O eleitorado cabo-verdiano entra em 2026 perante uma escolha de fundo: Ulisses representa a consolidação de um modelo baseado na estabilidade e na gestão prudente. Francisco oferece um caminho alternativo, mais centrado na justiça social, na proximidade com o povo, na reconfiguração do papel do Estado. Ambos têm méritos. Ambos têm falhas. O que está em causa não é apenas quem vai governar, mas como vamos ser governados. Não será apenas uma eleição. Será um referendo sobre o que Cabo Verde quer ser na próxima década. O ringue está montado. O relógio já começou a contar. Cabo Verde vai decidir. E a escolha será histórica.
Preparem-se.
Cabo Verde está prestes a assistir a um dos confrontos políticos mais marcantes da sua história recente.
De um lado, Ulisses Correia e Silva, o atual Primeiro-Ministro, líder do MpD, rosto da estabilidade e da continuidade governativa.
Do outro, Francisco Carvalho, presidente da Câmara Municipal da Praia, voz crítica do sistema atual, candidato do PAICV à liderança do país.
Não se trata apenas de uma disputa eleitoral. É um duelo de visões, um embate entre dois modelos de sociedade, duas formas de pensar, liderar e governar. Este é o encontro marcado de 2026. E nós, eleitores, somos os juízes deste combate.
Round 1: Visão de País
Ulisses acredita num Cabo Verde moderno, bem gerido, com finanças públicas equilibradas, foco no digital e na atração de investimento. A sua governação é pautada pela previsibilidade, pela estabilidade macroeconómica e na confiança dos parceiros internacionais.
Francisco, por outro lado, propõe uma transformação estrutural: o país mais interventivo socialmente. Defende políticas públicas robustas, justiça social, combate às desigualdades e uma maior aproximação do Estado às comunidades. Para ele, o desenvolvimento não pode ser apenas medido por indicadores macroeconómicos, mas sim pelo impacto real na vida das pessoas.
Round 2: Ideologia e Referenciais
Ulisses vem do campo liberal-moderado. Vê o setor privado como motor de desenvolvimento, aposta na desburocratização e na inovação tecnológica. Acredita que o papel do Estado é criar condições, não necessariamente liderar tudo.
Francisco carrega no ADN político os valores do PAICV histórico: justiça social, solidariedade e Estado forte. Inspira-se no pensamento de Amílcar Cabral, trazendo uma leitura contemporânea do “agir local, pensar nacional”.
Round 3: Estilo de Liderança
Ulisses é o estratega discreto. Governa com o pragmatismo de quem já conhece os corredores do poder. Evita polémicas, prefere a diplomacia à confrontação, e confia no tempo e nos números para justificar as suas decisões.
Francisco é mais direto, combativo e emocional. Habituado ao ativismo e ao contacto com o cidadão comum, fala alto quando necessário e não evita o conflito se acreditar que está a defender os excluídos.
Round 4: Juventude e Inclusão
Ambos reconhecem a importância da juventude — mas divergem na abordagem.
Ulisses tem promovido incentivos ao empreendedorismo jovem, formação digital e acesso a estágios profissionais, embora críticas persistam quanto à eficácia prática dessas medidas no dia a dia dos jovens mais vulneráveis.
Francisco, com experiência em projetos sociais e investigação sobre juventude urbana, quer mais do que incentivos: quer empoderamento real, voz ativa e representação nas decisões políticas. Vê a juventude como protagonista, não apenas como beneficiária.
Round 5: Da Cidade para o País
Ulisses governa Cabo Verde desde 2016, atravessou crises internas e globais, manteve a máquina do Estado a funcionar com estabilidade e apostou em reformas institucionais discretas, mas consistentes.
Francisco, vindo da maior câmara municipal do país, onde lida diariamente com os desafios urbanos, quer provar que a proximidade e a ação local podem ser a chave para uma governação mais humana e participativa. A Praia é o seu campo de ensaio, mas sonha com a escala nacional.
Epílogo: Continuidade ou Mudança?
O eleitorado cabo-verdiano entra em 2026 perante uma escolha de fundo: Ulisses representa a consolidação de um modelo baseado na estabilidade e na gestão prudente. Francisco oferece um caminho alternativo, mais centrado na justiça social, na proximidade com o povo, na reconfiguração do papel do Estado. Ambos têm méritos. Ambos têm falhas. O que está em causa não é apenas quem vai governar, mas como vamos ser governados. Não será apenas uma eleição. Será um referendo sobre o que Cabo Verde quer ser na próxima década.
