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A CAÓTICA EXPLOSÃO DO INCONFORMISMO COM O GOVERNO, O «STRIPTEASE» DO PAICV E A NUDEZ DA VERDADE
Ponto de Vista

A CAÓTICA EXPLOSÃO DO INCONFORMISMO COM O GOVERNO, O «STRIPTEASE» DO PAICV E A NUDEZ DA VERDADE

Dando este Governo do MPD profundos sinais da ilegitimidade pelo não cumprimento das promessas e compromissos eleitorais efetuados e o não cumprimento da Constituição da República, nomeadamente pela denegação da Justiça no tempo desejado e pela negação da segurança nos limites do que é razoavelmente aceite e suportado, a oposição deve, não só dar a voz à indignação, como tem feito, mas também, deve dar voz e substancializar a vontade de mudança que existe no país e dar voz à esperança que existe no interior de cada cidadão.

Os leitores conhecem-me. Já o afirmei em outras ocasiões. Usualmente, escrevo para afixar as minhas ideias, em jeito de memorar para a posteridade ou para expressar uma opinião em desacordo ou acordo com posicionamentos, factos e /ou políticas emitidas. É com este último propósito que, vezes sem conta, de forma cidadã e interventiva, mais tenho debruçado sobre aspetos referentes à governação do país, dando conta de uma caótica explosão do inconformismo reinante, na justa medida em que, a meu ver, os esclarecimentos e as informações, formulados e dados a estampa sobre os atos da governação, municiam os cidadãos de um amplo conhecimento sobre o Governo, cujo papel é a conquista e a edificação da boa sociedade tal como ele a vê.

Neste aspeto, sufragando o que disse o Papa Francisco, na Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, a propósito da alegria, poderei dizer que, também, encaro como sendo messiânico o conhecimento, ao pretender que ele chegue aos cidadãos, auxiliando-os nas suas tomadas de decisão como eleitores racionais.

É, por demais sabido, ou melhor ainda, presume-se que pelo menos todo o cidadão mediano saiba, que num Estado de Direito Democrático, a conquista e a edificação da boa sociedade e, por conseguinte, também do Bem Comum, são realizados, em disputa, entre as forças políticas que, democraticamente, concorrem para o acesso à sua gestão. Terminadas as disputas eleitorais, aqueles cujo papel a competição reserva como sendo o de oposição, exigem-se deles uma permanente fiscalização e vigilância, bem como a proposição de alternativas e não deslumbramentos com as dificuldades e problemas.

Diferentemente do que tenho escrito, desta feita, debruço-me sobre a oposição, mais concretamente sobre o PAICV, cujo sistema de bipartidarismo existente no país o potencia e o coloca como força alternativa para, em rotativismo, vencer as próximas Eleições Legislativas e governar o país, a partir de 2026. Todavia, pelo que se constata, nada garante que seja factível a vitória se este partido político acreditar que a condição, aparentemente, determinante – desmérito do partido que se encontra a governar – seja por si só garantia suficiente para tal, ainda que, outrora, no passado, em outras ocasiões, fosse.

Alguns analistas nacionais apontam que a vitória do PAICV nas Eleições Legislativas de 2001 justifica-se muito pelo desmérito em que caiu o MPD no decorrer dos anos 90 do que propriamente o mérito daquele. Tomo de barato esta explicação, mas não para sufragar o contexto atual, ainda que muitos estabeleçam nela horizontes sólidos de expectativas.

Em todo o caso, tomando a oposição como foco de análise, na presente conjuntura, sinais vários existem que, de forma conjugada ou a vez, suportam uma aturada análise e legitimam asseverar, o contrário do ocorrido em 2001, portanto, a não linearidade e nem a simultaneidade entre as duas ocorrências, desmérito da situação e vitória da oposição, pelas seguintes razões: (i) desde logo, a perceção existente de que o atual líder do partido, Dr. Rui Semedo, suporta uma liderança a prazo; (II) a afirmação de uma oposição eficazmente demolidora, mas sem alternativas de edificação; e, (iii)  não tão despiciendo, a existência de uma agenda reativa e não proativa, em matéria de posicionamentos do partido.

Com efeito, os vários erros, desacertos e desgastes, que perpassam, atualmente, o partido no poder, (MPD) com profundo realce para este segundo mandato, podem não encontrar respostas ou alternativas na oposição (PAICV) se estimados cada um desses fatores, (em i, em ii e em ii), em particular, e a sua total combinação no geral. Premissas devidamente cunhadas dão conta de que nenhum cidadão-eleitor, por mais sedento de mudança que esteja, coloca ou entrega os seus votos a um roto líder da oposição. E mais, o eleitor-racional precisa saber o que faria a oposição se fosse eleita para governar o país em cada uma das áreas de governação, na situação atual.

Ao cidadão-eleitor-racional não lhe bastará, no futuro, ter em mãos as plataformas eleitorais para conhecer as propostas de cada um dos partidos políticos. Até porque, estatísticas existentes provam que poucos são os eleitores que, na verdade, leem as plataformas eleitorais para formular a sua opção de voto.   O cidadão, como bem registou Anthony Downs, que espera sempre ver melhorada a sua situação de vida, contando com o fluxo de rendas advenientes da atividade governativa, enquanto eleitor-racional ele precisa de sínteses de informações pontuais para decidir.

