões de natureza estrutural, como a pobreza extrema, resolve-se com visão e medidas estruturantes! Creio que é mais sensato e razoável, falar na sua diminuição ou na aceleração da sua diminuição, se levarmos em conta que há 47 anos que estamos nessa árdua tarefa de combater a miséria neste país, para torna-lo desenvolvido, mas, infelizmente, ainda há 115.000 pessoas a viver na extrema pobreza.

Olhando para todo o quadro económico e social deste país, na conjuntura em que atravessamos, e as perspetivas para os próximos anos, afigura-nos ser esta proposta pouco séria e demagógica. O máximo que se pode fazer, e deve ser feito, é ajudar essas pessoas a minimizar o sofrimento, por via de acesso a um rendimento que as dignifiquem e não através de distribuição de recursos, em moldes de esmolas.  

Combater a pobreza extrema, de forma sustentável para que não apareçam, logo no dia seguinte, novos focos, exige uma planificação muito séria e medidas estruturantes, particularmente na Educação, uma Educação de alta qualidade (relevante e pertinente) e para todos. Ora, com a Educação que temos, isto não é possível! Se por um lado, ela é de baixa qualidade, como disse o Banco Mundial, num estudo encomendado pelos responsáveis nacionais e publicado em 2019  (Cabo-Verde-Revisiting-the-Efficiency-of-Public-Spending-to-Reduce-Debt-and-Improve-Education-and-Health-Outcomes-Public-Expenditure-Review.pdf (worldbank.org)), por outro, o seu o acesso ainda é problemático, desde o pré-escolar ao ensino superior. Aqui, o acesso tem de ser cmpreendido em dois planos: o acesso, como direito de estar na escola (criar condições para isso) e o acesso, na perspetiva de aceder a uma educação escolar de qualidade e que proporciona sucessos a todos os seus alunos, pois não basta estar na escola. Quem conhece as nossas escolas, sobretudo, às das zonas periféricas e remotas, não terá qualquer dúvida dos gigantescos desafios que ainda temos a vencer, para que as nossas crianças, adolescentes e jovens tenham acesso a uma educação escolar e com qualidade, que lhes garante o sucesso na vida e, por essa via, sim, preparar-lhes para romper o ciclo estrutural da pobreza na família. 

Ademais, é preciso termos em conta que, em questões de Educação, os resultados só serão verificáveis e impactáveis a médio e longo prazo, acompanhando a regeneração das gerações, coisa nunca possível, num espaço temporal de cinco anos e, ainda mais, numa conjuntura de terrível crise como esta.

Importa observar que a riqueza de um país está no seu Capital Humano que, bem organizado, gerido e, sobretudo, bem aproveitado, se transforma no Capital Social. Sem chegar a esse patamar, dificilmente, um país se torna desenvolvido, de forma sustentável, por mais que hajam discursos políticos arrojados por aí e promessas como essa de acabar com a pobreza extrema, em apenas cinco anos, quando esta graça ainda quase um quarto da população nacional. 

Querendo reconhecer a gravidade e a complexidade da situação, com o espírito de humanismo e sentido de responsabilidade estatal, que o caso merece, um passo importante para se tomar medidas estruturantes para a combater a sério, seria o de, neste momento, admitir que, face ao aumento galopante dos preços de bens básicos, adicionado aos maus anos agrícolas, muita gente, de entre essas 115 mil pessoas, deve estar a passar FOME. Sim, FOME, não nos moldes dos anos 40 e nem tem que ser naquele conceito definido pelas Nações Unidas. Para quem está a passar a FOME, o que ele sente é FOME! Não é preciso chegar às calamidades de outros tempos para se reconhecer que, neste momento, há pessoas a passar FOME em Cabo Verde.

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