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Anterior Juíza do 4º juizo-crime recusou julgar Amadeu por não ser tribunal competente
Política

Anterior Juíza do 4º juizo-crime recusou julgar Amadeu por não ser tribunal competente

A juiza Sara Isabel Ferreira, que foi primeiramente nomeada para substituir o juiz Alcides Andrade no julgamento de Amadeu Oliveira - no processo em que está acusado de 14 crimes de ofensa contra os juizes do Supremo Tribunal de Justiça -, recusou o caso, na altura, alegando que o 4º juízo-crime do Tribunal da Praia não tem competência para julgar processos ordinários, e sim, e somente, processos especiais de transação e processos sumários. Precisamente, o mesmo argumento que Oliveira sustenta para não ir a julgamento, "por não reconhecer competência técnica desse Juizo", actualmente titulado pela juiza Ivanilda Mascerenhas Varela.

Ao terceiro dia previsto para o seu julgamento, agendado para os dias 6, 7 e 8 do corrente mês, Amadeu Oliveira continua transitando pelas ilhas do Norte do País, recusando e resistindo em não comparecer à audiência no 4º juizo-crime do Tribunal da Praia, que não reconhece como Tribunal competente para o julgar.

Santiago Magazine foi pesquisar e descobriu que já em Maio de 2019 a juiza Sara Isabel Ferreira tinha apresentado este mesmo argumento para recusar julgar Amadeu Oliveira e, assim, devolver o processo à procedência, isto é, ao 3º juizo-crime que foi o juizo a quem o processo fora inicialmente distribuido.

Na altura, Março de 2019, esse juizo era titulado pelo juiz Alcides Andrade que acabou por sair do processo quando se auto-declarou impedido, pedindo a sua substituição. O caso foi então entregue ao 4º Juizo-crime, tendo a juiza Sara Isabel Ferreira recusado assumir o processo, por considerar que essa instância apenas possui competência especilizada para julgar processos especiais de transação e processos sumários, cujos arguidos tenham sido presos em flagrante delito, por crimes cuja pena seja até 5 anos e por factos ocorridos a menos de 30 dias. Situação que não corresponde ao caso de Amadeu Oliveira, cujo processo por 14 crimes, feito o cúmulo jurídico das penas abstratas, ultrapassa os 10 anos de prisão.

"De facto, o nº1 do artigo 49º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais estabelece, como regra que «nos tribunais com mais de um juizo, o juiz do primeiro é substituído, para efeitos processuais, nas suas faltas, ausências e impedimentos, pelo do segundo juizo, e assim sucessivamente, para que o juiz do último juizo seja substituido pelo do primeiro juizo». No entanto, não se trata de uma regra estanque, sendo que os números seguintes do artigo 49º da Lei 88/VII/2011, trazem excepções à referida regra, consagrando, nomeadamente, no nº 3 do citado artigo que «quando o tribunal esteja dividido em Juízos de competência especializada ou específica, o disposto no número anterior aplica-se, com devidas adaptações, de forma a que se proceda, sempre que possível, à substituição de cada juiz pelo que se encontra afectado a outro juizo da mesma espécie», começou por escrever a juiza Sara Isabel Ferreira no seu despacho de 15 de Maio de 2019.

Posição da Juiza Sara Isabel Ferreira

Por esta razão, argumentou, "para efeitos de substituição, aplica-se o disposto no nº3 do citado artigo 49º e, consequentemente, a substituição de cada juiz, por motivo de faltas, ausências e impedimentos, deve ser afectada, sempre que possivel, ao juiz que esteja colocado num juizo da mesma espécie. No caso concreto, tratando-se da substituição de um juiz colocado num juizo criminal de competência genérica e havendo mais juizos da mesma espécie neste Tribunal, a substituição, deve ser assumida por um juiz colocado num outro juizo criminal de competência genèrica e não a um juiz colocado num juizo de competência específica".

Feitas estas considerações e explicações técnico-jurídicas, a juíza negou assumir o caso e mandou devolver o processo à secretaria do 3º juizo-crime para o encaminhar para o 1º juizo-crime, que, segundo escrevera então, é o tribunal competente para julgar este processo instaurado pelos juizes do Supremo Tribunal de Justiça, Benfeito Mosso Ramos e Maria de Fátima Coronel contra Amadeu Oliveira.

Com base no posicionamento desta magistrada e estribado na legislação que a própria cita, fica evidente que o 4º juizo criminal do Tribunal da Praia não é a instância competente para julgar este processo.

Posição da juiza Ivanilda Varela

Em Outubro de 2020, a juiza Ivanilda Mascarenhas Varela que se encontrava colocada no Tribunal de Santa Cruz, no interior da ilha de Santiago, foi transferida para assumir o 4º Juizo Crime da Praia em substituição da anterior magistrada que, entretanto, foi colocada no Tribunal de Execução de Penas.

Assim, sabe Santiago Magazine, um dos primeiros despachos dados por essa nova juiza do caso, em Novembro de 2020, foi marcar o julgamento de Amadeu Oliveira, para os dias 6, 7 e 8 de Janeiro, o que não foi aceite pelo arguido que insistie que aquele Juízo não possui competência para o julgar, na esteira do posicionamente já assumido pela anterior juíza.

A propósito, um jurista consultado por este jornal concorda com a posição da juiza Sara Isabel Ferreira e, mais do que isso, afirma que "em direito penal, o princípio do 'Juiz Natural' configura ser um Direito e uma Garantia Fundamental constitucionalmente consagrado no Nº 7 do Artigo 35º da Constituição da República que não pode ser alterado, nem mesmo quando o arguido esteja de acordo, quanto mais quando o mesmo declara resistir a essa alteração de Juízo competente. O desrespeito do princípio do Juiz Natural é determinante de nulidade e invalidade de todo o processo, pelo que corre-se o risco de o julgamento poder ser declarado inválido, além de, consequentemente, invalidar a sentença que a Juiza Ivanilda Mascarenhas Varela vier, eventualmente, a proferir contra Amadeu Oliveira".

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Redação