O grupo Icelandair, que até julho liderou a companhia Transportes Aéreos de Cabo Verde (TACV), prevê que a aeronave da sua subsidiária Loftleidir, arrestada na ilha do Sal desde junho, seja realocada ao serviço nos “próximos meses”.
No recente relatório financeiro consolidado do grupo islandês, do período de janeiro a setembro, consultado hoje pela Lusa, a companhia assegura que o valor da participação na TACV foi totalmente contabilizado e que não registou nenhuma perda “em relação às ações do Governo”, como a renacionalização.
Na mesma informação, a administração da Icelandair assegura que já tinha feito reservas para os valores que reclama à TACV, embora sem os quantificar.
“A subsidiária da companhia, Loftleidir islandesa, é proprietária de uma aeronave que está atualmente em Cabo Verde e espera-se que seja realocada nos próximos meses”, lê-se ainda.
Em causa está o Boeing-757 D4-CCG “Baía de Tarrafal”, imobilizado desde junho no aeroporto internacional Amílcar Cabral, na ilha do Sal, fornecido em regime de ‘leasing’ pela Loftleidir Icelandic EHF à TACV e alvo de um processo de arresto por parte do Estado cabo-verdiano, perante alegadas dívidas da companhia, na gestão islandesa, à empresa estatal ASA, que gere os aeroportos do arquipélago.
O mesmo avião tinha chegado em abril a Cabo Verde, mais de um ano depois de ter sido colocado em situação de armazenamento no exterior do país com a suspensão dos voos da companhia (em março de 2020) devido à pandemia de covid-19.
Em março de 2019, o Estado de Cabo Verde vendeu 51% da então empresa pública TACV por 1,3 milhões de euros à Lofleidir Cabo Verde, empresa detida em 70% pela Loftleidir Icelandic EHF (grupo Icelandair, que ficou com 36% da Cabo Verde Airlines – nome comercial da companhia) e em 30% por empresários islandeses com experiência no setor da aviação (que assumiram os restantes 15% da quota de 51% privatizada).
A companhia, em que o Estado cabo-verdiano mantinha uma posição de 39%, concentrou então a atividade nos voos internacionais a partir do ‘hub' do Sal, deixando os voos domésticos.
Entretanto, o Estado cabo-verdiano assumiu em 06 de julho último a posição de 51% na TACV detida desde 2019 por investidores islandeses, alegando vários incumprimentos na gestão e dissolvendo de imediato os corpos sociais.
A reversão de privatização da companhia teve efeitos a partir daquele dia, com a publicação do decreto-lei que a autoriza, aprovada pelo Conselho de Ministros, face às “sérias preocupações” com o “cumprimento dos princípios, termos, pressupostos e fins” definidos no processo de privatização.
A administração islandesa da CVA anunciou ainda em junho a suspensão de vendas e do plano de retoma de voos face à então intenção anunciada de renacionalização da companhia pelo Governo e o arresto da única aeronave reativada, das três anteriores ao serviço antes da pandemia.
Em entrevista à Lusa em setembro, o ministro do Turismo e dos Transportes de Cabo Verde, Carlos Santos, admitiu que para relançar em seis meses a companhia aérea de bandeira TACV será necessário investimento do Estado.
“Obviamente. Obviamente porque estamos numa fase de reiniciar e reiniciar significa investir. E essa é a perspetiva de investimento. Agora, tudo o que está a ser feito, está a ser feito com cabeça, tronco e membros, para podermos ter aqui uma equação que tenha alguma viabilidade”, afirmou.
Carlos Santos esclareceu que o Governo está a trabalhar com “especialistas” para que a companhia, que não realiza voos comerciais desde março de 2020, então devido à pandemia de covid-19, possa retomar a atividade, mas com um “efeito naquilo que são os bolsos dos contribuintes” que seja “o menor possível”.
“Mas terá de haver investimento”, disse, sem quantificar.
Para o ministro, a TACV é uma companhia aérea “importante para o país” e “uma peça importante para o desenvolvimento” de Cabo Verde, que “tem na diversificação do turismo um objetivo fulcral”.
A meta é que dentro de menos de seis meses a companhia, desde agosto liderada pela ex-presidente da Radiotelevisão Cabo-verdiana (RTC) Sara Pires, volte à atividade, praticamente dois anos após a suspensão das operações.
Na base da decisão de reverter a privatização, o Governo alegou em julho preocupações como o “cumprimento com os procedimentos acordados de pagamento de despesas, registo contabilístico e contratação”, a “salvaguarda dos interesses da empresa e objetivos da parceria em consequência de envolvimento em atos e contratos que revelam substâncias e sérios conflitos de interesse”, a “contribuição para o reforço da capacidade económico-financeira e da estrutura de capital” da companhia ou sobre a “concretização integral da venda direta em prazo, condições de pagamento e demais termos”.
Devido aos efeitos da pandemia de covid-19, tinha sido assinado um novo acordo entre o Estado e a Loftleidir em março de 2021, para viabilizar a empresa (envolvendo desde novembro a emissão de avales do Estado a cerca de 20 milhões de euros de empréstimos para pagamentos de salários e outras despesas urgentes), o qual previa também a cedência de ambas a partes em diferentes matérias.
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