Certo dia, no ano de 2012, desloquei-me ao ministério das finanças como pensionista, embora a contragosto, para fazer a prova de vida presencial a que todos nós idosos éramos obrigados para podermos receber a nossa “bufunfa”, no fim do mês.
No “Hall” de entrada daquele Ministério encontravam-se vários idosos que para lá se deslocaram para o mesmo fim. Entre nós havia uma senhora transportada numa cadeira de rodas por uma moça. Eu e o amigo Horácio Soares, hoje falecido, estávamos num canto a conversar sobre aquele ato a todos os títulos humilhante. Quando a idosa, deficiente, que por sinal dizem que entrou às oito horas, foi chamada, a acompanhante correu os olhos à volta do espaço na tentativa de localizar alguém com força suficiente para levar ao colo a senhora até a funcionária que, diga-se de passagem, ficava bastante longe do lugar onde estávamos. No fim, fixou os olhos em mim, único que no rol dos faimados aparentava melhor aspeto.
Antes de me dirigir palavra, pedi-lhe os documentos da senhora e munido do BI entrei e fui ter com a funcionária que me fitou e antes de responder o bom dia de Deus, arrebatou das minhas mãos, que se encontravam a curta distância dela, o BI da senhora, olhou e disse: Dja nhu bira mudjer? Eu respondi: Não, é de uma senhora que está lá na entrada numa cadeira de rodas e impossibilitada de vir até cá apresentar-se a si. Como dizem, se o Maomé não pode ir a montanha, esta vai ao Maomé. Portanto, neste ponto, a senhora assume o papel da montanha indo olhar o senhor Maomé lá fora… Ela ficou de tal forma raivosa que não consegui na altura saber porquê. Abriu as asas do nariz que pareciam fole de gaita aberta e disse, não vou: tragam a mulher! Eu respondi: ela não pode e não há ninguém predisposto e com forças suficientes para trazê-la até aqui ao colo ou mesmo bambudu. Isto provocou mais raiva, os ânimos se exaltaram e acho que alguém chamou a polícia que momentos depois chegou.
A minha sorte foi que o fulano era meu amigo e quando me viu só me aconselhou para abandonar o recinto, o que eu fiz sem saber no fim como é que o assunto ficou resolvido. Acho que ela acabou por ir ver a mulher.
A partir daquele dia jurei lutar para acabar com aquela humilhação aos idosos neste século em que a tecnologia está tão avançada.
Foi assim que a 24 de Fevereiro de 2012, escrevi e mandei publicar num dos jornais então na praça, para alertar as autoridades e pedir a sua atenção para aquilo que eu achei ser humilhação aos idosos, um artigo cujo título, é:
TO WHOM IT MY CONCERNE
INCOMPETÊNCIA DA ADMNISTRAÇÃO OU HUMILHAÇÃO DOS IDOSOS?
Na mesma altura escrevi uma carta ao então Secretário de Estado Dr. Romeu Modesto que sequer teve a gentileza de mandar notificar-me da receção da carta.
A 15 de Janeiro de 2016, em nome dos idosos e a coberto do artigo 58 da Constituição da República de Cabo Verde e do artigo 266 do Regimento da Assembleia Nacional enderecei uma petição à Assembleia Nacional, no sentido de ela produzir uma Lei que pusesse termo àquela humilhação.
Mau grado a Constituição da República e o Regimento da Assembleia Nacional estabelecerem prazos para resolução de petições e demais assuntos entrados naquela instituição, também o inquilino daquela Casa do Povo até hoje nada disse.
A 30 de Setembro de 2016, enderecei uma carta ao senhor Provedor da Justiça no mesmo sentido com a mesma lengalenga, solicitando a sua intervenção junto de Sua Excelência “QUEM DE DIREITO” no sentido de se pôr fim àquele vergonhoso ato de continuarem a exigir, aos idosos, a prova de vida presencial se hoje temos instrumentos de trabalho que podem substituir essa nefasta prática.
Dias depois, ele teve a gentileza de me responder, para dizer que nada podia fazer.
CAROS LEITORES:
Hão de me desculpar deste tão extenso artigo, pois acho, como dizem, que se deve dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus. Por achar que esta atitude do Senhor Vice-primeiro ministro e Ministro das Finanças de mandar acabar com essa humilhação, ordenando e instruindo que doravante os pagamentos de pensões processar-se-ão através de cruzamento de dados entre o Ministério das Finanças e os Registos e Notariado, aliás sugestão que lhe dei na mensagem/carta que lhe escrevi através do Faceboock cuja transcrição segue abaixo, para constatarem e dividirem os agradecimentos a nós os dois.
09/08/2017
Caro senhor Olavo Correia
Mui digno Ministro das Finanças
Não sei se terá tempo de ler esta mensagem pela função que exerce que não lhe deixa espaço para leitura de mensagens que se lhe dirigem e que não devem ser poucas.
Tentei contatá-lo para pessoalmente lhe fazer o pedido que a seguir vou descrever, mas tal não foi possível.
Os idosos cabo-verdianos, para receberem a sua pensão de reforma seja de qualquer proveniência, devem dirigir-se às Finanças para, de forma humilhante, fazer prova presencial de vida. Já fiz diversas diligências quer junto de autoridades nacionais, quer através de jornais, solicitando a mudança de método, pois, alguns idosos são levados ao Ministério das Finanças em cadeiras de rodas para fazer essa prova e muitos às vezes, levados ao colo até à funcionária por não poderem locomover-se e o funcionário responsável não se dispõe a sair para ver a pessoa no “Hall” de entrada do Ministério.
Graças a Deus, apesar da minha idade, 82 anos, não tenho nenhum problema em me deslocar a qualquer sítio para resolver os meus problemas. Todavia, milhares de meus contemporâneos não têm essa sorte.
O nosso sistema informático está de tal modo avançado que pode ajudar o Ministério das Finanças a resolver este tão simples quanto fácil assunto. Basta que os serviços dos Cartórios Notariais do País enviem, mensalmente, ao departamento das Finanças encarregado de processar as folhas de pagamento de pensões dos idosos, uma lista de óbitos ocorridos no País no mês a que o pagamento disser respeito, e assim o funcionário elimina da lista de pagamento aquele idoso que tenha falecido naquele mês.
Deste modo, acabaria com essa humilhação a que estamos sujeitos.
É por saber que o senhor valoriza os idosos através da forma elogiosa a todos os títulos que visitava os seus pais quando vivos em Achadinha, mesmo quando desempenhava altas funções o que muitos, numa função igual, não faziam por se envergonharem da pobreza dos pais.
Espero ser esta a última vez que faço este pedido sobre este assunto a um dirigente do meu País.
Eis a resposta do senhor Ministro: “Irei analisar. Muito bem. Muito Obgd. Aqueles que são da geração dos meus velhos merecem-me todo o respeito, carinho e admiração. Sei o que fizeram para estarmos hoje onde estamos. Meu móvel é……..”.
Este extenso artigo é para mostrar às pessoas que por detrás deste despacho do senhor Vice-primeiro ministro e Ministro das Finanças acabando com a prova de vida presencial existe alguém que muito batalhou para que isso tivesse fim e graças a Deus posso ainda assistir este tão nobre ato de um tão nobre, humano e homem de consciência, que é o senhor Vice-primeiro ministro e Ministro das Finanças, Dr. Olavo Correia.
Deus o abençoa e o acompanhe sempre é o que, estou certo, os idosos cabo-verdianos lhe desejam.
Como vaticinei, ele terminou com a minha aflição.
QUE HUMANO É ESTE HOMEM! QUE GRANDE GOVERNANTE!
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