As dobradinhas do fim-de-semana
Colunista

As dobradinhas do fim-de-semana

Os parabéns ao novo presidente do PAICV. Que nestes próximos meses que antecedem o período de campanha para as legislativas, o novo líder saiba unir o que está disperso, restaurar a confiança onde há cansaço, e reencontrar com os militantes e simpatizantes do partido um dos principais propósitos do partido, servir o povo e não servir-se dele. Que se lembre sempre de que nenhum título substitui a legitimidade conquistada na prática; e que nenhuma vitória interna será completa enquanto persistirem dúvidas, divisões e desencontros.

Parabéns ao Sporting que ontem selou a sua “dobradinha” com distinção, futebolisticamente irrepreensível, estrategicamente eficaz, e emocionalmente apoteótico. Sim, sou sportinguista de alma e coração, embora tenha crescido numa família de benfiquistas ferrenhos (pa bsot oiá q’un ta habituód a ser ovelha negra diazá).

Em Alvalade celebrou-se esforço, consistência e, acima de tudo, alinhamento em torno de um objectivo claro.

Noutra latitude, mais precisamente na nôs terra, o cenário foi bem diferente. Também se proclamou uma vitória, embora a atmosfera se tenha revestido mais de contenção do que de júbilo.

Acompanho à distância, como tantos que, estando fora, continuam atentos ao pulsar da terra. E por mais que o tempo ou os quilómetros possam relativizar emoções, há certas coisas que continuam a falar alto, como o estado de saúde de um partido que marcou a história do país e que, em mais uma eleição interna, voltou a dar sinais de desencontro.

Não se esperava unanimidade, mas também não se previa tamanha ausência nas urnas. Quando apenas uma parte reduzida do universo militante responde ao apelo de escolha, o silêncio dos ausentes torna-se, por si só, uma declaração.

Os motivos para esse afastamento serão diversos: alguns ligados às figuras envolvidas, outros ainda à forma como a campanha foi conduzida e claro, outros ao momento escolhido…a final da taça de Portugal com um clássico Benfica-Sporting.

 O que é certo é que muita gente, perante a pergunta “vale a pena?”, optou por não responder.

E há também o pormenor que não podemos descartar: a do Timing, o calendário. É legítimo questionar a justeza de se candidatar a uma liderança nacional semanas depois de ter sido eleito para liderar uma câmara municipal? Não por falta de capacidade dos eleitos/ candidatos, mas porque os sinais contam. E há compromissos que pedem tempo para ganhar densidade antes de se transformarem noutras promessas.

Talvez esteja na hora de repensar algumas regras. Não para limitar a ambição que para mim, é mais do que legítima, mas para evitar que a confiança dos eleitores seja tratada como uma etapa descartável. A política, para ser credível, não pode parecer volátil.

Os resultados da eleição, com a dispersão evidente de votos e a baixa afluência, falam de algo mais fundo. Falam de um partido que, neste momento, parece não ter conseguido oferecer uma proposta suficientemente mobilizadora.

E quando isso acontece, não se resolve com comunicados. Resolve-se com introspecção, com verdade, e com menos pressa.

A escolha de um líder é, num partido democrático, um exercício nobre. Mas nobreza exige elevação, e nem sempre a forma como os processos decorrem honra essa expectativa.

Talvez por isso, e apesar de declarações festivas, o ambiente pareça mais de contenção do que de celebração.

Quem vive fora, como eu, pode até ser acusado de ver mal, de não compreender os matizes locais. Mas às vezes, é precisamente a distância que ajuda a perceber o todo e não apenas o imediato.

Esta não foi, seguramente, uma noite para esquecer. Mas também não foi, infelizmente, uma noite para recordar com entusiasmo.

Que ao menos sirva para repensar. Porque há partidos que carregam consigo mais do que votos…carregam histórias e memórias de esperanças. E esses merecem mais do que vitórias técnicas. Merecem coerência, clareza e rumo.

Os parabéns ao novo presidente do PAICV. Que nestes próximos meses que antecedem o período de campanha para as legislativas, o novo líder saiba unir o que está disperso, restaurar a confiança onde há cansaço, e reencontrar com os militantes e simpatizantes do partido um dos principais propósitos do partido, servir o povo e não servir-se dele.

Que se lembre sempre de que nenhum título substitui a legitimidade conquistada na prática; e que nenhuma vitória interna será completa enquanto persistirem dúvidas, divisões e desencontros.

Porque liderar não é impor-se, é merecer. E merecer exige trabalho sério, humildade real, escuta activa, e sobretudo fidelidade à verdade, mesmo quando a verdade dói.

Não basta dizer que se está ao lado do povo, é preciso provar, todos os dias, que se está do mesmo lado da vida que o povo vive. E isso implica, como ensinou Amílcar Cabral, não esconder os erros, não disfarçar as dificuldades, e não trair os compromissos assumidos com a história e com o futuro.

É essa a grandeza que se espera.
Tudo o resto são ruídos de campanha.

 

FORTE APLAUSO

Partilhe esta notícia

Comentários

  • Este artigo ainda não tem comentário. Seja o primeiro a comentar!

Comentar

Caracteres restantes: 500

O privilégio de realizar comentários neste espaço está limitado a leitores registados e a assinantes do Santiago Magazine.
Santiago Magazine reserva-se ao direito de apagar os comentários que não cumpram as regras de moderação.