O Papa Francisco tinha 88 anos de idade e vários problemas de saúde. Liderou a Igreja Católica entre 2013 e 2025 e implementou numerosas reformas na instituição, que procurou abrir a todos.
Morreu esta segunda-feira aos 88 anos o Papa Francisco. O argentino Jorge Mario Bergoglio, antigo arcebispo de Buenos Aires e uma das figuras centrais da Igreja Católica latino-americana das últimas décadas, liderou a Igreja Católica durante cerca de doze anos. Foi eleito em 2013 para suceder a Bento XVI, que fez história ao tornar-se o primeiro Papa dos tempos modernos a abdicar do trono pontifício — e teve um pontificado marcado por profundas reformas institucionais no topo da hierarquia eclesiástica e pela abertura ao debate sobre alguns dos temas fraturantes que durante décadas foram tabu dentro da instituição católica, incluindo o lugar dos leigos nos cargos de liderança e a ordenação de mulheres.
Francisco, que durante toda a vida teve uma saúde frágil, viu a sua condição física deteriorar-se profundamente nos últimos anos como Papa. Esta deterioração tornou-se mais visível quando Francisco começou a surgir frequentemente de cadeira de rodas nos eventos públicos, especialmente debilitado pela dor ciática. Mas foram as questões respiratórias que mais o afetaram durante toda a vida: na juventude, sofreu de uma grave pleurisia, uma inflamação da pleura, a membrana que reveste os pulmões, e teve de ser operado de urgência para que lhe fosse retirada uma parte do pulmão direito. As dificuldades respiratórias perduraram toda a vida e era frequente que o Papa ficasse visivelmente ofegante com pequenos esforços.
O Papa argentino tinha sido hospitalizado em meados de fevereiro, depois de ter sido diagnosticado com uma bronquite e de ter exibido fortes dificuldades em respirar — que o obrigaram, em várias ocasiões, a interromper a leitura de homilias em celebrações. Depois da hospitalização, o quarto internamento desde a sua eleição como Papa, o Vaticano anunciou que Francisco tinha sido diagnosticado com uma “infeção polimicrobiana das vias respiratórias”.
Nos últimos anos, devido à deterioração da saúde física, pairou sempre sobre o Papa Francisco a ideia de que o argentino poderia seguir o exemplo do antecessor e também renunciar ao trono pontifício. O próprio Papa Francisco alimentou esse rumor ao pronunciar-se várias vezes sobre o assunto de forma ambígua, ora dizendo que não hesitaria em tomar a decisão caso sentisse que tinha chegado o momento, ora garantindo que a possibilidade não lhe tinha sequer passado pela cabeça nos momentos em que esteve hospitalizado. Quando, em 2022, Francisco visitou a cidade italiana de L’Aquila, onde está sepultado o Papa Celestino V — que fez história ao abdicar do papado em 1294 —, os rumores voltaram a surgir, especialmente porque também Bento XVI tinha visitado aquele lugar antes de anunciar a sua renúncia.
Francisco chegou mesmo a deixar algumas pistas sobre como poderia ser a sua renúncia: ao contrário de Bento XVI, não continuaria a viver no Vaticano, voltaria a vestir a sua batina preta de bispo e usaria apenas o título de “bispo emérito de Roma”, em vez de “Papa emérito”. Numa entrevista ao Observador em 2023, o vaticanista norte-americano John Allen Jr. especulava que Francisco teria na sua agenda algumas prioridades antes de ponderar uma renúncia: o Sínodo sobre a Sinodalidade, que só ficou concluído em outubro de 2024 (e que Francisco não abdicaria de supervisionar diretamente, para evitar que um sucessor mais conservador deitasse os esforços por terra); e o Jubileu de 2025, cujas celebrações se prolongam até janeiro de 2026. Francisco acabou por morrer antes do final do Ano Jubilar.
Nascido a 17 de dezembro de 1936 em Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio cresceu numa família muito ligada à Igreja Católica, no bairro de Flores. Estudou em escolas católicas, mas a vocação religiosa só chegou mais tarde, depois de uma juventude marcada pela vida boémia, pela paixão pelo tango e por uma consciência aguda da miséria vivida nas favelas de Buenos Aires. Estudou química na escola industrial, mas a eventual carreira científica foi interrompida em setembro de 1953, quando entrou numa igreja do seu bairro, se confessou com um sacerdote e a possibilidade de uma vocação religiosa lhe atravessou pela primeira vez o espírito.
Entrou no seminário diocesano depois de concluir a sua formação como técnico químico, mas optou depois por ingressar na Companhia de Jesus. Dizia que não queria ser um “padre de uma basílica”, mas ir “para os bairros, para as villas, estar com as pessoas”. Foi essa vontade que o levou a tornar-se jesuíta. A sua formação religiosa coincidiu com as reformas trazidas pelo Concílio Vaticano II e, nos anos 60, enquanto concluía os estudos, deu também aulas de literatura num colégio.
Foi ordenado padre a 13 de dezembro de 1969, em Buenos Aires. Depois, viajou até Espanha, para concluir a formação como jesuíta, que o levaria aos votos perpétuos em abril de 1973. Como jesuíta, teve um importante percurso na Argentina: foi mestre de noviços, professor na faculdade de Teologia, reitor do Colégio Máximo e chegou mesmo a provincial dos jesuítas argentinos, um cargo que desempenhou durante seis anos. O seu tempo como líder jesuíta na Argentina ficou também marcado pela ditadura militar no país. Bergoglio chegou a ser acusado de colaborar com os militares, mas viria mais tarde a saber-se que, na verdade, usou a sua posição e influência para salvar dezenas de pessoas perseguidas pelo regime — uma história contada no livro A Lista de Bergoglio, do autor italiano Nello Scavo.
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