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Paulo Rocha é arguido na morte de Zezito Denti d’Oru, mas juíza nega realizar ACP por ter “relação pessoal e familiar” com o ministro
Sociedade

Paulo Rocha é arguido na morte de Zezito Denti d’Oru, mas juíza nega realizar ACP por ter “relação pessoal e familiar” com o ministro

Mirta Teixeira, juiza do segundo juizo crime do Tribunal da Comarca da Praia, pediu escusa do processo para a realização de uma Audiência Contraditória Preliminar (ACP) solicitada pelos familiares de Zezito Denti d’Oru e em que o minisitro da Administração Interna, Paulo Rocha, está referido como arguido. Isto depois, de a Procuradoria Geral da República ter mandado arquivar o processo que investigava o suposto assassinato de Zezito, na Cidadela, ilibando os agentes da PJ liderados na altura por Paulo Rocha, que reaparece agora no processo, que já corre trâmites no tribunal, na qualidade de arguido.

A continuidade de Paulo Rocha como ministro da Administração Interna no Governo de Ulisses Correia e Silva está literalmente em xeque. Se perante as suspeições que recaiam sobre o governante na morte violenta de Zezito Denti d’Oru, em Outubro de 2014, quando era director adjunto da Polícia judiciária, já levantava questões éticas e morais para a sua manutenção no Executivo, neste momento já não há argumentos do primeiro-ministro para o segurar no cargo, como Santiago Magazine já questionara num Editorial de Fevereiro.

Rocha, que viu a Procuradoria Geral da República afagar-lhe as costas com o arquivamento, em Outubro último, do processo que investigava a suposta “execução” de zezito Denti d’Oru por uma equipa de operações especiais da PJ, liderada na altura pelo actual Ministro da Administração Interna, vai ter de responder agora pelo mesmo crime na qualidade de arguido.

É que os familiares do malogrado Zezito, tido pela PJ como assassino a soldo e então suspeito de assassinar a mãe de uma inspectora da Judiciária em 2013, não ficaram satisfeitos com o encerramento das investigações decretado pela PGR e decidiram constituir uma equipa de advogados para reabrir o processo, pedindo de imediato uma ACP, à luz do artigo 325 do código do Processo penal, e na qual além dos elementos da PJ que estiveram na cena do “crime”, consta o nome de Paulo Rocha, como arguido.

Com esse pedido de ACP, o processo sai, assim, da esfera do Ministério Público e passa automaticamente para as mãos de um juiz. Só que, na distribuição dos processos feita aos magistrados judiciais, o ‘dossier’ Zezito Denti d’Oru acabou caindo nas mãos da juíza Mirta Teixeira, do segundo juizo-crime, que, entretanto, pediu escusa.

Em nota do Tribunal da Comarca da Praia endereçada ao presidente do Tribunal de Relação de Sotavento, Mirta Teixeira pede para não realizar a audiência contraditória preliminar (ACP) solicitada pelo assistente da família do malogrado, João Pedro Cabral, em decorrência do despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público.

“Entende a meritíssima juíza titular deste juízo, que é seu dever suscitar o respectivo incidente de escusa de juiz nos termos do disposto no artigo 53º, nº1, b) do CPP, uma vez que um dos arguidos (sic) nos autos, Paulo Augusto Costa Rocha, é pai da sua filha”, diz a nota do Tribunal da Praia enviada ao Tribunal da Relação de Sotavento.

A magistrada considera que essa relação “pessoal e familiar” entre ela e o “arguido” Paulo Rocha, “é suscetível de gerar, no entendimento da requerente, no cidadão para quem a justiça é dirigida, um sentimento de desconfiança sobre a sua imparcialidade, o que justifica o deferimento do pedido de escusa ora formulado”.

O pedido dos familiares de Zezito Denti d’Oru para a realização desta ACP surgiu na sequência do despacho de arquivamento do processo pelo procurador Nilton Moniz. O objectivo é esmiuçar e esclarecer de vez este caso, uma vez que dados apurados indicavam que Zezito Dentu D’Oru foi executado durante essa operação da Judiciária, em Outubro de 2014 no bairro da Cidadela, que ceifou a vida do então emigrante na Holanda com tiros de metralhadora.

Zezito Denti d’ Oru, era tido como “assassino a soldo” do traficante Paulo Ivone, preso e condenado no âmbito da operação Lancha Voadora. A sua morte, na noite de 13 de Outubro de 2014, como foi noticiada, na altura, resultou de uma operação realizada por agentes da PJ, liderados pelo então director-nacional adjunto, Paulo Rocha, actual ministro da Administração Interna desde 2016.

As notícias de Santiago Magazine sobre uma investigação criminal a Paulo Rocha mereceram reacção brusca do Ministério público, na pessoa do PGR, Luis José Landim, que ordenou o levantamento de um processo contra o jornal e do seu jornalista Herminio Silves, antes por violação do segredo de justiça, e depois, gorada essa tentativa, por desobediência qualificada, processo esse que aguarda desfecho. Também o jornal A Nação e o jornalista Daniel Almeida tiveram a mesma “sorte”, enquanto a PGR, após sete anos sem ouvir ninguém, mandaria arquivar o processo por falta de provas, “matando” o caso Zezito e estendendo o tapete da inocência a Paulo Rocha. Este, com respaldo político do PM e jurídico da PGR, decide então processar o jornalista de Santiago Magazine e os ex-oficiais da PN, Manuel Alves e Elias Silva, por também denunciarem o caso

Só que, num expediente legal paralelo, os familiares do malogrado conseguiram constituir advogado e pedir uma ACP, passando o processo para os tribunais que já têm Paulo Rocha como arguido. Resta agora saber o que irá fazer Ulisses Correia e Silva para segurar Paulo rocha no seu elenco, depois de ter afirmado e garantido total apoio ao seu ministro responsável pela segurança interna quando havia apenas suspeições sobre o seu envolvimento no assassinato de um cidadão pelas mãos do estado – a Polícia Judiária.

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SOBRE O AUTOR

Hermínio Silves

Jornalista, repórter, diretor de Santiago Magazine