A estranha coincidência entre o tempo da justiça e o calendário eleitoral
Ponto de Vista

A estranha coincidência entre o tempo da justiça e o calendário eleitoral

...independentemente das teorias, o certo é que a democracia não pode ser refém de coincidências inconvenientes. Se o tempo da justiça continua a se confundir com o tempo da política, o risco é que o país troque seu célebre título de “exemplo africano” pelo rótulo de “democracia de fachada”. Portanto, a escolha é clara: ou o MP se torna um verdadeiro guardião da lei, imune aos eventos eleitorais, ou Cabo Verde seguirá navegando em “bola de neve” onde a justiça não é um fim, mas um instrumento.

Enquanto o país orgulhosamente prepara às comemorações do seu quinquagésimo aniversário sobre o pano do fundo da independência e a estabilidade democrática, uma pergunta incômoda persiste: porquê certos processos judiciais ganham protagonismo exatamente quando a política aquece?

A aparente coincidência entre o calendário eleitoral e o desenrolar das investigações do Ministério Público (MP) suscitam  dúvidas sobre o “mero acaso”. Parece estarmos diante de um sintoma agravado: a justiça, que deveria ser um farol de imparcialidade, muitas vezes confunde-se a dançar ao ritmo dos tambores da política. 

A Constituição consagra o MP como uma instituição autônoma, responsável por assegurar a legalidade democrática e combater a impunidade. No papel, sua missão é nobre: agir como fiscal da lei, independente de influências externas. Na prática, porém, o MP navega em águas turbulentas. A nomeação do Procurador-Geral da República pelo Presidente da República, sob proposta do governo, cria um paradoxo: como garantir independência plena e um sistema onde o poder político controla a escolha de seu principal fiscalizador? 

A questão torna-se ainda mais delicada em anos eleitorais. Quando investigações envolvendo figuras públicas ganham destaque, o MP é acusado de ser lento “protelar para proteger” ou, inversamente, de ser instrumentalizado para atacar adversários.

Contudo, a coincidência do “tempo” alimenta teorias de conspiração. Para muitos, a justiça não é cega: ela pisca para o calendário eleitoral. 

Todavia, independentemente das teorias, o certo é que a democracia não pode ser refém de coincidências inconvenientes. Se o tempo da justiça continua a se confundir com o tempo da política, o risco é que o país troque seu célebre título de “exemplo africano” pelo rótulo de “democracia de fachada”.

Portanto, a  escolha é clara: ou o MP se torna um verdadeiro guardião da lei, imune aos eventos eleitorais, ou Cabo Verde seguirá navegando em “bola de neve” onde a justiça não é um fim, mas um instrumento.

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