...para que a justiça social transcenda a mera retórica e se estabeleça como um instrumento de emancipação, é essencial que se distancie das amarras do oportunismo político e se fundamente em práticas institucionais que respeitem a dignidade, a liberdade e a privacidade dos cidadãos. Somente assim poderá ser um verdadeiro vetor de desenvolvimento e não um subterfúgio para a perpetuação do poder.
A justiça social, conceito basilar nas modernas teorias políticas e jurídicas, tem sido frequentemente apropriada por regimes que, sob a égide de uma retórica igualitarista, perpetuam mecanismos de exploração e degradação das liberdades individuais. Tal fenômeno ocorre, sobretudo, em países em desenvolvimento, onde a fragilidade institucional possibilita a manipulação do discurso social como instrumento de controle político.
John Rawls, em A Theory of Justice, estabelece que “a justiça é a primeira virtude das instituições sociais, assim como a verdade é para os sistemas de pensamento” (Rawls, 1971, p. 3). No entanto, observa-se que, em muitos contextos, o conceito de justiça social é desvirtuado para fins populistas, resultando na instrumentalização da miséria como ferramenta política. Os governos, sob pretexto de distribuir riqueza e promover a equidade, implementam medidas que exacerbam a dependência da população, minam a autonomia cidadã e erodem as bases do Estado de Direito.
O aproveitamento político da justiça social não se limita à manipulação discursiva; ele se manifesta também na apropriação indevida de mecanismos institucionais para a perpetuação do poder. Thomas Sowell, em The Quest for Cosmic Justice, adverte que “a busca por uma justiça abstrata frequentemente resulta na supressão de direitos fundamentais sob o pretexto de um bem maior” (Sowell, 1999, p. 15). Dessa forma, observa-se que, em países onde a transparência institucional é frágil, os regimes utilizam-se de programas sociais não como instrumentos de emancipação, mas como moeda de troca para a fidelização eleitoral.
Além disso, há uma interseccionalidade preocupante entre justiça social e violação de privacidade, com governos coletando dados pessoais sob o pretexto de melhor implementar políticas sociais. Estudos como os de Zuboff (2019), em The Age of Surveillance Capitalism, demonstram que a coleta massiva de dados em países pobres não apenas mina a autodeterminação dos cidadãos, mas também cria mecanismos de coerção política e repressão social.
A falácia da justiça social como motor de desenvolvimento também pode ser observada na perpetuação de dinâmicas que reforçam as desigualdades estruturais, ao invés de mitigá-las. Conforme Amartya Sen elabora em Development as Freedom, o verdadeiro desenvolvimento social não se baseia na simples redistribuição de riqueza, mas na expansão das liberdades substantivas dos indivíduos (Sen, 1999, p. 12). No entanto, governos autoritários frequentemente implementam políticas de justiça social que, longe de conferir poder ao cidadão, reforçam a subserviência ao Estado.
Um exemplo paradigmático desse fenômeno pode ser identificado em regimes africanos e latino-americanos, onde programas de assistência social são financiados a partir do endividamento externo, consolidando ciclos de dependência tanto interna quanto internacional. Em tais contextos, as classes políticas perpetuam uma gestão clientelista da miséria, na qual os benefícios não são direitos conquistados, mas favores concedidos. Como destaca Acemoglu e Robinson em Why Nations Fail, “As instituições extrativas são projetadas para enriquecer e fortalecer aqueles no poder em detrimento da prosperidade e liberdade dos cidadãos” (Acemoglu & Robinson, 2012, p. 88).
A exploração política da justiça social também se evidencia na seleção criteriosa dos segmentos sociais a serem beneficiados. Em vez de políticas universais, opta-se por intervenções seletivas que favorecem determinados grupos, reforçando divisões sociais e exacerbando tensões políticas. Este fenômeno é amplamente estudado por Pierre Bourdieu, que demonstra como a reprodução do capital simbólico e social perpetua desigualdades estruturais, ainda que sob o verniz de justiça distributiva (La Distinction, 1979).
Diante desse panorama, torna-se imperativo questionar a instrumentalização da justiça social como ferramenta de controle político. O verdadeiro compromisso com a equidade exige não apenas a distribuição de recursos, mas a criação de instituições robustas que garantam a liberdade e autonomia dos indivíduos. Como ressalta Hayek em The Mirage of Social Justice, “a tentativas de impor justiça social através do controle estatal frequentemente resultam na destruição das próprias condições necessárias para sua realização” (Hayek, 1976, p. 54).
Portanto, para que a justiça social transcenda a mera retórica e se estabeleça como um instrumento de emancipação, é essencial que se distancie das amarras do oportunismo político e se fundamente em práticas institucionais que respeitem a dignidade, a liberdade e a privacidade dos cidadãos. Somente assim poderá ser um verdadeiro vetor de desenvolvimento e não um subterfúgio para a perpetuação do poder.
Comentários