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Máfia de terrenos. Arnaldo Silva, Rafael Fernandes e Alfredo Carvalho constituídos arguidos
Sociedade

Máfia de terrenos. Arnaldo Silva, Rafael Fernandes e Alfredo Carvalho constituídos arguidos

O Ministério Público já deduziu acusação contra os suspeitos da venda ilegal de terrenos na Praia durante anos. São 15 arguidos, com destaque para figuras públicas como Arnaldo Silva, Rafael Fernandes, Alfredo Carvalho e a empresa deste, Tecnicil, todos acusados de burla qualificada, lavagem de capital, associação criminosa, falsificação de documentos e corrupção activa. O MP, que pede julgamento perante Tribunal Colectivo, sugere inclusive a prisão preventiva de Arnaldo Silva, TIR para os demais réus e confiscação dos seus bens, porque provados em como lesaram aos legítimos donos dos terrenos e ao Estado de Cabo Verde mais de 2 milhões de contos.

O despacho de acusação do Ministério Público, de 90 páginas, e que Santiago Magazine teve acesso, detalha todo o esquema montado e como esse “grupo criminoso” – assim está escrito no despacho do MP que notificou ontem, 9, todos os implicados – agiu “de forma criminosa e altamente prejudicial para o Estado, para a Justiça, para a Autoridade do Estado e para a sociedade em geral, com danos avultadíssimos aos legítimos proprietários”, escreve Manuel Espírito Santo, procurador da República que liderou o processo de investigação.

Esse extenso documento, que, no fundo, deita por terra perseguição política e evidencia crimes comuns, enumera e deduz acusação contra 14 indivíduos mais a empresa Tecnicil (enquanto pessoa colectiva). À cabeça, Arnaldo Silva, antigo governante e ex-bastonário da Ordem dos Advogados, que pela acusação do MP, aparece como pivot de toda a trama, estando por isso acusado de sete crimes: burla qualificada, corrupção activa, organização criminosa, falsificação de documentos, agravado, lavagem de capitais e falsidade informática. Crimes, de resto, que motivaram a sua detenção o ano passado, estando sob Termo de Identidade e Residência, proibição de contactar os outros visados e interdição de saída do país.

Para o MP, este último aspecto (proibição de saída do país), se não fiscalizado convenientemente, poderá permitir a fuga de Arnaldo Silva, pelo que sugere a alteração do TIR para “a medida mais gravosa, a de prisão preventiva”. “Contra o arguido (Arnaldo Silva) foi proferido despacho de acusação e imputa-se-lhe um acervo de crimes muito graves e a declaração da extinção da medida de saída do país e consequente autorização para viajar para Portugal corre-se sérios riscos de não regressar ao país para se entregar voluntariamente à justiça. Por outro lado, em Portugal, residem vários dos demais arguidos em relação aos quais recai a medida de coacção de os contactar e não há como não violar esta medida se for autorizado a viajar”, observa o Ministério Público, que, ciente desse facto, sugere então a promoção da “medida mais gravosa, a de prisão preventiva” ao ex-bastonário.

Além de Arnaldo Silva, estão indiciados nessa suposta máfia da venda de terrenos na Praia, denunciados há anos pelo advogado Felisberto Vieira Lopes, mais 14 pessoas, com relevância para o empresário Alfredo Carvalho, a sua empresa, Tecnicil, e Rafael Fernandes, vereador da Câmara Municipal da Praia que este jornal havia escrito que estava sob investigação e que o próprio desmentiu alegando na altura tratar-se de “fake new”.

No caso de Fernandes, o MP pede a aplicação do Termo de Identidade e Residência, assim como ao arguido Alfredo Carvalho, dono da empresa Tecnicil, que, segundo o MP, “apropriou-se ilicitamente de terrenos alheios para a sua comercialização”. “Alfredo Carvalho e a Tecnicil, ilegalmente se apropriaram de terrenos que sabiam ser alheios, com a conivência dos réus Arnaldo Silva e Maria Helena (n.d.r. herdeira de Fernando de Sousa, suposto donos desses terrenos no Palmarejo e zonas contíguas), com avultados prejuízos aos legítimos proprietários, Caixa Económica de Cabo Verde, BCA e Banco Interatlântico no total que ascende a 1.500.000.000$00 (um bilhão de escudos), à qual se acresce a quantia de 638.000.000$00, lotes e imóveis edificados e vendidos, designadamente os valores pelos quais foram vendidos o condomínio ‘Ondas do Mar’, acrescendo a quantia de 2.000.000.000$00, o que se traduz no valor do terreno e no lucro obtido ainda sem ter em conta o património pessoal do arguido Alfredo Carvalho”.

“O arguido Arnaldo Silva depositou numa das suas contas a quantia que ascende a 70.000.000$00, tendo este advogado de profissão e trabalhador dependente da extinta TACV, e da criada Cabo Verde Airlines, nunca declarado valores que justifiquem a proveniência deste montante”, lê-se no despacho do MP, que caracteriza os 14 arguidos mais a Tecnicil de “grupo criminoso”.

A lista de réus, para os quais o MP pede julgamento de tribunal colectivo, inclui ainda Armindo Silva (ex-topógrafo da CMP), Maria Helena Oliveira e Sousa (filha de Fernando de Sousa), Maria Albertina Duarte (Ex- director geral de Registo e Notariado), Rita Martins (Notária-Conservadora dos Registos), Elsa Silva (empresária angolana), Victor Oliveira e Sousa (filho de Fernando Sousa), Maria Leonor Pinto Balsemão Sousa (portuguesa), José Manuel Oliveira Sousa (filho de Fernando Sousa), Ivone Brilhante (portuguesa), Maria do Céu Monteiro e Wanderley Oliveira e Sousa (filho de Fernando Sousa).

Todos eles, grosso modo, estão acusados de crimes de organização criminosa, burla qualificada, falsificação de documentos agravado. O MP deduz o pedido de confisco de bens de Arnaldo Silva, Maria Helena Sousa, Armindo Silva, Elsa Baião Silva, Victor Sousa, Maria Leonor Pinto Balsemão Sousa, José Manual Sousa, Ivone Brilhante, Wanderley Sousa, Maria albertina Duarte e Rita Martins.

“Pelo exposto, requer-se aos meritíssimos juízes se digne julgar procedente o presente pedido de confiscação (…) a favor do Estado de todos os bens imóveis, bens móveis, direitos, títulos, valores e quantias e quaisquer outros objectos depositados em bancos ou outras instituições de crédito, de Arnaldo Silva e Elsa Baião Silva, apreendidos nos presentes autos e ainda dos bens a apreender dos arguidos Armindo Silva e Maria Albertina Duarte, bem assim dos arguidos Alfredo Carvalho e de todos os herdeiros de Fernando de Sousa”, exige o Ministério Público. Em relação à Tecnicil, o MP pede que pague 4 mil contos de caução.

Recorde-se que Arnaldo Silva, antigo secretário de Estado Adjunto do primeiro governo liderado por Carlos Veiga, ex-bastonário da Ordem dos Advogados de Cabo Verde, foi condecorado no ano passado pelo Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, durante as comemorações do 5 de julho, por relevantes serviços prestados à nação. Semanas depois foi detido pelo MP sob acusações que hoje acabaram confirmadas pelo poder judicial. 

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Redação