A invisibilidade dos pobres é um grito sufocante. Não é que não falem; é que ninguém escuta. Não é que não sonhem; é que ninguém acredita nos seus sonhos. Assim, tornam-se fantasmas sociais, ecos de vidas que poderiam ter tido, sombras de um passado cheio de promessas não cumpridas. Se a verdadeira riqueza de um país está no seu povo, então estamos todos mais pobres enquanto ignorarmos esta solidão, esta invisibilidade, esta desumanização.
Há uma solidão que transcende o estar só. Uma solidão que caminha entre multidões, que passa despercebida nos bairros de lata, nas ruelas esquecidas e nas periferias abafadas do quotidiano.
Essa solidão veste o rosto da pobreza, da luta incessante por uma dignidade que parece sempre escapar entre os dedos.
A pobreza aqui não se manifesta apenas na falta de comida na mesa ou nos tetos que deixam passar a chuva. É também uma pobreza de reconhecimento, de pertença.
É o peso de existir numa sociedade que olha mas não vê, que ouve mas não escuta, que fala de inclusão mas perpetua a exclusão. Aqueles que vivem na margem são como sombras, os fantasmas que habitam uma realidade paralela àquela das classes privilegiadas.
Nas ruas ouvem-se murmúrios de vozes cansadas, vozes que, mais do que palavras, carregam gemidos de histórias invisíveis. Homens e mulheres que trabalham do amanhecer ao pôr-do-sol, carregando pesos físicos e emocionais que nunca são compreendidos. Pessoas que na ausência de oportunidades, encontram no desespero o seu único companheiro fiel. São crianças que crescem a ouvir que o sonho é um luxo reservado para poucos.
Talvez, o mais cruel seja essa outra forma de solidão: a de se ser “olhado” mas não visto. De habitar um espaço e ao mesmo tempo, desaparecer nele. De estar rodeado de outros mas sentir que ninguém vê a sua própria luta, o seu esforço, a sua dignidade. É o olhar desviado do transeunte que passa pelo mendigo na esquina. É o tom de desdém disfarçado de piedade ao observar a jovem que abandona a escola para se prostituir e sobreviver.
A invisibilidade dos pobres é um grito sufocante. Não é que não falem; é que ninguém escuta. Não é que não sonhem; é que ninguém acredita nos seus sonhos. Assim, tornam-se fantasmas sociais, ecos de vidas que poderiam ter tido, sombras de um passado cheio de promessas não cumpridas.
Se a verdadeira riqueza de um país está no seu povo, então estamos todos mais pobres enquanto ignorarmos esta solidão, esta invisibilidade, esta desumanização.
O verdadeiro progresso só será alcançado quando olharmos além das estatísticas, além dos discursos políticos.
Quando olharmos para os olhos de cada homem, mulher e criança, e reconhecermos, finalmente, a humanidade neles.
Comentários
Maria Paula, 16 de Fev de 2025
Parabéns pelo excelente trabalho, escrito com clareza e sensibilidade.
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Maurino de camões Brito Delgado, 8 de Fev de 2025
Excelente artigo. Pôs o dedo na ferida. Com os recursos que tem sido postos à nossa disposição não se justificava tanta pobreza. Um país que tem sido mal governado por falta de solidariedade da classe política para com o seu povo.
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Carlos Vieira De Carvalho, 8 de Fev de 2025
Infelizmente, é verdade Any Delgado! São almas, são pessoas humanas, são aquelas que vemos sem ver, porque às vezes cremos lerdamente que somos muito mais abençoados do que os outros e que os nossos destinos são e serão poupados de todas as vicissitudes da vida.
Nosso país é um verdadeiro exemplo de desequilíbrio em tudo.
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