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Plateau. Passageiros dormem ao relento para conseguir bilhete de barco para Boavista
Sociedade

Plateau. Passageiros dormem ao relento para conseguir bilhete de barco para Boavista

São mais de 90 pessoas que passarão as próximas horas ao relento à espera do amanhecer para tentar um bilhete de passagem no navio Djon Dade rumo à ilha da Boavista, na Agência Nacional de Viagem (ANAV), no Plateu. Pedaços de papelão servem de camas improvisadas e a fila vai engrossar à medida que a noite passa na rua Serpa Pinto. Um cenário que põe mais uma vez a nu a problemática do transporte inter-ilhas e as fragilidades do sector.

Neste grupo encontram-se pessoas de todas as idades. Adolescentes, jovens, adultos e até bebés de colo. A maioria santiaguenses a residir na ilha da Boavista. Comerciantes e funcionários que dizem ser este um sacrifício necessário para garantir um bilhete de passagem de regresso a casa e ao trabalho naquela ilha.

“Se não viermos desde a noite guardar vez não conseguimos bilhete. Já somos mais de 90 pessoas. Imagine amanhã de manhã quantos mais serão. Algumas pessoas que cá estão já tinham dormido aqui ontem, mas foram informadas que os bilhetes só seriam vendidos terça-feira. Há aqui comerciantes e trabalhadores que estão a perder dias de trabalho, com rendas para pagar e em risco de perder os postos de trabalho”, relata ao Santiago Magazine o comerciante, Albertino Soares.

Pela ordem de chegada, Albertino Soares é o 40º da fila, mas explica que nem assim é certo que conseguirá um bilhete. Isto porque cada pessoa pode comprar mais de um bilhete e normalmente são vendidos no máximo 80 passagens.

Uma situação que revolta este comerciante, ele que até  já perdeu mercadoria perecível nas últimas semanas, por não ter conseguido embarcar.

“Esta é uma situação abusiva que se repete desde há muito. Precisamos de mais barcos para a Boavista. Já estou à espera de uma viagem há três semanas. Na semana passada dormimos no cais mas não conseguimos lugar na mesma. As nossas mercadorias ficaram em cima do cais a deteriorarem-se. Eu perdi tomates, pimentos e outras verduras que levo para comercializar”, lamenta.

Com o Praia d’Aguada nos estaleiros em São Vicente há já várias semanas, o Djon Dade é neste momento a única opção para quem precisa chegar a Boavista antes do fim do mês e não pode custear um bilhete de avião.

É o caso de Jéssica Cardoso. Monitora de jardim-de-infância, esta jovem natural da ilha do concelho de São Miguel, no interior de Santiago, deslocou-se neste mês de Agosto para férias, mas também para as sementeiras. Com duas filhas pequenas não consegue custear três passagens de avião. O barco é a solução mais económica, por isso dormirá ao relento para tentar comprar os bilhetes de barco.

“Regresso ao trabalho a 3 de Setembro e se não for neste barco esta semana não chegarei a tempo. Três passagens de avião custam mais de 20 contos, não tenho como encaixar esta despesa”, explica.

O Santiago Magazine pesquisou os preços da passagem aérea durante a realização desta reportagem. O preço mais baixo por passageiro para os próximos dias é de 7 mil e seiscentos escudos, mais do dobro do custo da passagem de barco. Um valor considerável para trabalhadores cujo salário líquido, na sua maioria, não ultrapassa os 30 mil escudos.

“Com 12 contos na Boavista cobrimos as despesas de renda, luz, água e alimentação por algumas semanas” exemplifica Albertino Soares.

Outro inconveniente do avião é, conforme explica o comerciante, o limite de bagagem, tornando o barco a única opção viável para os comerciantes, que constituem o grosso dos passageiros para a ilha da Boavista.

Unidos por um problema comum, estes passageiros passarão as próximas 12 horas ao relento, confiantes na segurança garantida pela proximidade da Direcção Nacional da Polícia Nacional.

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SOBRE O AUTOR

Karina Moreira