O ringue está montado. O relógio já começou a contar. Cabo Verde vai decidir. E a escolha será histórica.
Comentários
Luiz Nunes, 28 de Mai de 2025
1. O artigo foi tão bem escrito, imparcial, lúcido, que quisera euzinho ter feito isso. ?
2. Não houve defesa nem de um lado, muito menos do outro. Mas a escrita quando bem redigida, o que é o caso, permite as mais variadas ilações. O que não permite é acrescentar o que o autor não escreveu, muito menos quis dizer!
Luiz Nunes, 28 de Mai de 2025
3. Que o autor se disponha a moderar um debate, promovido pelo Santiago Magazine entre os dois lideres, pois deu provas de como se deve escrever de maneira isenta!4. Que o embate seja tão bem realizado e digno, como o que se escreveu por aqui.
5. DEUS continue abençoando esse nosso Cabo Verde ??!
Christian lopes, 28 de Mai de 2025
Luiz Nunes, fico sinceramente tocado pelas suas palavras.A intenção do texto foi exatamente essa: lançar luz sobre as diferenças com equilíbrio, sem inflamar trincheiras, mas sim abrir caminhos para o debate.
Se o texto conseguiu gerar reflexão sem perder a sobriedade, fico já imensamente realizado.
E se esse caminho puder mesmo inspirar mais espaços de diálogo digno como bem sugere, então valeu cada linha escrita.
Muito obrigado.
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José Lima Borges, 28 de Mai de 2025
O ringue está montado, vamos ver se o combate será limpo sem golpes baixos, o povo estará atento. A máquina governamental dos ventoinhas está montada pronta a ser oleada com o aproximar das eleições. Ulisses quer privatizar tudo que funciona e dá lucros, segundo um ex governante o “estado é mau gestor” daí o melhor é privatizar. O governo tem mostrado que o país vai bem com “gráficos”, enquanto que no dia a dia vê-se a pobreza, a desorientação dos jovens e não só
Christian Lopes, 28 de Mai de 2025
Comentário forte e bem construído.Há realmente um fosso entre os indicadores macro e o sentimento do dia a dia de muitos cabo-verdianos. E esse será um dos temas centrais em 2026: o que é progresso? Gráficos ou vidas?
Que o combate seja, como disse, limpo e centrado nas ideias.
Obrigado pela leitura
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zé povinho, 28 de Mai de 2025
Mas que raio de “estabilidade” é essa que o articulista vem defender, afinal? Estabilidade para quem? Para os mesmos de sempre manterem o tacho bem preso enquanto o povo continua a ver navios? O artigo pinta uma espécie de paz podre como se fosse uma virtude — como se o simples facto de o país não estar a arder já fosse sinal de boa governação.
zé povinho, 28 de Mai de 2025
O autor parece esquecer que estabilidade sem mudança, sem alternância, sem renovação de ideias, é o caminho mais curto para o apodrecimento da democracia. A estabilidade que ele enaltece mais parece resignação — aquela postura de “deixa estar como está para não piorar”, típica de quem já desistiu de esperar por melhor.zé povinho, 28 de Mai de 2025
E depois há o tom quase messiânico com que fala do Ulisses. Já não é um primeiro-ministro, é um pilar da nação! Um terceiro mandato? Como se isso fosse o único caminho sensato? Não há mais ninguém capaz em Cabo Verde? Ou é só medo de perder as mordomias?zé povinho, 28 de Mai de 2025
Isto não é defesa de estabilidade — é defesa do comodismo político. E quando se romantiza o comodismo, o país fica parado, a juventude desiludida, e os problemas estruturais a apodrecer por baixo da “tranquilidade”. Se isto é o tal “encontro marcado para 2026”, então que se preparem para um verdadeiro acerto de contas nas urnas — porque o povo já começa a perceber que essa estabilidade de fachada só serve a quem está sentado na cadeira há demasiado tempo.Christian Lopes, 28 de Mai de 2025
Obrigado pelo seu comentário, apesar do tom duro.Mas é precisamente esse o objetivo do artigo: suscitar reflexão, provocar debate e dar espaço a diferentes leituras.
A estabilidade não foi aqui apresentada como dogma, mas como um dos polos em confronto com a mudança proposta. Cabe a cada leitor julgar os méritos de cada lado.
Não se trata de messianismo nem de defesa de comodismo, mas de análise de duas figuras políticas com percursos, estilos e propostas distintas.
Christian Lopes, 28 de Mai de 2025
Concordemos ou não, é esse o confronto que 2026 colocará em cima da mesa.Obrigado por partilhar a sua visão
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