Santa Catarina. Mercado de trabalho, pobreza e políticas activas de emprego
Ponto de Vista

Santa Catarina. Mercado de trabalho, pobreza e políticas activas de emprego

Se a nível nacional a evolução recente do mercado de trabalho sinaliza o impacto das opções e das políticas publicas em matéria de emprego e empregabilidade, Santa Catarina vai em contra-mão.

O desemprego em Santa Catarina cresce desde 2011, passando de 6% nesse ano para cerca de 20% em 2016. O ano 2017 conheceu uma ligeira melhoria (queda) mas conta ainda com uma taxa socialmente elevada (cerca de 17%, 5 pontos percentuais acima da média nacional). O facto que merece a atenção é que Santa Catarina não só tem uma taxa de desemprego acima da média nacional como também ultrapassa em 10 pontos percentuais o Concelho de Santa Cruz e de São Lourenço dos Órgãos, Concelhos estes com característica (agrícola) semelhante a de Santa Catarina (Gráfico).

Santa Catarina é um Concelho de “peso" em Cabo Verde e, particularmente, em Santiago Norte. Representa cerca de 37% da população activa da região norte de Santiago, 34% da população empregada, 28% do subemprego, a maioria ou seja 56% dos desempregados e 41% dos inactivos dessa mesma região.

O desemprego em Santa Catarina tem particular incidência sobre as pessoas com nível secundário de escolaridade. Sabe-se, pois, que 48 em cada 100 desempregados tem esse nível, 43 em 100 tem nível básico/alfabetização e 8 em 100 tem nível superior de escolaridade. Dito de outro modo temos cerca 2600 desempregados dos quais 618 com nível secundário e 319 com nível superior. Assim, os desempregados têm em média 8,3 anos de estudos, quase igualando a média nacional, mas as mulheres desempregadas têm em média 10,6 anos de estudo, ligeiramente acima da média nacional (9,4 anos de estudos), ocorrendo o contrário com os homens pois estes têm, em média 7,4 anos de estudos, ligeiramente abaixo da média nacional (8,3 anos).

Mas o facto mais relevante é que a situação do desemprego é persistente, pois cerca de 62 em cada 100 desempregados perderam emprego ou seja alguma vez trabalharam, muito embora abaixo da média nacional e pior, a grande maioria, ou seja, pelo menos 72 em cada 100 é desempregado de longa duração, cerca de 26 pontos percentuais acima da média nacional.

Assim, dos cerca de 2600 desempregados, cerca de 1600 procuram novo emprego e 960 procuram o primeiro emprego, mas cerca de 1800 são desempregados de longa duração e estão no desemprego há cerca de 32,7 meses, o dobro da média nacional (15,3 meses).

O cenário vislumbra-se ainda mais sombrio, se tivermos em conta que temos cerca de 3.200 pessoas no subemprego, ou seja que trabalham menos de 35 horas por semana e estão disponíveis para trabalhar mais horas em outra actividade. Isto significa que 1 em cada 4 ocupados estão nessa situação. Há assim, mais gente no subemprego do que no desemprego. Dito de outro modo temos 12.672 ocupados para uma população de cerca de 46.000 habitantes, ou seja cerca uma pessoa empregada para cada 4 habitantes desse Concelho. Pelo menos 24.300 pessoas ou seja 72 em cada 100 pessoas em idade de trabalhar estão na inactividade, no desemprego ou no subemprego.

O desemprego afecta particularmente os jovens pois quase 3 em cada 4 desempregados (74%) são jovens ou seja tem entre 15 e 34 anos de idade.

Não apenas cresceu de forma considerável o desemprego quanto uma efectiva degradação em matéria de emprego decente, se tivermos em conta que em 2018, o numero de trabalhadores segurados no INPS é inferior ao de 2015. A ligeira redução do subemprego deve-se certamente ao aumento da inactividade.

Agricultura, pecuária e pesca é a actividade económica que lidera a geração de emprego com cerca de 27 em cada 100 empregados, seguido do comércio (23%), Estes dois asseguram cerca de metade e cerca de 2 em cada 3 empregos no Concelho são garantidos por estes e a administração publica, educação e saúde.

Os Santacarinenses são visivelmente empreendedores pois a maioria dos ocupados o são por conta própria, mas isto tem a ver sobretudo com a ocupação na agricultura e no comércio que são predominantemente actividades do sector privado, mas trata-se especialmente de agricultura familiar, de subsistência e de pequeno comércio e em especial do comércio informal, actividades que expõem as pessoas à pobreza.

Tanto assim é que em média o valor do consumo anual de cada santacatarinense é de 136.304 escudos, abaixo da média nacional que é de 166.207 escudos, muito embora seja o segundo mais elevado de Santiago Norte e o terceiro da ilha de Santiago, mas este valor está também impregnado de profundas desigualdades, pois o Indice de Gini desse Concelho é de 0,38, o décimo mais elevado de Cabo Verde e cerca 17.900 habitantes desse Concelho (38% da população) vivem na pobreza absoluta e destes quase 6.000 vivem na extrema pobreza.

Os jovens com nível secundário predominam nesse segmento populacional. Estudar para viver pobre não deve ser o destino de um jovem. Em Santa Catarina, ter nível secundário não reduz de forma expressiva a exposição à pobreza. Pelo menos 75 em cada 100 jovens pobres tem nível secundário e 8 tem nível superior. Mas também entre os não pobres a grande maioria ou seja 72 em cada 100 tem nível secundário, mas apenas 3 em cada 100 tem nível superior.

