Justiça “À la carte”
Colunista

Justiça “À la carte”

Quem protege a mãe que volta do mercado com o coração na boca?
O estudante que esconde o telemóvel no fundo da mochila?
O comerciante que investiu no seu negócio e cria postos de trabalho?
O emigrante de visita à família?
Ou o turista que contribui para o PIB nacional? A polícia, essa, continua na sua grande missão de não fazer nada.
Patrulham ruas onde nada acontece e justificam a sua inércia repetindo, como um disco riscado:
“Não há meios.”

Em São Vicente, a criminalidade tem um nome, um rosto e até uma morada.
Toda a gente sabe onde vivem os ladrões, os traficantes, os assaltantes de ocasião.
Sabem o que fazem, como fazem e até a que horas fazem.
Só quem parece não saber é a polícia.

Roubaram-te o telemóvel?
— “Devias saber guardar melhor os teus pertences.”

Entraram na tua casa e viste quem foi?
— “Apresenta queixa na esquadra. Mas só podemos prender em flagrante delito.”

Puseram-te uma faca ao pescoço?
— “Vamos ver...”

E vêem? Vêem, sim. Da cadeira da esquadra, enquanto folheiam papéis e encolhem os ombros.
“Não há meios.” “Não temos provas.” “O sistema judicial é lento.”

A população? Essa finalmente aprendeu.
Aprendeu que gritar não adianta, que esperar é para os tolos e que a única forma de se sentir segura é agir.

E agiu.

Farta de ver os mesmos rostos a passear impunes, uma organização de cidadãos indignados decidiu fazer aquilo que a polícia se recusa a fazer:
foram à porta de um alegado bandido e bateram-lhe à porta.

Odjo na odjo, disseram:

— “Sabemos quem és.”
— “Sabemos o que fazes.”
— “E se não páras, nós também não.”
— “Se precisares de ajuda para mudares de vida, também podemos ajudar...”

Filmaram. Publicaram. Exibiram-no como um troféu digital, um aviso vivo de que a paciência do povo tem limites.

Foram aplaudidos por uns e criticados por outros, que alertaram para os perigos da justiça popular e do linchamento virtual.

E é um perigo, sim!

Porque quando o povo começa a fazer aquilo que a polícia devia fazer, as fronteiras entre justiça e vingança tornam-se difusas.
E duplicam-se os crimes.

E o bandido? Esse continua a ser bandido, mas também é cidadão.
Tem direitos.
Merece julgamento e não uma fogueira digital.

Mas quem se lembra dos direitos da população que vive refém do medo?

Quem protege a mãe que volta do mercado com o coração na boca?
O estudante que esconde o telemóvel no fundo da mochila?
O comerciante que investiu no seu negócio e cria postos de trabalho?
O emigrante de visita à família?
Ou o turista que contribui para o PIB nacional?

A polícia, essa, continua na sua grande missão de não fazer nada.
Patrulham ruas onde nada acontece e justificam a sua inércia repetindo, como um disco riscado:
“Não há meios.”

Mas há sempre meios para pedir calma, quando já se perdeu o controlo.
Há sempre meios para justificar a inoperância, quando a tragédia já aconteceu.
Há sempre meios para marcar presença… no funeral da vítima.

Se a justiça é cega, a polícia em São Vicente parece ser surda e muda.

E quando o povo se vê obrigado a ser polícia, juiz e carrasco, estamos a um passo de viver num lugar onde a única lei é a do “Salve-se quem puder.”

O problema é se, em São Vicente, a justiça torna-se um “buffet” onde cada um se serve do que quer, quando quer e como quer.

Quanto à polícia… essa nem entra no menu.

FORTE APLAUSO.

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