Senhor José Tomás Veiga, venha a debate — mas sem rejeitar a obra! *
Ponto de Vista

Senhor José Tomás Veiga, venha a debate — mas sem rejeitar a obra! *

O multipartidarismo não corrigiu o maior mal: a perseguição. Pelo contrário, ela voltou com nova cara, novo discurso... e os mesmos métodos. Menos soberba, mais realismo. Ninguém deveria ter a pretensão de criar um filho perfeito — mas sim um filho capaz de andar com as próprias pernas, Sr. José Tomás Veiga. Aceite suas responsabilidades e limitações antes de tentar destruir a própria criação.

A sua postura lembra aquele pai que, depois de ter um filho, se arrepende... e diz que o filho devia ter tido a genética do vizinho. Uma espécie de recusa em aceitar a própria paternidade:

"Eu deveria ter feito uma experiência de laboratório, com o DNA de outro, para te gerar."

Por favor, homem. Ame o seu filho — porque com outra genética, ele não seria este (no qual o Sr teve uma segunda chance, e ainda assim não conseguiu implantar o paraíso que gostaria).

Esse tipo de arrependimento, em vez de maturidade, revela soberba, ambiguidade e incoerência. Arrepender-se da criação e ao mesmo tempo não assumir as consequências do que foi feito — isso, sim, é um problema.

O multipartidarismo não corrigiu o maior mal: a perseguição.

Pelo contrário, ela voltou com nova cara, novo discurso... e os mesmos métodos.

Menos soberba, mais realismo.

Ninguém deveria ter a pretensão de criar um filho perfeito — mas sim um filho capaz de andar com as próprias pernas, Sr. José Tomás Veiga.

Aceite suas responsabilidades e limitações antes de tentar destruir a própria criação.

O senhor não era um semi-deus.

Ninguém esperava isso.

E os seus arrependimentos, hoje, acabam por apagar um passado que também é meu — e que, apesar de tudo, não foi tão ruim assim para mim que vivi tudo, aqui das bases que vocês sempre tiveram dificuldades em escutar.

A verdade é que aquilo que o senhor ajudou a implantar depois (o multipartidarismo), isso sim... quase me destruiu, não fossem as estruturas da primeira República que o senhor quer destruir.

O seu depoimento não edifica.

Falo, especialmente, da parte onde faz um esforço titânico para deslegitimar a Primeira República — a mesma que ajudou a criar — e depois declara arrependimento.

A perfeição é uma ilusão.

O verdadeiro mérito de uma revolução ou de uma independência está na autonomia que ela gera, não no controle do destino.

Os abusos cometidos têm vários responsáveis.

E quero acreditar que, enquanto o senhor estava no PAIGC, não planeava os abusos que dizem ter vindo a acontecer depois (e que nem sequer atingiram muitos de nós, que estávamos na base).

Mesmo que o partido único tenha sido um erro — ou uma etapa forçada —, a democracia liberal (que não existia nem em Portugal em 1975) só foi possível porque essa primeira fase criou estruturas, consciência política e soberania.

O “filho”, imperfeito como é, anda com as próprias pernas, permitindo modificações feitas por si e demais de sua família, nos anos 90.

E não é justo que seja renegado — nem por arrependimento, nem por vaidade.

É legítimo. É vivo. É nosso.

Com todo o respeito:

O seu arrependimento absoluto é pouco sábio.

Substitua o remorso pela responsabilidade dizendo:

“Não criei algo perfeito, mas criei algo vivo. E o importante é que essa criação possa caminhar por si, mesmo com a participação de outros.”

Eu, que vim depois nesta terra, sinto-me sufocado.

Por uma geração que não arreda pé.

Fez o que fez, arrepende-se de não ter sido perfeita, e destrói a possibilidade de quem veio depois também participar.

Apressem-se a vender interpretações mal conseguidas de uma história que nunca puderam — nem deviam — controlar.

Francamente, bastavam-me os vossos dados. Não preciso da vossa opinião sobre eles.

Ide em paz.

Kabu Verdi é di nós. Obrigado pela vossa luta. sem ela, eu sequer iria nascer.

* Artigo publicado pelo autor no facebook

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