Daí que, mesmo estando o inconformismo a pique e mesmo que o fundo musical se encontre apropriado para a oposição, o momento não é de se seduzir no varão da «pole dance». O povo, a coletividade que tanto invocam e endeusam os partidos políticos no tempo das campanhas eleitorais encontra-se resignado e busca diuturnamente alternativas para melhorar o seu fluxo de rendas proveniente da atividade governativa, em complemento às suas lutas diárias.

Invertendo a máxima de Carl von Clausewitz, segundo a qual a Política é Guerra continuada por outros meios, admito, não sem grandes esforços intelectuais, que talvez o PAICV, ardiloso como nos habituou, esteja num jogo tático apenas. Ou seja, ainda que num jogo oculto, este partido está uma estratégia bem definida, um plano de ação bem delineado, e, por ora, limita-se a fazer mover peças soltas da engrenagem para vir a compor o puzzle no futuro. Nada contra, se assim for. Embora saiba, pelo conhecimento técnico, que o timing político importa, para a inflexão da mudança. E é este o espírito desta reflexão. Aliás, o tempo em tudo importa porque, atuando, altera a qualidade do produto. Para que a opção de voto do cidadão-eleitor não ocorra, unicamente, apenas, pela via da avaliação da folha do desempenho da situação, do partido no poder, sem referências fortes da alternativa, urge, então, mudar o status quo reinante que está a infestar a perceção negativa do campo da oposição. Isto, necessariamente, passa pela eliminação otimizada dos fatores anteriormente narrados, nos três pontos, em função do tempo que nunca deve ser longo. Arrisco assumir que o tempo é agora. O PAICV não pode ir às Eleições Autárquicas, em 2024 com tacticismos: mover as peças soltas para vir compor o puzzle num futuro incerto. Nomeadamente, com a perceção de estar com uma liderança partidária a prazo, sem apresentar as alternativas de edificação no lugar das demolições e caminhar com a agenda política ao reboque da onda.

Engrenagens a serem conseguidas nas Eleições Autárquicas de 2024, com mais evidência agora do que outrora, poderão engatilhar dinâmicas de vitória em 2026. Isto é válido tanto para o PAICV, posto de observação desta análise, como para o MPD. Parte do potencial explicativo para a ocorrência deste fenómeno pode ser inferida a partir do «relacionamento hidráulico», em consolidação, inaugurado pelo MPD entre o Governo e as Câmaras Municipais que estão a cristalizar-se, por esta altura, num trade off entre os dois poderes do qual o Cidadão-eleitor não é imune. Perante isto, em querendo catapultar-se para a vitória nas Eleições Legislativas o PAICV, muito mais do que manter as Câmaras Municipais atuais, precisa de conquistar outras ou fazê-las subtrair do MPD a favor de terceiros.

Pelo tamanho e simbolismo que representam, as Câmaras Municipais de S. Vicente e Santa Catarina de Santiago podem ser o pivot da mudança. Contudo, pelo historial da competição e pelo resultado das eleições, escassa é a probabilidade de o PAICV ganhar eleições nestas Câmaras Municipais. Seja como for, o PAICV, ciente da consolidação do Sistema Bipartidário em Cabo Verde, deve empenhar-se urgentemente na escolha de situações estratégicas que busquem melhorar o seu resultado e entrar como vitorioso nas Eleições Legislativas de 2026, tendo como rampa de lançamento as autárquicas de 2024.

Contrariamente aos grupos de cidadãos, os partidos políticos podem delinear estratégias de jogarem em múltiplas arenas e de forma iterativa, tendo em vista um possível trade off entre as Eleições Autárquicas e Legislativas e a busca de melhoramento de resultados eleitorais. Ao garantir a exclusividade das Listas Partidárias para as Eleições Legislativas e estando as Eleições Autárquicas a acontecerem antes das Legislativas, a Constituição da República de Cabo Verde abre possibilidades de alinhamentos estratégicos entre os contendores das duas eleições com respaldo no melhoramento dos resultados em geografias eleitorais inacessíveis e pleitos eleitorais diferenciados. Cedências estratégicas ou alianças concertadas, nas Eleições Autárquicas, úteis poderão vir a ser para a vitória nas Eleições Legislativas. É como quem diz: o PAICV deve viabilizar o voto em 2024, para obter a vitória em 2026.

É obvio que, para tanto, não bastam as astúcias e estratégias políticas. Dando este Governo do MPD profundos sinais da ilegitimidade pelo não cumprimento das promessas e compromissos eleitorais efetuados e o não cumprimento da Constituição da República, nomeadamente pela denegação da Justiça no tempo desejado e pela negação da segurança nos limites do que é razoavelmente aceite e suportado, a oposição deve, não só dar a voz à indignação, como tem feito, mas também, deve dar voz e substancializar a vontade de mudança que existe no país e dar voz à esperança que existe no interior de cada cidadão.

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