Cerca de 48 em cada 100 jovens de SC dos 15-24 anos que alguma vez frequentaram a escola mas estão actualmente fora do sistema educativo vivem na pobreza absoluta com especial incidência nos rapazes que representam 54% desse grupo.

Trabalhar para viver pobre não deve ser o destino de um jovem mas em geral de um chefe de família. Em Santa Catarina cerca de 39 em cada 100 jovens pobres trabalham, apenas 6 estão desempregados mas é a inactividade que mais expõe pois destes pelo menos 55 em cada 100 são inactivos. Neste Concelho 70 em cada 100 chefes de família pobres estão a trabalhar e apenas 29 em cada 100 são inactivos. Importa ainda realçar que 67 em cada 100 chefes de família na extrema pobreza estão a trabalhar e também apenas 33 em cada 100 são inactivos.

Reina a inactividade e a informalidade e escasseia o emprego digno e sustentável.

É sobre esta realidade que temos que agir. Segundo o Censo 2010, pelo menos 1500 pessoas residentes em Cabo Verde com formação superior nasceram em Santa Catarina. Este Concelho é parte de Santiago Norte que, segundo o PEDS deve ser um novo destino turístico, o maior celeiro de Cabo Verde em produtos agrícola, da pecuária e da agro-indústria, mas também, um importante polo do conhecimento e tecnologias, nomeadamente no domínio da água e saneamento. O Governo deve agilizar a elaboração do Plano de Ordenamento Turístico da ZDTI de Rincão, articular e incentivar a acção dos operadores turísticos, da Associação de Turismo de Santiago para fazer de Santa Catarina um novo destino turístico.

Das 45.399 explorações agrícolas familiares, 6.180 ou seja 14 em cada 100 estão em Santa Catarina que é assim o Concelho com mais explorações agrícolas e a agricultura é neste momento a atividade econômica que mais absorve a oferta de mão de obra. Há terras disponíveis, tradição, mais água e sobretudo uma população jovem mais instruída que pode ser mobilizada para a agricultura moderna. No entanto, como se sabe, obstáculos estruturais ainda persistem.

Importa promover as condições para aumentar significativamente a produção, a produtividade e o valor acrescentado da agricultura. A agricultura tradicional deve dar lugar a uma agricultura moderna, competitiva, capaz de penetrar no mercado turístico, de exportar e assim de contribuir para a inserção dinâmica de Cabo Verde no sistema económico mundial e para a sustentabilidade económica. Uma agricultura capaz de contribuir para a segurança alimentar, que seja um novo sector de oportunidades para os jovens, gerador de emprego decente, de rendimento e sobretudo de contribuir para a redução das desigualdades, da pobreza e das assimetrias regionais.

Este nova agenda agrícola deverá representar oportunidades para os jovens de Santa Catarina, mas é necessário mais trabalho da parte da Delegação do Ministério da Agricultura e Ambiente, melhor articulação com as Associações de Agricultores e especialmente uma acção cada vez mais efectiva das entidades promotoras como a PROEMPRESA, a Câmara do Comercio Industria e Serviços de Sotavento que tem uma delegação em Santa Catarina e da ACAISA, mas também melhor coordenação e trabalho conjunto entre estes, o Centro de Emprego e Formação Profissional de Assomada, a Universidade de Santiago, a Escola Técnica Grão Duque Henri e as entidades privadas de formação profissional. Existe muita capacidade ociosa em Santa Catarina para valorizar o seu potencial e o seu capital humano, o contexto governativo e de relacionamento institucional é muito favorável e recursos públicos podem e devem ser mobilizados.

O contexto actual é muito favorável à inserção produtiva dos jovens e à redução das assimetrias regionais em termos de oportunidades de emprego e não pode ser desperdiçado para o caso de Santa Catarina

Se apenas 12.672 pessoas trabalham para uma população de cerca de 46.000 habitantes ou seja, apenas 28 em cada 100 indivíduos produzem, é inadiável capacitar a população e promover a inclusão produtiva. É imperativa a intervenção na qualificação dos jovens para o aproveitamento do potencial existente no Concelho, na região e na ilha de Santiago, especialmente nos domínios do turismo, do agro-business, das pescas, da economia do conhecimento, da cultura e das indústrias criativas.

Em Santa Catarina, as politicas activas de emprego devem visar cerca de 24.000 em idade de trabalhar que estão na inactividade, no desemprego no subemprego e especialmente os jovens pois quase 2000 desempregados ou seja 3 em cada 4 são jovens. Este Concelho tem 8.325 jovens dos 15-34 anos fora do emprego, da educação e formação, ou seja excluídos pelo sistema educativo e pelo mercado de trabalho. São os chamados jovens NEET e destes 4.803 tem nível secundário e 368 tem nível médio ou superior. Prioridade máxima deve ser dada ao combate a este tipo de exclusão.

A aceleração das medidas de politica activa de emprego para os jovens com a massificação da formação profissional e dos estágios profissionais deverá permitir o acesso a estágios profissionais a 375 jovens com formação profissional média ou superior e dos 1000 jovens deverão beneficiar de formação profissional, mas o esforço deve ser continuado em 2020 e nos anos seguintes. Em especial, existem um sem numero de oportunidades empresariais e de negócios que merecem ser efectivadas valorizando os incentivos fiscais e os mecanismos de financiamento em vigor.

Praia, Fevereiro de 2019

Artigo publicado pelo autor, Francisco Tavares, Engenheiro Estatístico no facebookEngenheiro Estatístico no facebook

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